Nesta quarta-feira (18), a agência de classificação de riscos Fitch deu ao Brasil a nota de crédito soberano BB-, com perspectiva negativa, e destacou os riscos fiscais do país em um ambiente de incerteza política doméstica e ressurgimento global das infecções pelo novo coronavírus.
Em entrevista à Sputnik Brasil, o consultor Marcel Caparoz, economista da RC Consultores Associados, explica que a nota reflete a probabilidade de um país para honrar seus compromissos com a dívida. De acordo com o especialista, os países que possuem classificação AAA são os melhores pagadores. No caso, a classificação do Brasil, que está em BB- com tendência de baixa, mostra que há uma deterioração da capacidade do país para honrar seus pagamentos.
Segundo Marcel Caparoz, a classificação sinaliza que houve uma piora da situação nas contas públicas no Brasil, que está gastando mais do que arrecada, o que gera um processo de déficit, que aumenta anualmente a dívida, e dificulta a capacidade de honrar esses pagamentos no futuro.
"Por isso é importante, em um cenário de pandemia no qual os gastos subiram de forma muito rápida, reequilibrar o impacto nas contas públicas, o que deve ser feito através de reformas e da manutenção do teto de gastos", recomenda o economista.
Segundo a avaliação da Fitch sobre o Brasil, há necessidade de as reformas em discussão no Congresso Nacional serem aprovadas em 2021. A agência, no entanto, ressalta que o ambiente político não está muito favorável para se ter certeza de que as reformas serão aprovadas no início do próximo ano.
Marcel Caparoz considera que as reformas estruturais - como a administrativa e a tributária - são essenciais para o Brasil buscar o reequilíbrio fiscal e para gerar uma retomada econômica consistente.
"A questão tributária é de importância fundamental devido à complexidade da legislação tributária do país, o que trava o crescimento das empresas, de novos investimentos e, consequentemente, da contratação de pessoas. A administrativa, por sua vez, também é muito importante por causa do desequilíbrio nas contas públicas, pois o país precisa de uma condição saudável das contas públicas para rolar a dívida com um custo menor", opina o especialista.
Para o consultor da RC Consultores Associados, é fundamental que o Congresso consiga avançar na pauta de reformas, pois, mesmo diante de todas as dificuldades políticas, é preciso que elas avancem e sejam aprovadas no ano que vem para que o país consiga rolar sua dívida com juros mais baixos.
Em seu relatório, a agência de classificação assinala que "espera que a economia se recupere a partir de 2021. No entanto, a incerteza em torno dos desenvolvimentos políticos e de políticas públicas, combinada com um ressurgimento de infecções globais por coronavírus, continua a obscurecer o panorama".
Marcus Caparoz avalia que a atividade econômica no Brasil já vem mostrando sinais de recuperação, embora ela seja muito diferente entre os diversos setores da economia.
"Atualmente, o setor de comércio tem uma recuperação muito melhor que o setor de serviços, por exemplo. Sem dúvida, o auxílio emergencial influenciou diretamente nesse comportamento, injetando muito dinheiro na economia, fazendo ela girar e reativando alguns setores", comenta.
A taxa de #desemprego chegou a 14,4% no trimestre terminado em agosto. É a maior taxa registrada na #PNADcontínua, iniciada em 2012. O número de pessoas ocupadas no país foi o menor já registrado na série: 81,7 milhões.
— IBGE Comunica (@ibgecomunica) October 30, 2020
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Para o economista, contudo, é preciso muito cuidado para o próximo ano, quando acabar o auxílio, pois houve um crescimento muito rápido do desemprego ao longo de 2020, com a perda aproximada de 13 milhões de postos formais e informais de trabalho.
"São 13 milhões de pessoas a menos com salário para poder consumir, o que pode dificultar a retomada econômica de maneira mais intensa em 2021. As estimativas indicam um crescimento de aproximadamente 3% do PIB em 2021, um número que poderia ser maior se o país já tivesse avançado na pauta de reformas. Elas são importantes para tirar do papel novos investimentos e gerar novas contratações, tendo mais massa salarial para girar a roda da economia, com mais consumo e produção", opina Macus Caparoz.
Para o especialista, apesar de a Fitch apontar uma recuperação econômica em nível global para o próxima ano, há ainda muita incerteza em relação à essa possível retomada, pois há comportamentos distintos entre os países.
"As nações asiáticas que conseguiram lidar melhor com a pandemia já apresentam uma recuperação mais forte da economia. Por outro lado, alguns países da Europa e das Américas, como EUA, Brasil, Argentina, Peru e Colômbia, mostram uma dificuldade maior nessa recuperação econômica", avalia.
Marcus Caparoz, contudo, considera que vivemos em um cenário de grande liquidez financeira no mundo, com taxas de juros em seus mínimos históricos em diversos países, o que pode favorecer o aumento de investimentos.
"O Brasil tem muitos atrativos e capacidade para atrair parte desses investimentos. Por isso as reformas são importantes, para se ter previsibilidade das contas públicas, um ambiente regulatório propício a investimentos estrangeiros e o país possa se beneficiar desse cenário mundial de grande liquidez e juros baixos", conclui o economista.