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Da crise nas relações de trabalho à Ômicron: fatos que marcaram a sociedade e a saúde global em 2021
Da crise nas relações de trabalho à Ômicron: fatos que marcaram a sociedade e a saúde global em 2021
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Ao entrarmos na reta final de 2021, uma retrospectiva é necessária para olharmos para o primeiro ano da década, o qual foi bastante desafiante como 2020. A... 27.12.2021, Sputnik Brasil
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Mesmo com grandes desafios impostos em diversos setores, 2021 conseguiu ser um pouco mais brando após o início das campanhas de vacinação contra a COVID-19, nos permitndo respirar um pouco mais aliviados.A tecnologia, que vem antecipando vários processos desde 2020, se concretizou com força, e já molda novos comportamentos a partir do momento que a sociedade passa a interagir e a trabalhar integralmente através da grande rede.Temas antes com foco mais reduzido ganharam protagonismo, como as discussões em torno do racismo, das questões de gênero e ambientais, principalmente no que diz respeito à mudança climática, pauta principal em encontro de líderes mundiais deste ano, como na COP26.Se alguns assuntos tiveram foco, outros nem tanto, mas merecem grande destaque a fim de serem solucionados, como a situação de migrantes no canal da Mancha e na fronteira Belarus-Polônia, assim como o aumento do feminicídio em diversos países.Sobre a pandemia, como mencionado, as campanhas de vacinação começam a fazer efeito, mas até hoje grupos antivacinas e os defensores do chamado "tratamento precoce" ainda fazem coro em muitos lugares. Até que ponto esses núcleos podem prejudicar a contenção diante de novas variantes como a Ômicron?A Sputnik Brasil traz para você uma retrospectiva analisando alguns dos principais acontecimentos deste ano que influenciaram a sociedade e a saúde global. Solidariedade como capital socialEm 2021, o coronavírus continuou presente na vida de todos, entretanto, de uma forma menos nociva, após as campanhas de vacinação. Hoje, a COVID-19 ainda é um dos grandes desafios vividos pela sociedade e, por conta de suas variantes, continua fazendo com que o contato entre as pessoas fique restrito, principalmente em forma de aglomeração.Se por um lado a pandemia não nos permitiu ir tanto às ruas para nos manifestarmos pelos nossos direitos, por outro, "ela demonstrou uma solidariedade coletiva que estava um pouco adormecida por um estilo de vista mais individualista", diz Arnaldo Cardoso, cientista político formado pela PUC-SP e analista de Política Internacional à reportagem.No entanto, essa movimentação evidenciou a necessidade "de reformas do sistema de poder e de representação nas sociedades democráticas", visto que "a emergência sanitária demonstrou que os tradicionais sistemas políticos […] sofrem de uma perda de eficiência na escuta e atendimento de demandas sociais".Neoliberalismo e relações de trabalho em conflitoMas a pandemia não fica só pautada na questão sanitária, com ela, a sociedade vive crises, não só econômicas como também nas relações e nos direitos trabalhistas. Segundo Cardoso, "o neoliberalismo está sendo posto em cheque".Cardoso também discursa sobre dois movimentos simultâneos que colaboram para precarização do trabalho: o processo de financeirização da economia e os choques tecnológicos das duas últimas décadas.Ao mesmo tempo, Cardoso não enxerga em movimentos sindicais, por exemplo, uma resposta que possa interromper esse ciclo, já que "é difícil resgatar formas organizativas do passado para tratar o presente".A luta de classe não acabouMesmo com as novas relações de trabalho, esse ano foi possível acompanharmos um vasto e forte movimento social de uma classe esquecida no mundo industrial e corporativo no qual vivemos: a classe dos camponeses.Na Índia, estima-se que 500 mil agricultores foram às ruas para protestar contra um conjunto de medidas elaboradas pelo governo que os deixava vulneráveis diante de grandes empresas na comercialização de commodities.Após meses acampados, a classe conseguiu com que o governo de Narendra Modi desistisse da reforma agrícola e atendesse a vontade do setor. O movimento mostrou que a luta de classe não é coisa do passado."Os agricultores indianos mostraram que reformas só podem ser legitimadas se atenderem às necessidades dos seus vários envolvidos. Vale ainda ressaltar, que [...] os protestos apontam para o crescimento da insegurança desses países gigantes, como Índia e China, em relação à segurança alimentar diante de uma eventual escassez de commodities primárias no mercado mundial, seja em função da crise climática ou de potenciais guerras."Verbalizar é importante, mudar é fundamentalSocialmente, avançamos em diversos debates importantes para construção de novas percepções que, consequentemente, impactam na formação para um novo consciente coletivo.De acordo com cientista político, tópicos como racismo, igualdade de gênero, violência contra a mulher e questões ambientais foram temas que progrediram na sociedade em 2021. No entanto, o especialista ressalta que mesmo com essas discussões em voga, ainda falta um longo percurso para que "a sociedade absorva medidas efetivas necessárias".Como exemplo, Cardoso destaca os números de crimes de feminicídio que cresceram em países como Brasil, Itália, França, Holanda, Rússia, entre outros neste ano.Temas que merecem maior visibilidadeAlém dos tópicos citados acima, o especialista enfatiza a necessidade de maior visibilidade para outras pautas a fim de se executar um desenvolvimento social mais amplo.Do ponto de vista econômico, Cardoso salienta a crise habitacional como uma pauta que precisa ganhar mais atenção, uma vez que é uma questão "muito grave tanto em países pobres quanto ricos".Já socialmente, o tráfico humano e os movimentos de migração internacional são os citados pelo cientista político, problemas esses que são globais. "A dramática situação de migrantes no mar Mediterrâneo não é menos desesperadora do que a da fronteira entre México e EUA.""O respeito à vida, à dignidade humana e o cultivo da empatia devem estar na base de todas as políticas sociais para que possamos manter a crença na humanidade e o desejo de futuro."Mil contatos nas redes, 0 amigos na vidaA saúde mental também foi um dos pontos mais delicados levantados pela pandemia, afinal, somos seres sociais e não nos sentimos tão confortáveis com o isolamento. Para diminuir a distância e criar calor, as redes sociais foram o canal encontrado mundialmente para continuar o convívio social mesmo que virtualmente. Mas até que ponto estamos realmente unidos na grande rede?Para responder à questão, Cardoso cita Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, o qual afirmou que a solidão "é a grande ameaça desses tempos individualistas", e que em países como Reino Unido e Japão a solidão tem sido tratada também como um problema de saúde pública.A interatividade com as redes também cria grande dificuldade para manutenção do diálogo, principalmente entre os mais jovens. "Diante de uma contrariedade, basta bloquear nosso interlocutor ou deixá-lo sem resposta", frisa o analista."Essa perda da capacidade do diálogo, que empobrece a qualidade das relações humanas, está na raiz de muitos descontentamentos com a vida, e tem aprofundado a crise da democracia em todo o mundo provocando um colapso da confiança entre pessoas e nas instituições", complementa.Pandemia da COVID-19 em 2021Até a chegada das vacinas, 2021 estava sendo um "Crtl C + Ctrl V" de 2020. O vírus da COVID-19 continuava "a todo vapor" provocando alta taxa de mortalidade, a qual não respeitava mais faixa etária, uma vez que pessoas novas e idosas estavam morrendo, assim como não deu trégua para a falência de estabelecimentos e progressão do desemprego.Ainda no começo de 2021, tratamentos como cloroquina, ivermectina e até mesmo o chamado "tratamento precoce" estavam sendo discutidos como possíveis formas de combate à pandemia, no entanto, o médico Sylvio Provenzano sublinha que a eficácia no combate foi realmente comprovada através da vacina: "Há quem ainda defenda esses tratamentos, mas é a vacina que baixou os números trágicos do coronavírus", diz Provenzano.Avanço na luta contra o vírusProvenzano afirma que houve avanço na luta contra o vírus globalmente. O fato fica bem notabilizado ao olharmos para um ano atrás, em 2020, quando os casos explodiram tragicamente no norte da Itália e em países europeus, os quais ficaram sem condições de tratar sua população, e hoje, com as vacinas, o quadro é diferente."Nós evoluímos muito no conhecimento da patogenia do SARS-CoV-2, sabemos mais sobre o processo inflamatório sistêmico que o vírus causa, sobre a importância do uso de corticoides, assim como foi validado o uso de anticorpos monoclonais, e acima de tudo, sabemos mais sobre as vacinas que vieram para tirar a humanidade de um buraco no qual fomos enfiados", esclarece o médico.Quebra de patentes e distribuiçãoO médico aponta que a quebra de patentes de vacinas é de interesse global, e que houve um esforço conjunto das grandes indústrias farmacêuticas como Pfizer, AstraZeneca, Moderna, para ser desenvolvida uma vacina em tempo recorde e acontece, no entanto, Provenzano afirma que "essa discussão ainda vai render muito nos tribunais internacionais".Porém, mesmo com a dedicação para se encontrar imunizantes eficazes e as discussões em torno da quebra de patentes para maior acesso global ao medicamento, o médico enfatiza que a má distribuição de vacinas ao redor do mundo, o fato dela não ter sido repartida de forma equilibrada, contribuiu "para que o resultado [da vacinação] a nível mundial não ter sido o que esperávamos".Marca do ápice do vírusProvenzano conta que no hospital no qual é o diretor do serviço de Clínica Médica, o Hospital Federal de Servidores do Estado, no Rio de Janeiro, o momento mais marcante foi quando no auge do vírus, o hospital, que recebe pacientes com patologias de alta complexidade – ou seja, segue uma linha específica médica – recebeu mais de 100 pacientes de uma vez com COVID-19 porque não tinham como serem atendidos em outro lugar."Hoje, não tenho nenhum paciente com coronavírus sendo tratado no hospital e podemos voltar a fazer aquilo que sempre foi objetivo deste hospital que é dar tratamento aqueles que durante praticamente dois anos tiveram seus tratamentos prejudicados devido ao excesso dos casos de COVID-19. E por que que isso aconteceu? Tratamento precoce? Não. Eu não tenho a menor dúvida: vacina", declara o médico.Chegada de 2022 e a COVID-19Sobre as perspectivas em torno da crise sanitária provocada pelo vírus, Provenzano diz estar convencido de que o SARS-CoV-2 veio para ficar, e que teremos que tomar de duas a três doses todos os anos, no mundo inteiro, para que a doença não acometa da forma que acometeu.O médico também deixa um recado e pede para que sempre que for possível "evitar lugares fechados com aglomerações de pessoas, utilizar a máscara durante um bom tempo ainda, lavar as mãos frequentemente, procurar se manter em lugares ventilados, assim como usar o álcool gel"."Essas são medidas de bom senso, medidas sanitárias extremamente úteis para evitar que sejamos infectados por esse vírus que continua aí e não vai embora, assim como o vírus da Influenza", conta o médico.Até o fechamento desta reportagem, o mundo registrou 238 milhões de casos de infecção pelo coronavírus e 4,2 milhões de óbitos, segundo o Our World in Data. No Brasil, foram registrados 22,2 milhões de casos e 619 mil mortes.De acordo com Arnaldo Cardoso, no Brasil, "uma ampla pesquisa revelou que a palavra do ano de 2021 foi vacina, em 2020 foi luto e para 2022 será esperança".
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Mesmo com grandes desafios impostos em diversos setores, 2021 conseguiu ser um pouco mais brando após o início das campanhas de vacinação contra a COVID-19,
nos permitndo respirar um pouco mais aliviados.
A tecnologia, que vem antecipando vários processos desde 2020, se concretizou com força, e já molda novos comportamentos a partir do momento que a sociedade passa a interagir e a trabalhar integralmente através da grande rede.
Temas antes com foco mais reduzido ganharam protagonismo, como as discussões em torno do racismo, das questões de gênero e ambientais, principalmente no que diz respeito à mudança climática, pauta principal em encontro de líderes mundiais deste ano, como na COP26.
Se alguns assuntos tiveram foco, outros nem tanto, mas merecem grande destaque a fim de serem solucionados,
como a situação de migrantes no canal da Mancha e na fronteira Belarus-Polônia, assim como o aumento do feminicídio em diversos países.
Sobre a pandemia, como mencionado, as campanhas de vacinação começam a fazer efeito, mas até hoje grupos antivacinas e os defensores do chamado "tratamento precoce" ainda fazem coro em muitos lugares. Até que ponto esses núcleos podem prejudicar a contenção diante de
novas variantes como a Ômicron?
A Sputnik Brasil traz para você uma retrospectiva analisando alguns dos principais acontecimentos deste ano que influenciaram a sociedade e a saúde global.
Solidariedade como capital social
Em 2021, o coronavírus
continuou presente na vida de todos, entretanto, de uma forma menos nociva, após as campanhas de vacinação. Hoje, a COVID-19 ainda é um dos grandes desafios vividos pela sociedade e, por conta de suas variantes, continua fazendo com que o contato entre as pessoas fique restrito, principalmente em forma de aglomeração.
Se por um lado a pandemia não nos permitiu ir tanto às ruas para nos manifestarmos pelos nossos direitos, por outro, "ela demonstrou uma solidariedade coletiva que estava um pouco adormecida por um estilo de vista mais individualista", diz Arnaldo Cardoso, cientista político formado pela PUC-SP e analista de Política Internacional à reportagem.
Para Cardoso, "as campanhas de ajuda com alimentos, roupas e agasalhos envolveram milhares de pessoas em todo Brasil e no mundo salvando vidas […] nesse contexto, a solidariedade se tornou o mais importante capital social".
No entanto, essa movimentação evidenciou a necessidade "de reformas do sistema de poder e de representação nas sociedades democráticas", visto que "a emergência sanitária demonstrou que os tradicionais sistemas políticos […] sofrem de uma perda de eficiência na escuta e atendimento de demandas sociais".
Neoliberalismo e relações de trabalho em conflito
Mas a pandemia não fica só pautada na questão sanitária, com ela, a sociedade vive crises, não só econômicas como também nas relações e nos direitos trabalhistas. Segundo Cardoso, "o
neoliberalismo está sendo posto em cheque".
"Processos de liberalização econômica, acompanhados de reformas políticas em todo mundo que transferiram ao mercado responsabilidades históricas do Estado, tiveram como consequência uma sucessão de crises globais [...]. Com a precarização da vida de trabalhadores em todo o mundo […] e o aumento da vulnerabilidade da economia global, a irrupção da pandemia da COVID-19 pois a nu uma série de coisas que já evidenciavam sua insustentabilidade", explica o especialista.
Cardoso também discursa sobre dois movimentos simultâneos que colaboram para precarização do trabalho: o processo de financeirização da economia e os choques tecnológicos das duas últimas décadas.
"Essa dinâmica tornou o trabalho escasso e desprezou o seu significado social. Junto a isso, a ideologia do consumo dissociada ao trabalho agrava a divisão de classes na sociedade contemporânea."
Ao mesmo tempo, Cardoso não enxerga em movimentos sindicais, por exemplo, uma resposta que possa interromper esse ciclo, já que "é difícil resgatar formas organizativas do passado para tratar o presente".
A luta de classe não acabou
Mesmo
com as novas relações de trabalho, esse ano foi possível acompanharmos um vasto e forte movimento social de uma classe esquecida no mundo industrial e corporativo no qual vivemos: a classe dos camponeses.
Na Índia, estima-se que 500 mil agricultores foram às ruas para protestar contra um conjunto de medidas elaboradas pelo governo que os deixava vulneráveis diante de grandes empresas na comercialização de commodities.
Após meses acampados, a classe conseguiu com que o governo de Narendra Modi desistisse da reforma agrícola e atendesse a vontade do setor. O movimento mostrou que a luta de classe não é coisa do passado.
"Os agricultores indianos
mostraram que reformas só podem ser legitimadas se atenderem às necessidades dos seus vários envolvidos. Vale ainda ressaltar, que [...] os protestos apontam para o crescimento da insegurança desses países gigantes, como Índia e China, em relação à segurança alimentar diante de uma eventual escassez de commodities primárias no mercado mundial, seja em função da crise climática ou de potenciais guerras."
Verbalizar é importante, mudar é fundamental
Socialmente, avançamos em diversos debates importantes para construção de novas percepções que, consequentemente, impactam na formação para um novo consciente coletivo.
De acordo com cientista político, tópicos como racismo, igualdade de gênero, violência contra a mulher e questões ambientais foram temas que progrediram na sociedade em 2021. No entanto, o especialista ressalta que mesmo com essas discussões em voga, ainda falta um longo percurso para que "a sociedade absorva medidas efetivas necessárias".
"Mesmo sendo fundamental que esses debates se instalem de forma permanente, medidas efetivas ainda estão muito aquém do necessário para eliminação dessas violências e formas de opressão operantes em inúmeras sociedades pelo mundo."
Como exemplo, Cardoso destaca os números de crimes de feminicídio que cresceram em países como Brasil, Itália, França, Holanda, Rússia, entre outros neste ano.
Temas que merecem maior visibilidade
Além dos tópicos citados acima, o especialista enfatiza a necessidade de maior visibilidade para outras pautas a fim de se executar um desenvolvimento social mais amplo.
Do ponto de vista econômico, Cardoso salienta a crise habitacional como uma pauta que precisa ganhar mais atenção, uma vez que é uma questão "muito grave tanto em países pobres quanto ricos".
Já socialmente, o tráfico humano e os movimentos de migração internacional são os citados pelo cientista político, problemas esses que são globais. "A dramática situação de migrantes no mar Mediterrâneo não é menos desesperadora
do que a da fronteira entre México e EUA."
"O respeito à vida, à dignidade humana e o cultivo da empatia devem estar na base de todas as políticas sociais para que possamos manter a crença na humanidade e o desejo de futuro."
Mil contatos nas redes, 0 amigos na vida
A saúde mental também foi um dos pontos mais delicados levantados pela pandemia, afinal, somos seres sociais e não nos sentimos tão confortáveis com o isolamento. Para diminuir a distância e criar calor,
as redes sociais foram o canal encontrado mundialmente para continuar o convívio social mesmo que virtualmente. Mas até que ponto estamos realmente unidos na grande rede?
Para responder à questão, Cardoso cita Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, o qual afirmou que a solidão "é a grande ameaça desses tempos individualistas", e que em países como Reino Unido e Japão a solidão tem sido tratada também como um problema de saúde pública.
"Falar da solidão é falar de afetos e o nosso tempo parece demandar isso, pois tem se caracterizado pelo descuido com os afetos, destacadamente no contínuo processo de virtualização das instâncias da vida. Bauman aponta as tecnologias digitais, principalmente as redes sociais, como importante variável para compreender o presente das relações humanas, pois, segundo ele, 'a Internet nos entorpece com entretenimento barato'", diz Cardoso.
A interatividade com as redes também cria grande dificuldade para manutenção do diálogo, principalmente entre os mais jovens. "Diante de uma contrariedade, basta bloquear nosso interlocutor ou deixá-lo sem resposta", frisa o analista.
"Essa perda da capacidade do diálogo, que empobrece a qualidade das relações humanas, está na raiz de muitos descontentamentos com a vida, e tem aprofundado a crise da democracia em todo o mundo provocando um colapso da confiança entre pessoas e nas instituições", complementa.
Pandemia da COVID-19 em 2021
Até a chegada das vacinas,
2021 estava sendo um "Crtl C + Ctrl V" de 2020. O vírus da COVID-19 continuava "a todo vapor" provocando alta taxa de mortalidade, a qual não respeitava mais faixa etária, uma vez que pessoas novas e idosas estavam morrendo, assim como não deu
trégua para a falência de estabelecimentos e progressão do desemprego.
Ainda no começo de 2021, tratamentos como cloroquina, ivermectina e até mesmo o chamado "tratamento precoce" estavam sendo discutidos como possíveis formas de combate à pandemia, no entanto, o médico Sylvio Provenzano sublinha que a eficácia no combate foi realmente comprovada através da vacina: "Há quem ainda defenda esses tratamentos, mas é a vacina que baixou os números trágicos do coronavírus", diz Provenzano.
Avanço na luta contra o vírus
Provenzano afirma que houve avanço na luta contra o vírus globalmente. O fato fica bem notabilizado ao olharmos para um ano atrás, em 2020, quando os casos explodiram tragicamente no norte da Itália e em países europeus, os quais ficaram sem condições de tratar sua população, e hoje, com as vacinas, o quadro é diferente.
"Nós evoluímos muito no conhecimento da patogenia do SARS-CoV-2, sabemos mais sobre o processo inflamatório sistêmico que o vírus causa, sobre a importância do uso de corticoides, assim como foi validado o uso de anticorpos monoclonais, e acima de tudo, sabemos mais sobre as vacinas que vieram para tirar a humanidade de um buraco no qual fomos enfiados", esclarece o médico.
Quebra de patentes e distribuição
O médico
aponta que a quebra de patentes de vacinas é de interesse global, e que houve um esforço conjunto das grandes indústrias farmacêuticas como Pfizer, AstraZeneca, Moderna, para ser desenvolvida uma vacina em tempo recorde e acontece, no entanto, Provenzano afirma que "
essa discussão ainda vai render muito nos tribunais internacionais".
Porém, mesmo com a dedicação para se encontrar imunizantes eficazes e as discussões em torno da quebra de patentes para maior acesso global ao medicamento, o médico enfatiza que a má distribuição de vacinas ao redor do mundo, o fato dela não ter sido repartida de forma equilibrada, contribuiu "para que o resultado [da vacinação] a nível mundial não ter sido o que esperávamos".
Provenzano conta que no hospital no qual é o diretor do serviço de Clínica Médica, o Hospital Federal de Servidores do Estado, no Rio de Janeiro, o momento mais marcante foi quando no auge do vírus, o hospital, que recebe pacientes com patologias de alta complexidade – ou seja, segue uma linha específica médica – recebeu mais de 100 pacientes de uma vez com COVID-19 porque não tinham como serem atendidos em outro lugar.
"Hoje, não tenho nenhum paciente com coronavírus sendo tratado no hospital e podemos voltar a fazer aquilo que sempre foi objetivo
deste hospital que é dar tratamento aqueles que durante praticamente dois anos tiveram seus tratamentos prejudicados devido ao excesso dos casos de COVID-19. E por que que isso aconteceu? Tratamento precoce? Não.
Eu não tenho a menor dúvida: vacina", declara o médico.
Chegada de 2022 e a COVID-19
Sobre as perspectivas em torno da crise sanitária provocada pelo vírus, Provenzano diz estar convencido de
que o SARS-CoV-2 veio para ficar, e que teremos que tomar de duas a três doses todos os anos, no mundo inteiro, para que a doença não acometa da forma que acometeu.
"O que nós temos visto hoje é que países onde grupos antivacinas proliferam estão sofrendo com essa nova variante, a Ômicron. Aqui no Brasil, não observamos isto porque esses grupos não têm terreno fértil que tiveram alguns como nos EUA ou na Europa. Eu lamento que essas pessoas não se convençam que imunizar é o avanço da ciência que permitiu a erradicação de algumas doenças como a varíola, por exemplo."
O médico também deixa um recado e pede para que sempre que for possível "evitar lugares fechados com aglomerações de pessoas, utilizar a máscara durante um bom tempo ainda, lavar as mãos frequentemente, procurar se manter em lugares ventilados, assim como usar o álcool gel".
"Essas são medidas de bom senso, medidas sanitárias extremamente úteis para evitar que sejamos infectados por esse vírus que continua aí e não vai embora, assim como o vírus da Influenza", conta o médico.
Até o fechamento desta reportagem, o mundo registrou 238 milhões de casos de infecção pelo coronavírus e 4,2 milhões de óbitos,
segundo o Our World in Data. No Brasil, foram
registrados 22,2 milhões de casos e 619 mil mortes.
De acordo com Arnaldo Cardoso, no Brasil, "uma ampla pesquisa revelou que a palavra do ano de 2021 foi vacina, em 2020 foi luto e para 2022 será esperança".