Desde a fundação da ONU o Brasil aspira obter uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU. Essa aspiração foi muito apontada durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, perdendo força nos mandatos de Dilma Rousseff e ainda mais na crise prolongada ao governo de Michel Temer.
Para o especialista em direito internacional, Antônio Celso Alves Pereira, ouvido pela Sputnik Brasil, a real posição de Bolsonaro em relação à ONU segue sendo uma incógnita, assim como a política externa de seu governo. Para o professor, o que se sabe nesse aspecto é que Bolsonaro é uma figura "controvertida", "de direita" e que nutre admiração por Donald Trump, presidente dos EUA. Porém, a falta de propostas sobre política externa durante a campanha deixou espaço para dúvidas.
"A política externa não frequentou, lamentavelmente, nessa campanha, os debates. Nenhum candidato entrou exatamente em detalhes de qual seria a política, qual seria a orientação, qual seria o viés com que trabalhariam essa coisa tão importante que são as relações externas de um país", afirma.
O professor ainda acrescenta que ainda permanece um clima de incerteza sobre as posições do presidente eleito.
"No governo Bolsonaro nós vamos ter isso, ou seja, uma política externa que não está ainda clara, que não está definida, ninguém sabe o que vai ser porque não se tem ideia de quem será o ministro", enfatiza.
Bolsonaro pretende mesmo sair da ONU?
Um dos momentos mais controversos da campanha do presidente eleito Jair Bolsonaro aconteceu em agosto quando ele afirmou a repórteres que deixaria a Organização das Nações Unidas (ONU).
"Durante a campanha Bolsonaro falou […] que sairia da ONU, porque a ONU perdeu legitimidade e que perdeu sua importância, essas coisas que os inimigos da ONU sempre falam ignorando o grande papel que a ONU tem do lado da assistência que faz no mundo, inclusive, com as populações menos favorecidas […]", ressaltou Pereira.
Para ele, a postura exacerbada fez parte da campanha, mas não acredita que será executada durante o governo. O professor aponta que a relevância internacional do Brasil não pode ser ignorada pelo próximo presidente e que o país, por consequência, não deve abrir mão de espaços em órgãos multilaterais, que são arenas da política internacional.
"É um país muito importante hoje e que realmente não pode abdicar desse papel internacional e precisa, exatamente, agir com maturidade, com realismo", aponta Antônio Celso Alves Pereira, reiterando que não vê espaço para uma saída da ONU.
"Se o Brasil quer ter realmente um papel preponderante na vida internacional ele vai ter que fazer uma inserção cada vez maior ao lado das nações que têm responsabilidade de resolver os problemas do mundo, equilibrar o sistema internacional", afirmou o professor.
América Latina e "viés ideológico"
O especialista acredita ainda que há sinais emitidos, durante os dias após a eleição, do que pretende Bolsonaro em relação aos países vizinhos e que há, inclusive, um potencial parceiro estratégico na mira de Bolsonaro.
A possibilidade de estreitamento das relações externas com o governo chileno de Sebastián Piñera, afirma o professor, seria também uma contradição do discurso do presidente eleito.
"Inclusive é uma coisa interessante, que ele diz que não vai fazer política externa com ideologia e essa aproximação com o Chile é uma aproximação também que tem um viés ideológico. O governo do Chile é um governo de direita. Então ele estaria direcionando a política externa com um viés ideológico, coisa que ele disse que não ia fazer", ressalta Antônio Celso.
Segundo o pesquisador, no entanto, esse movimento é esperado e não passa de uma resposta ao alinhamento com os governos de esquerda durante as gestões do PT, alvos de críticas promovidas por Bolsonaro em relação aos governos de Lula e Dilma.