O petroleiro iraniano Fortune atracou na refinaria El Palito, na Venezuela, no domingo (24) de manhã, depois de navegar por três semanas. Do Irã também saíram quatro outros navios-tanque, chamados de Forest, Petunia, Clavel e Faxon.
El primer barco petrolero que #Irán envió a #Venezuela ya está en la refinería El Palito. El segundo barco ingresó hoy a zona exclusiva económica venezolana donde lo recibió la Fuerza Armada Nacional Bolivariana. Aún quedan tres barcos por llegar. pic.twitter.com/LdgvdFs2tC
— Sputnik Reporteros (@Sputnik_Report) May 25, 2020
O primeiro navio petroleiro que o Irã enviou para a Venezuela já está na refinaria El Palito. O segundo navio entrou hoje na zona econômica exclusiva da Venezuela, onde foi recebido pelas Forças Armadas Nacionais Bolivarianas. Ainda há três navios a caminho.
A chegada do Fortune às águas venezuelanas foi seguida ao vivo por uma grande parte do país. As Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB) haviam anunciado que o esperariam em sua zona econômica exclusiva para acompanhá-lo até o ponto de chegada. Finalmente, a Marinha Bolivariana, com o navio Yekuana, entrou 60 milhas náuticas em águas internacionais para receber o petroleiro.
Os navios iranianos foram recebidos no cais da refinaria El Palito, no estado de Carabobo. Entretanto, o navio Forest dava entrada em águas venezuelanas, acompanhado pela Marinha e quatro aviões da Aviação Militar Bolivariana, dois aviões Sukhoi Su-30MK2 e dois aviões F-16A/B Block 15.
Os outros três petroleiros devem chegar à Venezuela nos próximos dias, um evento de impacto geopolítico devido à importância da execução de um acordo energético entre os dois países sancionados pelos Estados Unidos.
Fortalecimento bilateral
"Temos direito ao livre comércio, à cooperação bilateral com qualquer governo do mundo", disse Tareck El Aissami, recentemente nomeado ministro do Petróleo venezuelano, durante a recepção do Fortune em El Palito.
O alto responsável anunciou que os navios transportam gasolina, aditivos e peças de reposição, "entre outros equipamentos para aumentar nossa capacidade de refino e produção de petróleo".
O total estimado de combustível é de quase 1,5 milhão de barris, e a "relação de cooperação energética", disse El Aissami, chegou "em um momento em que se pretendia continuar sufocando o povo venezuelano, continuar nos bloqueando, nos sancionando".
El Aissami recordou 2008, quando a Venezuela enviou combustível para o Irã, que também estava, e continua a estar, sob sanções dos EUA, particularmente sua indústria petrolífera. O objetivo, explicou o ministro, é unir "esforços comuns por objetivos de desenvolvimento compartilhado que impactem os dois países".
Também participaram do evento o ministro da Defesa venezuelano Vladimir Padrino López, o almirante-chefe venezuelano Remigio Ceballos e o embaixador do Irã na Venezuela, Hojatollah Soltani.
"Hoje não só o Irã e a Venezuela venceram para forçar esse gigante, os Estados Unidos, a respeitar os direitos e convênios internacionais, incluindo a livre navegação, o livre comércio entre países. Todo o mundo ganhou, a comunidade internacional pode se beneficiar pelo respeito das regras e convênios internacionais", disse Soltani.
Redesenho geopolítico
Depois de tomar conhecimento público do envio dos navios-tanque e anunciar possíveis ações, o Pentágono acabou comunicando que não tinha planos de detê-los.
Os petroleiros entraram assim no Caribe, área considerada preponderante pelos Estados Unidos. Já o Irã, construído desde 1979, com a Revolução Islâmica, tem aparecido em constante oposição à política externa dos EUA.
O Irã é um dos países bloqueados economicamente pelo governo de Donald Trump, como parte de uma nova escalada, desde que este saiu do Plano de Ação Conjunto Global (JCPOA, na sigla em inglês) em 2018 e aplicou a política de "pressão máxima". O objetivo tem sido asfixiar o país através de cerco econômico, uma estratégia semelhante à empregada contra a Venezuela.
A aliança entre Venezuela e Irã é parte de um redesenho geopolítico no que tem sido marcado em diferentes análises como uma retirada norte-americana, bem como o avanço para um mapa multipolar. Esta multipolaridade tem entre seus atores centrais a China e a Rússia, países com os quais a Venezuela tem desenvolvido uma política de relações estreitas.
A inserção venezuelana como ator importante dentro deste mapa vem desde os governos de Hugo Chávez. A situação era diferente naquela época: Rússia e China não tinham assumido a magnitude internacional que têm hoje e a América Latina era um continente com um crescente processo de integração, com o avanço da União das Nações Sul-Americanas e da Comunidade de Estados da América Latina e Caribe.
A situação atual no continente é marcada pela regressão dessa integração, produto dos governos de direita que tinham o objetivo de desfazer os avanços e retornar a uma ordem subordinada à política externa dos EUA.
Corrupção interna
Há dois objetivos centrais para a Venezuela: aumentar a produção de petróleo, que vem diminuindo nos últimos anos, e aumentar a capacidade de refino de gasolina, que atualmente está abaixo do que poderia ser feito pelas diversas refinarias que a PDVSA possui.
A PDVSA é a espinha dorsal da economia venezuelana, por isso, bloqueá-la em suas diferentes áreas significa afetar a economia nacional como um todo.
"Nós venezuelanos somos subtraídos, uma expressão venezuelana que significa, neste caso, estarmos dispostos a lutar, e com os obstáculos que temos continuamos a trabalhar", disse Jesús Rodríguez, um trabalhador da PDVSA com 21 anos de experiência no setor, durante a cerimônia de chegada do Fortune a El Palito.
Ele, como outros trabalhadores do setor, ressalta os danos causados à indústria pela corrupção, especialmente a que existiu sob o ex-presidente da PDVSA Rafael Ramírez, que esteve no comando da empresa de 2004 a 2013.
"Os vagabundos que saíram daqui, como Ramírez, que levou muito dinheiro da Venezuela, que também pertence ao povo, nos causaram muito dano, e continua a haver vagabundos que estão estragando as coisas", disse Rodríguez.
Os três últimos presidentes da PDVSA, de 2009 a 2017, foram acusados de desfalque pelo Ministério Público, com múltiplas consequências na produção, investimentos e refinarias. Esta é uma das razões para a situação da PDVSA.
Contrariando as sanções
As sanções buscam cortar os canais de financiamento da PDVSA, impedindo-a de exportar, de se associar com outras empresas sob ameaça de inclusão na lista do Departamento da Fazenda, de importar insumos e máquinas fundamentais para suas refinarias e fábricas de produção.
A Citgo, subsidiária da PDVSA nos Estados Unidos, foi embargada em 2019, e poderia agora ser liquidada em favor de uma empresa canadense, a Crystallex.
Neste contexto, os petroleiros iranianos representam uma mais-valia importante. A chegada dos outros três navios também será vivenciada como uma vitória do chavismo na Venezuela. O relacionamento com o Irã faz parte do que Chávez começou, e essa aliança oferece hoje, em meio a um bloqueio e escassez de combustível, navios com gasolina e formas de aumentar a produção interna.