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Analista explica o porquê do abrupto crescimento nas exportações de carne bovina do Brasil para EUA

© AP Photo / Dirceu Portugal/Fotoarena/Sipa USABois em pastagem em propriedade rural em Campo Mourão (PR), no Brasil (foto de arquivo)
Bois em pastagem em propriedade rural em Campo Mourão (PR), no Brasil (foto de arquivo) - Sputnik Brasil, 1920, 07.07.2021
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A Sputnik Brasil conversou com um especialista em mercado de carne bovina sobre as possíveis consequências do interesse norte-americano na carne nacional para a cadeia produtiva do bovino no Brasil.

As exportações de carne bovina do Brasil, somando o produto in natura e o processado, fecharam o primeiro semestre de 2021 com queda de 3,2%, a 880 mil toneladas, anunciou na terça-feira a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo). Ainda assim, Abrafrigo registrou aumento de 4,4% na receita de janeiro a junho, com uma movimentação de 880.007 toneladas e receitas de US$ 4,084 bilhões (aproximadamente R$ 21,46 bilhões).

No semestre, a China importou 519.022 toneladas, com receita de US$ 2,412 bilhões (RS 12,67 bilhões), o que representa 58,9% do total movimentado pelo país. No ano passado, no mesmo período, a movimentação era quase a mesma: 518.925 toneladas, com receita de US$ 2,358 bilhões ou 57,1% do total exportado pelo Brasil. Esse volume chinês é muito parecido com o do ano passado, quando Brasil exportou 518.925 toneladas para Pequim.

A grande novidade no balanço do semestre foi o volume de exportações para os EUA. As exportações de carne bovina para o país cresceram 111,3%. De 20.108 toneladas nos primeiros seis meses de 2020 para 42.482 toneladas no primeiro semestre deste ano. Esse crescimento catapultou os EUA para o segundo lugar entre principais compradores de carne bovina brasileira.

Para entender melhor esse crescimento no interesse norte-americano na carne nacional e as consequências para os frigoríficos brasileiros, a Sputnik Brasil conversou com Augusto Carneiro, especialista em mercado de carne bovina e trader da empresa Sudambeef.

© Sputnik / Igor Zarembo / Acessar o banco de imagensCarne sendo processada em uma fábrica de processamento de carne (foto do arquivo)
Analista explica o porquê do abrupto crescimento nas exportações de carne bovina do Brasil para EUA - Sputnik Brasil, 1920, 07.07.2021
Carne sendo processada em uma fábrica de processamento de carne (foto do arquivo)

Crescimento abrupto

Augusto Carneiro afirma que a subida no volume de exportações para os EUA não é totalmente surpreendente e explica as razões para o crescimento repentino.

"Fiquei surpreso com a força desse crescimento, com o percentual ... [Mas] não é um crescimento que já vem de um mercado importante, com muito volume. É um mercado que sai quase do zero", comenta. Acrescentando que o Brasil recomeçou a exportar para os EUA recentemente, com poucas plantas aprovadas, por isso o grande crescimento incide em um volume que "era praticamente insignificante".

Esse interesse dos EUA na carne bovina brasileira é explicado em parte pelo fato de a China ter começado a importar mais carne norte-americana depois que Pequim proibiu a importação de carne de vaca das grandes empresas australianas, citando preocupações de segurança.

"[Os EUA] são grandes produtores, são grandes exportadores, mas quando você exporta muito, abre também uma fatia do mercado para importar e suprir alguma eventual necessidade que tenha em um mercado interno grande como é o mercado norte-americano. E aí entra justamente a carne brasileira, principalmente de corte dianteiro", contextualiza o especialista.

Augusto Carneiro explica que o corte dianteiro não é nobre, não é para consumo de formato in natura, para fazer um bife ou cozinhar. "É tradicionalmente para industrializar, para fazer hambúrguer", explica, acrescentando que o brasileiro não é um grande consumidor desse corte, mas garante que a qualidade é também boa e que essa nova demanda pode ser um bom momento para os frigoríficos nacionais.

© REUTERS / Paulo WhitakerTrabalhadores na fábrica de carne bovina da JBS
Analista explica o porquê do abrupto crescimento nas exportações de carne bovina do Brasil para EUA - Sputnik Brasil, 1920, 07.07.2021
Trabalhadores na fábrica de carne bovina da JBS

Oportunidade para a cadeira brasileira

O trader da Sudambeef vê com bons olhos o interesse dos EUA na nossa carne bovina, mas faz uma ressalva sobre a aprovação dos frigoríficos por Washington, destacando que é necessário que o Brasil tenha uma abertura para várias plantas produtoras.

"Dependendo de como for a abertura de plantas brasileiras para os EUA, isso será benéfico. Se a gente tiver, por exemplo, vários grupos frigoríficos, várias empresas aprovadas pelos EUA, vai ser uma coisa bem bacana para a cadeia do Brasil como um todo. Agora, se ficar na mão de poucos, aí desestrutura a cadeia produtiva do bovino no Brasil."

O especialista esclarece que, caso as plantas aprovadas fiquem concentradas em poucos frigoríficos, como JBS, Marfrig e Minerva Foods, que já estão se beneficiando do boom porque todas possuem plantas aprovadas para embarcar para os EUA, muitos frigoríficos podem vir a fechar as portas.

"É vantajoso sim, vejo com bons olhos, mas com essa ressalva que a gente tem que ter atenção para essa questão interna porque se for só para poucos nós vamos desestruturar até a questão do emprego no setor dos frigoríficos do Brasil […]. Se a carne é brasileira, deve-se dar a devida atenção a todos os frigoríficos que estão na área de carne do Brasil e não deve ter critério político de selecionar somente alguns em detrimento de outros. Se a planta tem condição, se tem estrutura, se cumpre com os requisitos técnicos, ela deve ser aprovada como qualquer outra", conclui.

China e Rússia

Augusto Carneiro destaca que, apesar do crescente interesse de Pequim na carne de Washington, a China segue com uma abertura muito grande para a carne brasileira, um mercado que cresceu muito para o Brasil nos últimos anos. Além disso, diferentemente da situação atual que temos com os EUA, o Brasil possui vários frigoríficos aprovados por Pequim.

O especialista afirma ainda que a relação EUA-China é cheia de altos e baixos e que agora o governo chinês "entendeu que cabe uma abertura para a carne norte-americana" e que existe a "questão política também, de fazer uma concessão, para, obviamente, colher alguns benefícios disso." Mas ressalta que o Brasil tem uma vantagem competitiva: a carga tributária de importação da carne norte-americana na China é muito superior à carga tributária aplicada a uma carne de origem brasileira.

Augusto Carneiro encerra comentando o cenário das exportações de carne bovina para a Rússia, que caiu cerca de 80% nos últimos dez anos.

© Sputnik / Yevgeny EpanchintsevComerciante mostra carne suína em mercado na região de Tomsk, Rússia (foto de arquivo)
Analista explica o porquê do abrupto crescimento nas exportações de carne bovina do Brasil para EUA - Sputnik Brasil, 1920, 07.07.2021
Comerciante mostra carne suína em mercado na região de Tomsk, Rússia (foto de arquivo)
"Em termos de presente e futuro, eu acho que nós não devemos ter um reaquecimento no comércio de carne bovina do Brasil para a Rússia […] houve um crescimento bastante considerável de produção de carne de frango e suíno [na Rússia] e o perfil do consumo russo está muito mais voltado para produtos industrializados, como salame e fiambre, do que uma peça de carne in natura, um bife não é tão popular. E nessa linha de produtos, o produtor industrial pode usar frangos, suínos, não necessariamente só a carne bovina", comenta.

O especialista acrescenta que o custo do suíno e do frango é mais baixo por causa da produção local e que a Rússia começou uma produção local de bovino, fazendo com que não haja mais tanta necessidade de importação.

"E, em paralelo, o Brasil encontrou a China. De forma que o Brasil não está tão dependente do mercado russo como comprador, como era antes, e a Federação da Rússia também não está em posição de tanta dependência de importar a carne brasileira como era antes. Quando não se tem necessidade grande nem de um lado nem de outro, não vejo razão para que, de repente, o mercado exploda em volume outra vez", diz Augusto Carneiro.

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