Para o primeiro diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Brasil tem condições de aprovar a autorização de uso de vacinas contra a COVID-19 antes do prazo de 60 dias estabelecido pelo próprio órgão.
Mas o médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto, professor de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), entende também que a Lei de Emergência Sanitária, que permite importação e uso da vacina ainda sem registro no Brasil, mas com aval de algumas agências internacionais de saúde pública, não se aplica no país.
As duas questões estiveram no centro de debates sobre a COVID-19 nos últimos dias. Especialmente envolvendo possíveis datas para o início da imunização.
Opções para uso
Para que uma vacina seja usada contra o novo coronavírus, por princípio ela depende da aprovação da Anvisa. A permissão pode ser conseguida por dois tipos de registro, tradicional ou emergencial, ambos pela Anvisa.
Mas há outra possibilidade, a chamada "Lei COVID", que libera compra e utilização se o imunizante tiver aval expedido por uma agência do exterior, independentemente de registro pelo órgão brasileiro.
Na opção de registro tradicional, quem desenvolve o imunizante submete o pedido de registro à Anvisa apenas após conclusão das três fases de testes da vacina.
No emergencial, os desenvolvedores enviam os dados que comprovam eficácia e segurança antes de terminarem a fase três de testes.
E pela "Lei COVID", a Anvisa tem o prazo de 72 horas para conceder a autorização caso o imunizante tenha conseguido registro no Japão, nos Estados Unidos, na Europa ou na China. Caso o prazo não seja cumprido e a Anvisa não se manifeste, a autorização é concedida automaticamente.
Nesta terça-feira (8), após encontro com o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, governadores preocupados com o que consideraram uma demora de Brasília em apresentar um plano nacional de imunização, citaram a nova legislação - de fevereiro passado com complemento em maio -, para lembrar que vacinas aprovadas no exterior terão aval para uso no Brasil.
O que fez a legislação ser citada é também a preocupação deles com o prazo de análise na Anvisa, já que o ministro da Saúde afirmou que ele deve ser de 60 dias.
Em entrevista para a Sputnik Brasil, Vecina Neto compreende o ponto de vista dos governadores estaduais e critica a atuação do governo federal.
"Os governadores estão certos porque tentam achar alternativas e garantir que seus governados tenham acesso a soluções contra a crise sanitária. O problema é que o governo federal está em uma situação ruim, pois não decide e aparentemente dificulta as decisões", comentou.
Mas no que se refere ao tema legal, a aplicação da chamada "Lei COVID", Vecina Neto é cético.
"No caso específico das vacinas, o que entendo é que a lei permite a importação de produtos sem registro, mas que acabaram no Brasil. Neste caso, eu acho que a lei não se aplica", disse Vecina Neto se referindo ao fato de que as vacinas sequer existem no país.
O outro tema fundamental, que levou os governadores a se reunirem presencial e virtualmente com o ministro, foi o prazo de 60 dias estabelecido pela Anvisa. Para Vecina Neto, o período tem "caráter burocrático".
"É perfeitamente possível se manifestar antes como aconteceu no Reino Unido que deu sua opinião em menos de uma semana após análise da documentação do imunizante da farmacêutica Pfizer. Acho que o mesmo deveria acontecer aqui desde que a documentação complementar chegue logo na Anvisa. E analisar a fase três é mais fácil. Com uma boa força-tarefa, é possível analisar em menos de 60 dias", disse.
O primeiro diretor da Anvisa pede urgência nos procedimentos e apresenta um argumento difícil de ser rebatido:
"O problema é que quanto mais tempo demorar para vacinar, mais gente vai morrer".