Indignados com a MP 914/2019, publicada pelo presidente no final do ano passado, os membros do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) se reuniram ontem e hoje na capital federal para discutir meios de derrubar essa medida.
Reunido em caráter extraordinário, em Brasília, o #Conif aprofundou os debates sobre a Medida Provisória (MP) nº 914/2019, que altera o processo de escolha dos dirigentes das instituições federais de ensino, e torna público o seu posicionamento. https://t.co/3pCwGQf58h pic.twitter.com/RBhI8hW69k
— Conif (@conif) January 16, 2020
A nova MP, editada na véspera de Natal, estabelece que a palavra final sobre a nomeação de reitores em universidades federais será do chefe de Estado, que poderá não acatar o nome vencedor de uma lista tríplice de candidatos apresentada pela instituição, prática que já durava 15 anos.
Tradicionalmente, o reitor é escolhido pelo corpo de professores das universidades, por meio de votação de lista tríplice. O mais votado dessa lista costuma ter seu nome sancionado pelo presidente, para um mandato de quatro anos. Mas, em 14 nomeações feitas em 2019, Jair Bolsonaro só escolheu o primeiro colocado nessa disputa para reitor em oito instituições. Nas outras seis, optou por candidatos menos votados, incluindo um que alcançou apenas 610 votos contra mais de 7 mil do primeiro colocado.
Nova regra de Bolsonaro para escolha de reitores fere autonomia universitária, diz ex-reitor da Un https://t.co/fe9HM2Nl3Z
— Sputnik Brasil (@sputnik_brasil) December 31, 2019
Além de ignorar a ordem da lista tríplice, a medida provisória que está sendo alvo de profundas críticas por parte da comunidade acadêmica estabelece peso de 70% para o voto de professores, 15% para o de estudantes e outros 15% para funcionários, acabando com uma recorrente prática de votação paritária. Outro ponto de debates diz respeito ao fim das eleições para diretores-gerais de campi, que passam a ser nomeados pelo reitor.
Críticos à MP 914/2019 acusam a medida de ser antidemocrática, ferindo a lei de criação dos institutos federais (Lei nº 11.892/2008) e se sobrepondo à autonomia das instituições.
Ministro da Educação no governo Lula, ex-senador e ex-reitor da Universidade de Brasília, Cristovam Buarque diz dar todo seu apoio à mobilização encabeçada pelo Conif contra a medida provisória do governo Bolsonaro. Em entrevista à Sputnik Brasil, o político afirma que essa polêmica decisão do presidente pode interromper uma experiência que não deveria ser interrompida.
"É preciso lembrar que o que está em jogo não é o fato de eleger ou não um dirigente. Isso aí a gente pode ter mil maneiras de fazer. O que está em jogo é a autonomia do ensino superior, do ensino técnico, das instituições de ensino. O que está se ferindo não é a escolha do reitor, é a autonomia da instituição", disse ele.
Para Buarque, essa tão discutida autonomia é de vital importância para pensar a educação, a formação e o desenvolvimento científico e tecnológico no país.
"A tutela do poder público sobre as instituições de ensino... Essa tutela não leva a bom caminho."
Mais do que representar uma queda de braço entre o governo e a comunidade acadêmica, o ex-senador acredita que a MP 914 representa uma "queda de braço entre o governo e o futuro", uma vez que essa disputa acabaria impedindo o pleno desenvolvimento das "forças intelectuais".
"Eu fico contente que a comunidade esteja reagindo. Eu só gostaria é que a comunidade refletisse também sobre qual é a melhor maneira de escolher os dirigentes. Não tenho a menor dúvida que quem deve escolher é a comunidade. Agora, como escolher, da melhor maneira, está faltando essa reflexão."