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Provocação × mediação: o que querem os EUA de Trump, afinal?

© AP Photo / Manuel Balce CenetaO presidente dos EUA, Donald Trump, ao lado do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, após a assinatura do documento que reconhece a soberania de Israel sobre as Colinas de Golã
O presidente dos EUA, Donald Trump, ao lado do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, após a assinatura do documento que reconhece a soberania de Israel sobre as Colinas de Golã - Sputnik Brasil, 1920, 09.07.2025
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Em seu segundo mandato, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem se destacado pela maneira como vem intercalando esforços para mediar conflitos com medidas para fomentar outros. Em entrevista à Sputnik Brasil, analistas explicam o que o governo norte-americano busca com esse tipo de estratégia.
Em declarações ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, a professora de relações internacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Dominique Marques traçou um panorama crítico sobre o papel dos Estados Unidos na geopolítica global, com destaque para a recente escalada de tensões entre Israel e Irã. Para ela, a postura norte-americana segue um padrão estratégico de "fabricar a crise para depois colher dividendos diplomáticos", o que revela um jogo de poder sustentado por intervenções militares, manipulação de narrativas e controle global da informação.
O diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi, visita uma subestação na região de Kiev, Ucrânia, em 4 de fevereiro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 08.07.2025
Panorama internacional
Análise: ação dos EUA e de Israel contra o Irã deslegitima todo o regime de não proliferação nuclear
Segundo Dominique, a atuação dos EUA no Oriente Médio se insere em uma lógica histórica de desequilíbrio proposital. "Estados Unidos é igual a um jogo de xadrez: para os amadores, a gente só pensa na próxima jogada. Estados Unidos já pensou três", afirmou. Ela resgata o pensamento do geopolítico Nicholas Spykman para explicar por que Washington busca conter potências como Rússia e China: impedir o surgimento de uma aliança forte no eixo da Eurásia, região vista como estratégica para o controle global.
A professora também destacou como a retórica da "legítima defesa" tem sido usada para justificar ações militares unilaterais, principalmente após o 11 de Setembro.

Ela cita o pesquisador Tiago Rodrigues, da Universidade Federal Fluminense (UFF), ao discutir como a ideia de "guerra justa" foi atualizada: "A legítima defesa passa a assumir um caráter de intervenções preventivas, sob a bandeira de uma defesa pela democracia, só que você acaba invadindo outros países."

Nesse contexto, Dominique critica a atuação de Israel e os interesses por trás dos ataques ao Irã: "Há quem diga que Israel está fazendo o serviço sujo. […] Não é mediador. A meu ver, não está mediando nada." Ela questiona a legitimidade dos ataques preventivos israelenses, chamando a atenção para o fato de que Israel não assinou os acordos nucleares cobrados ao Irã, mas ainda assim se reserva o direito de atacar sob o argumento de prevenção.
Dominique também observa nos ataques uma tentativa do governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu de desviar o foco do genocídio em Gaza. "Pode ser uma forma de tirar o foco. Porque o genocídio que acontece em Gaza o mundo inteiro já viu. E quem defende ainda, eu não sei que tipo de matéria jornalística anda lendo. Porque é desumano."
Ao comentar o papel de Trump, a professora aponta um comportamento errático e autoritário: "Uma pessoa que sai publicando nas redes sociais a cada dois minutos uma ideia nova, diferente, não passa justamente a figura do líder." Para ela, o presidente representa mais um sintoma do momento de instabilidade da política estadunidense do que uma solução.
Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, acena durante foto dos chefes de Estado e de governo dos países presentes na Cúpula de Líderes do BRICS, no Museu de Arte Moderna (MAM). Rio de Janeiro, 7 de julho de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 08.07.2025
Notícias do Brasil
'Golpe na hegemonia do dólar', avaliam analistas sobre avanços da Cúpula do BRICS

BRICS desafia hegemonia

A hegemonia norte-americana, porém, encontra novos desafios em um cenário que se aproxima de uma ordem multipolar. Dominique citou o avanço do BRICS e o fortalecimento da China como elementos que ameaçam o domínio ocidental. "O próprio BRICS quando vem dizendo 'vamos trabalhar em outra moeda', isso era inviável há dez anos. […] Agora, isso já é possível."
Quanto à maneira como o Ocidente constrói seus inimigos, Dominique cita a teoria construtivista das relações internacionais. Para ela, Rússia e China são alvos constantes de uma construção narrativa que as posiciona como ameaças.

"Se fosse um ataque russo ou chinês, ia ser uma questão de terrorismo", pontuou, lembrando que até mesmo o avanço do 5G chinês foi taxado como ameaça à segurança nacional pelos EUA.

Em tom crítico, ela questiona o uso político do conceito de terrorismo: "O terrorismo é tudo aquilo que eu considero uma ameaça a mim." A frase, atribuída a uma definição não oficial ligada aos serviços de inteligência norte-americanos, evidencia, para ela, a flexibilidade moral por trás das intervenções militares dos EUA.
O que significa uma trégua quando ela é mediada por quem incentivou o conflito? Para o jornalista e mestre em ciência política Marcelo Bamonte, a recente suspensão das hostilidades entre Israel e Irã não passa de mais um episódio da longa estratégia estadunidense de "plantar a doença para depois vender a cura".
"O histórico é claro: em 1953, os EUA já haviam derrubado o premiê iraniano Mohammad Mossadegh por tentar nacionalizar o petróleo. A tática se repete desde então", lembrou. Segundo Bamonte, a escalada atual, que incluiu ataques a instalações nucleares iranianas, se insere nesse padrão: uma provocação deliberada, seguida de mediação estratégica, mascarada de pacificação.
O cessar-fogo, longe de significar o fim das tensões, teria sido imposto pelas consequências econômicas de um movimento inesperado: o fechamento temporário do estreito de Ormuz pelo Irã, rota vital para o comércio de petróleo. "O Ocidente só reagiu porque o bolso foi ameaçado."
Rafael Grossi, diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), chega a reunião do Conselho de Governadores da AIEA em Viena, Áustria, em 22 de novembro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 09.07.2025
Panorama internacional
Programa nuclear do Irã é impossível de ser encerrado por meios militares, diz chefe da AIEA
Para o analista, não há paz — apenas silêncio momentâneo. Israel, enfraquecido internamente por uma crise econômica sem precedentes, teria aproveitado a trégua para se rearticular militarmente. O Irã, por sua vez, segue empenhado na expansão do seu programa nuclear, que, segundo Bamonte, representa "a única garantia real de soberania diante de inimigos muito mais armados".
Em sua leitura, o conflito recente expôs, ainda, a fragmentação do chamado Eixo da Resistência, formado pelo Irã e por grupos como Hezbollah, Hamas e os houthis, entre outros.
"Nunca o eixo esteve tão frágil. O Hezbollah sofreu milhares de ataques, o Hamas já sinaliza apoio à solução de dois Estados, e até a Síria ensaia reaproximação com Israel."
Enquanto isso, os Estados Unidos e seus aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) reforçam bases no Leste Europeu e no Golfo, ao mesmo tempo em que exigem aumento recorde de gastos militares. "A OTAN não age em defesa coletiva. Isso é corrida armamentista disfarçada", criticou. Os dados apresentados são eloquentes: em 2024, os EUA gastaram mais em defesa do que os nove países seguintes do ranking somados.
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