Em um momento histórico para Bolívia, América Latina e mundo, a integração e a cooperação entre os cidadãos e a comunidade internacional são os vetores necessários para colocar a vida, a saúde e a paz acima dos ganhos econômicos e políticos, defendeu Evo Morales em entrevista à Sputnik.
"Neste momento, o que mais precisamos é de unidade. Devido às profundas diferenças ideológicas, programáticas, econômicas, sociais e culturais, a América Latina não consegue se unir para enfrentar conjuntamente esta pandemia", prosseguiu o ex-presidente boliviano.
Estado social
O ex-líder aymara lamentou que, nos últimos anos, os líderes tenham privilegiado de novo as políticas neoliberais, a privatização dos serviços básicos, optado por regressar aos mercados livres e à concorrência implacável, além da pilhagem dos recursos naturais, tudo para servir os interesses dos EUA.
"O mundo está demonstrando a importância da presença do Estado. Aqui estão dois modelos. Estamos vendo países com uma orientação socialista, ou seja, governos que estão com os seus povos, enfrentando com muito sucesso o coronavírus, enquanto países com um sistema capitalista privilegiam mais a economia do que a vida. A saúde não pode ser uma mercadoria", declarou veementemente Morales.
O deposto presidente afirmou ainda que esta crise sanitária internacional mostra a derrota da liderança ideológica dos EUA, e que com esta pandemia o mundo mudou, apelando, assim, a uma profunda reflexão de carácter pessoal, familiar, nacional, regional e intercontinental quer sobre o sentido de comunidade, baseado em um respeito pelas diferenças, quer sobre a vida e a humanidade.
"Os EUA devem suspender a sua política de bloqueio econômico e de intervenção em países como a Venezuela, Cuba e Irã e devem aprender com a Rússia que, [mesmo] tendo diferenças ideológicas e políticas, oferece sua ajuda aos [norte-]americanos", disse Morales, acrescentando que deveriam escutar as Nações Unidas e o Papa Francisco, quando afirmaram que deveremos "trabalhar em conjunto porque a pandemia não respeita ninguém, ataca todos igualmente".
Solidariedade
O ex-líder do Movimento para o Socialismo (MAS, na sigla em espanhol) apelou a um aprofundamento dos sistemas de troca de produtos, como o desenvolvido na Bolívia entre diferentes regiões do país, desde as zonas rurais até os setores urbanos, ou de intercâmbio entre vizinhos, ou seja, um modo de vida onde prevalece a solidariedade e a complementaridade, como ensina o modo de vida indígena.
Morales lamentou profundamente que na Bolívia o governo interino não proporcione ajuda aos mais afetados pela pandemia, às pessoas que com as semanas sucessivas de quarentena perderam o seu trabalho e suas fontes de rendimento ou o pequeno capital com que subsistiam, principalmente nas zonas urbanas pobres.
"Uma crise alimentar não pode ser acrescentada à crise sanitária e econômica. O governo não tem permitido a entrada de produtos agrícolas na cidade, perdendo o produtor e o consumidor, porque os preços sobem em todas as cidades. Têm de conceder empréstimos com juros de 0%. A pandemia ameaça a vida, mas o programa econômico do governo interino também, gerando fome", continuou Morales.
Evo Morales destacou ainda o trabalho de solidariedade da militância política de jovens e adultos dos bairros, que organizam recolhas de donativos e fazem sopas para alimentar a população mais vulnerável, bem como a colaboração de governadores e prefeitos do MAS, que contribuem com grandes porcentagens de seus salários para ajudar os mais necessitados.
"É importante pedir aos meus irmãos e irmãs, sejam eles do campo ou da cidade, jovens ou adultos, uma maior unidade, solidariedade e responsabilidade, especialmente com as pessoas mais humildes, não só na Bolívia, mas em todo o mundo. Somos todos filhos da Mãe Terra, de Pachamama ou do planeta, devemos fortalecer a fraternidade, a amizade e a harmonia", concluiu a entrevista.