A medida faz com que o Brasil se torne, segundo o próprio ministro, o país que mais oferece terapias alternativas gratuitas. O anúncio, no entanto, abriu um debate entre os profissionais de medicina e especialistas em saúde pública sobre quais deveriam ser as políticas implantadas pelo SUS.
Desde 2006, já eram oferecidos pelo SUS os tratamentos de acupuntura, homeopatia, fitoterapia, antroposofia e termalismo. No ano passado, foram incluídas 14 práticas: arteterapia, ayurveda, biodança, dança circular, meditação, musicoterapia, naturoterapia, osteopatia, quiropraxia, reflexoterapia, reiki, shantala, terapia comunitária integrativa e ioga.
Agora, somam-se à lista a apiterapia, aromaterapia, bioenergética, constelação familiar, cromoterapia, geoterapia, hipnoterapia, imposição de mãos, ozonioterapia e terapia de florais.
Para Paulo Capel Narvai, professor da Faculdade de Saúde Pública (FSP), da Universidade de São Paulo, a medida foi tomada sem ser discutida com os profissionais de saúde.
"Não se pode fazer de qualquer jeito, como populismo, uma coisa que vem e não se sabe exatamente a propósito do que, partindo inclusive de um ministro que está prestes a deixar o ministério", disse se referindo ao fato de Ricardo Barros (PP-PR) ter anunciado que vai deixar o cargo no dia 7 de abril para tentar se reeleger deputado federal.
Paulo Capel Narvai entende que a principal preocupação do Ministério da Sáude deveria ser com o que chama de "sub-financiamento crônico do SUS", que é nada mais do que a falta de repasses do governo federal para saúde.
Segundo Narvai, a situação tende a se agravar após a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55, que congela os investimentos em áreas sociais pelas próximas duas décadas, afetando o orçamento do Ministério da Saúde.
"Projeções dão conta que a participação do governo federal na questão do financiamento da saúde caia dos atuais 3,5% para algo em torno de 1,5%. Isso é um escândalo, é um despropósito. É uma proporção de participação do estado no financiamento de saúde pública que não tem nenhum paralelo em nenhum país ocidental. Esses são os problemas reais com os quais o ministro deveria estar se ocupando", argumentou.
Uma pesquisa do Ministério da Saúde, realizada em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostrou que 71,1% da população brasileira, aproximadamente 147 milhões de pessoas, foi a estabelecimentos públicos de saúde para ser atendida.
Desse total, Ricardo Barros disse que no ano passado foram 1,4 milhão de atendimentos individuais em práticas de terapias alternativas.
A maioria foi de acupuntura, com 707 mil atendimentos. Depois, vieram medicina tradicional chinesa, com 151 mil sessões de tai chi chan e liangong, auriculoteriapia, com 142 mil procedimentos, e ioga, com 35 mil sessões.
Alexander Navarro, integrante da Associação Paulista de Saúde Pública, questiona o fato do Ministério da Sáude não ter explicado como serão gerados os recursos para se implantar essas práticas.
"A pergunta que deve ser respondida é de onde que vai vir o dinheiro, de que forma que elas serão implantadas, quem vai ser o responsável por essa implantação. É o governo federal? O governo municipal? Tem o ato benéfico que é o reconhecimento de outras práticas não medicalizantes, que vão na contramão da medicina tradicional, agora a questão é se isso vai ficar no papel, ou se vai ter uma efetividade, porque a gente já tem outras 19 práticas que já são reconhecidas pelo SUS, que deveriam ser garantidas, mas não é em todo lugar que tem", justificou.
O ministro Ricardo Barros disse que as medidas servem de "prevenção" para evitar futuras doenças.
"Essas práticas são investimento em prevenção à saúde para evitar que as pessoas fiquem doentes. Precisamos continuar caminhando em direção à promoção da saúde em vez de cuidar apenas de quem fica doente", afirmou.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) repudiou a declaração de Ricardo Barros em um vídeo divulgado nas redes sociais. Na publicação, o presidente do Conselho, Carlos Vital, comentou que um dos maiores problemas do SUS é a falta de "um financiamento adequado".
"Se não há um orçamento adequado ao SUS, a aplicação de verbas do SUS nessa área é um desperdício e agrava ainda mais o contexto orçamentário do próprio SUS", disse.
Na terça-feira da mesma semana, o serviço nacional de saúde britânico anunciou uma medida que vai na direção oposta ao governo brasileiro. Em um comunicado, a pasta declarou o fim do subsídio público para a prática de homeopatia no Royal London Hospital for Integrated Medicine.
"Não há evidências de qualidade de que a homeopatia é eficiente como um tratamento para qualquer condição de saúde", escreveram.
Um levantamento feito pela Confederação Nacional das Indústrias (CNI) mostrou que 55% dos brasileiros acham que a saúde pública tem que ser prioridade dos governos.