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'Ameniza, mas não resolve': de olho nas eleições, 'PEC Kamikaze' chega em clima de incerteza

© Folhapress / Gabriela BilóO presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, durante cerimônia em alusão ao Dia do Exército, com a Imposição da Ordem do Mérito Militar e da Medalha Exército Brasileiro, em Brasília, 19 de abril de 2022
O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, durante cerimônia em alusão ao Dia do Exército, com a Imposição da Ordem do Mérito Militar e da Medalha Exército Brasileiro, em Brasília, 19 de abril de 2022 - Sputnik Brasil, 1920, 09.08.2022
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Nesta terça-feira (9), o governo brasileiro deu início ao pagamento de auxílios emergenciais a taxistas e caminhoneiros, parte de uma ampla medida que alterou as regras eleitorais às vésperas do pleito presidencial. A Sputnik Brasil ouviu representantes da categoria e um petroleiro para discutir o impacto do auxílio e os preços dos combustíveis.
Os altos preços dos combustíveis no Brasil inflamaram a crise política do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), que tenta viabilizar sua reeleição. Sendo um dos principais elementos que compõem a inflação, mensurada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), inclusive o preço dos alimentos, os valores dos combustíveis se tornaram uma questão de sobrevivência para o cidadão comum e um problema sério para o Planalto.
Comprometido com a política de preços da Petrobras, atrelada ao mercado internacional, Bolsonaro tentou, em vão, jogadas políticas com mudanças na chefia da estatal e em seguida propôs uma emenda constitucional para reduzir impostos nas bombas e entregar auxílios financeiros à população. Proibida pela lei eleitoral por beneficiar a campanha do presidente, a medida foi aprovada sob a criação de um "estado de emergência".
A emenda, apelidada pela imprensa de "PEC Kamikaze" e "PEC Eleitoral", tem custo de cerca de R$ 41 bilhões e não teve dificuldades para ser aprovada no Congresso Nacional. Além de ampliar os valores do Auxílio Brasil e do Auxílio Gás, a emenda criou benefícios emergenciais para caminhoneiros e taxistas, impactados diretamente pelos altos preços dos combustíveis. No total, os auxílios para essas categorias custarão R$ 7,4 bilhões.
© Folhapress / Ricardo BorgesNo Rio de Janeiro, taxistas protestam contra liminar que autoriza o uso do aplicativo Uber na cidade, em 1º de abril de 2016
No Rio de Janeiro, taxistas protestam contra liminar que autoriza o uso do aplicativo Uber na cidade, em 1º de abril de 2016 - Sputnik Brasil, 1920, 09.08.2022
No Rio de Janeiro, taxistas protestam contra liminar que autoriza o uso do aplicativo Uber na cidade, em 1º de abril de 2016. Foto de arquivo
Para Vagner Monteiro, diretor de comunicação do Sindicato dos Taxistas Autônomos do Município do Rio de Janeiro (STAMRJ), o auxílio não resolve o problema causado pelo aumento dos combustíveis, mas "ameniza" uma situação que obriga os taxistas a manterem longas jornadas de trabalho. Segundo Monteiro, dados da prefeitura carioca apontam que há cerca de 47 mil taxistas na cidade aptos a receberem o auxílio.

"Isso porque o taxista, hoje, cumprindo uma jornada aí de 12–13 horas, está consumindo de R$ 100 a R$ 130 por dia de combustível. Para um taxista trabalhando seis dias por semana, esse valor [do auxílio] daria para aproximadamente dez dias, no máximo. Então não resolve, mas ameniza bastante, ajuda bastante. A ajuda é muito bem-vinda", afirma Monteiro em entrevista à Sputnik Brasil.

O diretor do STAMRJ salienta que o prejuízo causado pelo aumento dos combustíveis causa uma queda na qualidade de vida dos taxistas. Segundo ele, para compensar o aumento dos gastos com os veículos, os motoristas estão trabalhando mais.
"Trabalhando mais horas ele perde em qualidade de vida, descansa menos, vê menos a família e tem menos tempo de descanso. Então o maior prejuízo, além do financeiro, é claro, é na qualidade de vida do taxista", ressalta.
Por essa razão, Monteiro aponta que a categoria reagiu "muito bem" ao anúncio do auxílio. Apesar disso, ele acredita que a introdução do benefício "não deve mudar muito o cenário político" entre os taxistas, mas pondera que não é possível prever o real efeito.
Segundo o diretor do STAMRJ, o pagamento do auxílio BEm Taxista deveria ser estendido para pelo menos 12 meses, "até que o país se estabilize economicamente e que se alcance a estabilização nos preços dos combustíveis".
© Folhapress / Danilo VerpaGreve dos caminhoneiros contra a fase vermelha, na rodovia Castelo Branco, na entrada da marginal Tietê, em São Paulo
Greve dos caminhoneiros contra a fase vermelha, na rodovia Castelo Branco, na entrada da marginal Tietê, em São Paulo - Sputnik Brasil, 1920, 09.08.2022
Greve dos caminhoneiros contra a fase vermelha, na rodovia Castelo Branco, na entrada da marginal Tietê, em São Paulo. Foto de arquivo
Em julho, o presidente licenciado da Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores (Abrava), Wallace Landim, também comentou o assunto em entrevista à Sputnik Brasil. Segundo ele, o auxílio de R$ 1 mil para caminhoneiros seria "uma tentativa clara de comprar o direito mais digno de um cidadão, que é o seu voto". Em sua fala, Landim também criticou o atual governo, acusando o Planalto de prejudicar a categoria ao longo da gestão com os preços dos combustíveis e depois "oferecer uma muleta" com o auxílio.

Bolsonaro tinha alternativas melhores para combater crise, aponta petroleiro

Para Deyvid Bacelar, coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), o governo Bolsonaro tinha alternativas mais efetivas para combater o impacto dos preços dos combustíveis. Para ele, o governo ignorou a possibilidade de mudança da política do preço de paridade internacional (PPI) da Petrobras, o que poderia ter mantido os preços sob controle. Além de indicar o presidente da estatal, o governo tem maioria no conselho de administração da empresa.

"O governo Bolsonaro, em vez de trabalhar para buscar a mudança da política de preços dos combustíveis no Brasil — favorecendo a população e ajudando no controle da inflação — preferiu atender aos interesses de acionistas minoritários [da Petrobras]", afirma Bacelar à Sputnik Brasil, apontando que Bolsonaro teme ferir interesses de acionistas estrangeiros e de refinarias norte-americanas.

© Folhapress / Luciano Claudino / Código 19Instalações da Refinaria de Paulínia (Replan), da Petrobras, em São Paulo, Brasil, 3 de maio de 2022
Instalações da Refinaria de Paulínia (Replan), da Petrobras, em São Paulo, Brasil, 3 de maio de 2022 - Sputnik Brasil, 1920, 09.08.2022
Instalações da Refinaria de Paulínia (Replan), da Petrobras, em São Paulo, Brasil, 3 de maio de 2022
O petroleiro destaca que Bolsonaro já foi crítico do PPI, mas mudou de postura ao assumir o governo e dar continuidade à política de preços implementada durante a gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB). Além disso, o petroleiro ressalta que outras escolhas do governo Bolsonaro agravaram a crise. Entre elas, a subutilização da capacidade de refino da empresa e a própria venda de refinarias, além de outros ativos da Petrobras.
"Isso obviamente reduziu o grau de participação da Petrobras no mercado de combustíveis aqui no país e aumentou a possibilidade e a oportunidade para importadoras, que se instalaram no país para trazerem derivados de petróleo ao Brasil, principalmente diesel e gás de cozinha", aponta.
Para Bacelar, diante da atuação do governo em relação aos combustíveis, a medida apelidada de "PEC Kamikaze" pode ver vista como uma ação "eleitoreira" do governo Bolsonaro, que tentará a reeleição em outubro. Segundo ele, o governo deveria atacar a "raiz do problema" e poderia empregar melhor os recursos despendidos com a medida.

"Nada contra, obviamente, os caminhoneiros e taxistas. Até porque os próprios caminhoneiros e taxistas sabem muito bem que essa ação ou medida eleitoreira desses auxílios que foram anunciados e aprovados no Congresso Nacional não vai resolver o problema. Estamos falando de valores baixos diante de preços altíssimos, principalmente com relação ao diesel, que hoje ultrapassa o preço da gasolina em todos os estados", avalia.

© AP Photo / Silvia IzquierdoCartaz criticando o presidente Jair Bolsonaro no local onde o Sindicato dos Petroleiros da Petrobras vende gás de cozinha de baixo custo, na favela Vila Vintém, Rio de Janeiro, 28 de outubro de 2021
Cartaz criticando o presidente Jair Bolsonaro no local onde o Sindicato dos Petroleiros da Petrobras vende gás de cozinha de baixo custo, na favela Vila Vintém, Rio de Janeiro, 28 de outubro de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 09.08.2022
Cartaz criticando o presidente Jair Bolsonaro no local onde o Sindicato dos Petroleiros da Petrobras vende gás de cozinha de baixo custo, na favela Vila Vintém, Rio de Janeiro, 28 de outubro de 2021

Instabilidade internacional traz incerteza sobre preços

Apesar da leve queda nos preços dos combustíveis devido ao corte do ICMS, os preços ainda estão sujeitos à variação internacional, como determina o PPI da Petrobras. Conforme dados do site Trading Economics, o barril de petróleo bruto tipo Brent é atualmente negociado a cerca de US$ 95 (R$ 487,89) no mercado internacional. Em março, esse valor passou de US$ 123 (R$ 631,69).
Mesmo com a queda desde o pico de março, o valor segue alto e deve continuar assim, conforme detalha o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar. Segundo ele, pressões internacionais como o conflito na Ucrânia e os temores de uma recessão mundial devem manter um clima de incerteza sobre os preços e consequentemente os riscos ao consumidor brasileiro.

"Os preços dos combustíveis durante os próximos períodos, principalmente até o processo eleitoral, continuarão os mesmos, ou seja, nas alturas — esses preços que a população não consegue pagar. Estamos falando de donas de casa que estão cozinhando com lenha e álcool, pessoas que estão se acidentando, morrendo com acidentes que ocorrem dentro dos lares porque as pessoas têm que optar entre comer e comprar o gás de cozinha. Então a expectativa não é das melhores", afirma.

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