Além do risco relacionado ao avanço do novo coronavírus, a juventude brasileira está tendo que lidar com outros dois graves problemas socioeconômicos: o desemprego e a evasão escolar, que aumentaram durante a pandemia.
Mais de quatro milhões de jovens com idades entre 18 e 24 anos estão sem ocupação, segundo estudo recente divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ao mesmo tempo, cerca de quatro milhões de estudantes brasileiros, com idades entre 6 e 34 anos, deixaram a escola, de acordo com uma pesquisa feita pelo Instituto Datafolha.
O desemprego afeta principalmente os jovens com menos estudo, enquanto a taxa de evasão escolar, que chega a 8,4%, atinge principalmente os alunos de famílias de menor renda, das classes D e E.
Dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) mostram que o desemprego no Brasil atingiu 14,4% no trimestre encerrado em fevereirohttps://t.co/Nar9j8kNka
— Sputnik Brasil (@sputnik_brasil) April 30, 2021
"A evasão escolar, um fenômeno amplificado pela pandemia, seja pela necessidade de o jovem ajudar no orçamento doméstico, seja pela falta de acesso à Internet para as aulas on-line, também cresceu e está jogando toda uma geração para abaixo da linha da pobreza", afirma, em nota enviada à Sputnik Brasil, o psicólogo Alexandre Garrett, especialista em recursos humanos e em crises e emergências.
Segundo Garrett, os jovens das classes menos favorecidas estão sem perspectiva de futuro. Acuados pelo medo que a pandemia trouxe e pelo aumento da miséria, muitos se tornarão alvos fáceis para a criminalidade. E, se nada for feito, "vamos perpetuar o ciclo do subemprego, da miséria e da violência".
"Precisamos agir rápido para trazer esses jovens de volta para a escola e investir em programas de qualificação profissional", afirma.
Prioridade? Brasil terminou 2020 com o menor gasto do MEC em educação básica na década.
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Enquanto Bolsonaro investiu R$ 7,2 bilhões (2019-2020), o investimento foi de R$ 13,5 bilhões no mesmo período do governo anterior, de Dilma Rousseff e Michel Temerhttps://t.co/A8V1uS43bT
Embora a relação entre desemprego e evasão escolar seja um problema antigo e de impacto internacional, no Brasil, de acordo com o pedagogo Lincoln Araújo, professor da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), essa questão está tomando novos contornos devido ao descontrole na gestão do surto da COVID-19.
Para o acadêmico, ao agir com base em princípios do darwinismo social — teoria que defende a "sobrevivência" apenas dos cidadãos mais aptos a determinada realidade —, o atual governo brasileiro, do presidente Jair Bolsonaro, negligencia o investimento em políticas sociais que poderiam "proteger" parcelas mais vulneráveis da população.
"E é por isso que, com a pandemia, se acentuam no Brasil esses dois grandes problemas que nós estamos observando agora, a evasão escolar e o desemprego", diz o professor à Sputnik Brasil.
Essa filosofia, segundo Araújo, fica muito evidente na gestão da pasta da Economia, onde o ministro Paulo Guedes aposta na ideia de deixar o mercado se autorregular e definir os rumos.
"Ora, no darwinismo econômico e social, você não precisa planejar nada. Ninguém interfere no mercado. O que existe então é que esses indicadores pouco importam para o governo Bolsonaro. O alto índice de evasão escolar e o desemprego. Porque o governo Bolsonaro entende que esses dois elementos terão solução pelo próprio mercado. A política econômica do Paulo Guedes acentua esses problemas sociais."
O presidente Jair Bolsonaro sancionou o polêmico Orçamento de 2021.
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Para a Saúde, o orçamento será de R$ 125,8 bilhões. Em 2020, foram R$ 160,9 bilhões.
Já o orçamento destinado à pasta de Educação sofreu corte de 27% em relação ao ano passado.https://t.co/QcLIBom1UT
Em outros países, na Europa, por exemplo, os governos vêm estabelecendo importantes políticas públicas e de investimentos sociais durante a pandemia, destaca o especialista. Isso porque, ao observarem a crise desencadeada pelo coronavírus e perceberem as graves consequências econômicas, sociais, culturais e políticas, esses Estados se antecipam com planejamentos que buscam "ajustar a economia, o mercado e a sociedade no transcorrer da pandemia".
Isso, ele argumenta, é algo que o Brasil também deveria estar fazendo. Falta ao governo brasileiro o desenvolvimento de políticas de "proteção à sociedade, à educação e à economia".
"O que a gente observa do governo Bolsonaro é que nós não identificamos uma política social de investimentos, no sentido de atacar o desemprego, no sentido de discutir, debater os tempos escolares, no sentido de você acompanhar essa juventude que está abandonando a escola. E a juventude abandona a escola porque ela precisa imediatamente ajudar na renda familiar. Essa não é uma preocupação do governo Bolsonaro."