A Fiocruz recebeu neste sábado (6) o primeiro lote de matéria-prima para a produção brasileira da vacina contra COVID-19 desenvolvida pela AstraZeneca/Oxford. São 88 litros, suficientes para formular 2,8 milhões de doses.
O Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA) da vacina AstraZeneca/Oxford é produzido pelo laboratório Wuxi Biologics, localizado na cidade de Xangai, na China.
Para Marcus Vinicius de Freitas, professor-visitante de Direito Internacional Público e de Relações Internacionais da Universidade de Relações Exteriores da China, sediada em Pequim, a crise sanitária gerada pela pandemia da COVID-19 deixou claro que a China desempenha um papel de uma espécie de parque industrial global.
"O cenário da competitividade global da China teve um aspecto muito relevante em todas as áreas, e o quadro sanitário, a questão de máscaras, respiradores, aparelhos e equipamentos hospitalares ficou muito claro que a China conseguiu aquilo que nenhum país hoje em dia consegue alcançar, que é uma competitividade e qualidade", declarou.
De acordo com relatório da Anvisa, publicado em outubro de 2020, 95% dos insumos usados para produção de remédios no Brasil vêm do exterior. A maior parte vem da Índia (37%) e da China (35%), que produz a matéria-prima das duas vacinas aprovadas para uso emergencial no Brasil.
A Fiocruz esperava para dezembro de 2020 a chegada do IFA para começar a produzir doses da vacina de Oxford no Brasil, adiou a expectativa para janeiro deste ano e só viu os insumos aterrizarem no aeroporto do Rio de Janeiro neste sábado (6).
"O que a COVID-19 fez de fato foi trazer à luz, foi tornar mais evidente, essa situação que nós vimos do crescimento da dependência dos países com relação à China", afirmou.
O especialista destaca dois aspectos para o sucesso do modelo chinês no comércio global.
"A realidade é que os chineses têm duas vantagens competitivas muito importantes. Eles têm uma população enorme, e isso gera ganhos de escala que lhes permite produzir muito mais e mais barato e, em segundo lugar, eles criaram um parque logístico incomparável no mundo", disse.
'Posições adotadas por Bolsonaro refletem uma visão retrógrada sobre a China'
O presidente Jair Bolsonaro chegou a dizer que não compraria a vacina do Butantan e travou embates com o governador João Doria (PSDB), que liderou as negociações com a farmacêutica chinesa Sinovac.
Além disso, integrantes do governo e o filho do presidente já criticaram o país asiático.
Preocupados com falta de vacina, governadores pediram nesta quarta-feira (20) ao presidente Jair Bolsonaro que negocie com a China a importação de insumos para produção de mais doses no Brasil https://t.co/6qhQJu40Zs
— Sputnik Brasil (@sputnik_brasil) January 20, 2021
Marcus Vinicius de Freitas disse que o governo Bolsonaro possui uma visão distorcida sobre a China.
"As populações, mais do que ideologias, querem resultados palpáveis que melhorem a sua qualidade de vida, e as suas perspectivas quanto ao futuro. O governo atual estava querendo instituir um cenário global não amistoso à China por acreditarem que a China é aquilo que se aprendeu na escola na década de 50 e 60, é uma visão distorcida sobre a China. Essas visões distorcidas não são o melhor para o país", disse.
As críticas ao governo chinês fizeram com que o Brasil sofresse consequências práticas na hora de receber os insumos importados, de acordo com o especialista.
"Participar de iniciativas que menosprezem ou que queiram criar uma imagem negativa a respeito da China pode fazer com que o pedido que estivesse entre os primeiros a serem atendidos caia e passa a ser o último da fila", completou.