Apesar de ter sede na Argentina, um país em constante crise, não para de se expandir pelas nações da região.
A interrupção global do coronavírus acelerou processos que ocorriam lentamente na América Latina. Nos países que precisaram adotar quarentenas severas para evitar o colapso de seus precários sistemas de saúde, as vendas através da Internet e a proliferação de serviços e plataformas digitais serviram muitas vezes como único sustento para comerciantes e usuários individuais e incentivaram a incursão de novos clientes.
Assim como outras plataformas de e-commerce como a norte-americana Amazon ou a chinesa Alibaba, a argentina Mercado Livre foi uma das empresas mais valorizadas na pandemia.
Em seu relatório do segundo semestre de 2020, comunicou receitas líquidas recordes de US$ 878,4 milhões (R$ 4,817 bilhões), um aumento interanual de 61,1%, e duplicou suas vendas, com um lucro bruto de U$ 417,2 milhões (R$ 2,3 bilhões).
"A tendência na adoção do comércio eletrônico já não tem volta, muito menos em uma região com tanto potencial como a América Latina. Algo semelhante ocorre com pagamentos digitais, que se mostram extremamente úteis neste contexto", disse à Sputnik Mundo Sean Summers, diretor de Marketing do Mercado Livre.
"Confiamos que, ao ter uma boa experiência, aquelas pessoas que adotam nossas soluções fintech, continuem fazendo-o na nova normalidade", acrescentou Summers.
Ainda que as vendas do Mercado Livre representem menos de 1% do volume da Amazon, a argentina é líder na América Latina entre as companhias de tecnologia digital, que tem a capacidade de monetizar e se aproveitar da capacidade de bases de dados e informação de usuários, usos que carecem, em geral, de marcos regulatórios.
Atualmente, o portal integra o grupo de cinco empresas argentinas unicórnios do setor digital e tecnológico, companhias emergentes que superaram o valor de US$ 1 bilhão (R$ 5,51 bilhões), junto a Globant, OLX, Despegar e Auth0.
Aposta e impacto
A companhia foi fundada em 1999 pelo empresário argentino Marcos Galperín, que atuou como presidente-executivo até se aposentar em fevereiro de 2020. É pioneira na região em sua aposta como intermediária entre vendedores e compradores de produtos pela Internet.
O modelo foi inspirado pela norte-americana eBay, inovando com a implementação da carteira eletrônica Mercado Pago, lançada em 2018, que a transformou na primeira fintech argentina de sucesso.
Tanto na Argentina como no restante da América Latina, o Mercado Livre observou um crescimento de 45,2% na base de usuários ativos durante o segundo trimestre de 2020 e alcançou 51,5 milhões de contas. Hoje, são registradas em torno de 16 compras e 425 visitas por segundo em sua plataforma e mais de 3,3 milhões de transações diárias pelo Mercado Pago.
A entrada no novo milênio significou o começo da revolução da Internet e o crescimento do Mercado Livre na Argentina se consolidou lentamente em comparação à adoção da cultura digital no país vizinho e na região, onde se expande mais velozmente que em seu país de origem.
Em 2007, a empresa abriu seu capital no mercado de empresas tecnológicas Nasdaq, em Nova York.
Resiliência e resistências
Contudo, existem críticas ao modelo da empresa, que se aproxima da apropriação e venda dos dados pessoais de seus usuários, assim como outras próprias a respeito da imposição de condições e encargos aos vendedores e anunciantes.
Além disso, há a resistência da parte dos setores sindicais pelas formas de contratação e os convênios coletivos particulares ou das entidades bancárias tradicionais.
"O problema destas empresas, do lado do consumidor, é a apropriação indiscriminada de dados, que permitem desenvolver diversos negócios que não seriam possíveis sem eles. Do lado do resto das empresas, é gerada subordinação dos mais fracos, que se veem obrigados a trabalhar e vender em suas plataformas", afirmou à Sputnik Mundo Cecilia Rikap, economista especializada em ciência, tecnologia e inovação.
A doutora, docente universitária e pesquisadora do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas (Conicet) e da Universidade de Paris, comentou que as empresas de tecnologia oferecem serviços gratuitos ou a possibilidade de comprar a preços competitivos e isso gera a aprovação da maior parte da população.
Porém, assegura que a preponderância do Mercado Livre permite imposição de condições ou desenvolvimento em novas Indústrias onde não impera uma regulamentação estabelecida.