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O último mergulho: mortandade de golfinhos no Rio continua intrigando especialistas

O aumento da mortandade de botos-cinza na Baía de Sepetiba, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, continua intrigando especialistas. Em 20 dias, quase 100 carcaças de animais já foram recolhidas, o que equivale a 10% da população desses animais na região.
Sputnik

Antes restritas a adultos machos da espécie, as mortes agora acontecem também com fêmeas e filhotes, que apresentam sinais de magreza extrema e lesões na pele. Para entender a causa desse fenômeno, a Sputnik Brasil conversou com um dos maiores especialistas no assunto, Leonardo Flack, biólogo e coordenador científico do Instituto Boto Cinza, entidade que desde 2009 estuda e defende a preservação de golfinhos no país.

Flack diz que a preocupação é grande, uma vez que a Baía de  Sepetiba e a Ilha Grande são os locais que concentram a maior população mundial de botos-cinzas, embora eles também possam ser encontrados ao longo de quase todo o litoral brasileiro, do Pará até Santa Catarina.  A espécie é classificada como risco de extinção pelo Ministério do Meio Ambiente.

"Já existia um padrão alto de mortalidade. Até 2011, a gente tinha uma média de um animal (morto) por mês. De 2011 até dezembro de 2017, começou a ter um aumento de cinco animais por mês. Hoje, a gente tem seis portos dentro da Baía de Sepetiba, o que diminuiu a área dos pescadores artesanais que pescam com redes de malha. No mundo, a maior ameaça para os golfinhos costeiros está relacionada à captura acidental por essas redes de malha", explica o biólogo.

Flack diz que de 2015 para cá o estado de saúde dos animais vem piorando. A partir do mês passado, os corpos dos animais começaram a apresentar lesões em maior grau, também nos olhos, com uma coloração opaca e sanguinolenta. Para tentar determinar a origem das mortes, os biólogos começaram a eliminar algumas hipóteses como a maré vermelha (intoxicação por algas), que poderia estar matando outras espécies como algas e tartarugas, o que não ocorre. Também foram descartados derrame de óleo e poluição. 

A suspeita agora é da incidência de vírus e bactérias que estariam vitimando a espécie. Laboratórios da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade de São Paulo (USP) estão estudando as causas, inclusive pesquisando o DNA dos vírus, mas os resultados finais da pesquisa ainda não têm data de conclusão.

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O coordenador científico do Instituto Boto Cinza observa que as primeiras mortalidades ocorreram na Baía da Ilha Grande, atingindo depois a Baía de Sepetiba. Na Ilha Grande, em um mês foram quase 60 botos recolhidos. Nas duas regiões, em 20 dias, já são quase 100 corpos. Entidades ambientalistas consideram que uma mortalidade de 2% ao ano já é alta e preocupante para a espécie.

"Os botos da Baía de Sepetiba apresentam um fenômeno raro para golfinhos costeiros: eles agregam centenas de indivíduos todas as manhãs. Essa agregação provavelmente se desenvolveu para ajudar o animal na pesca, evitar predadores e melhorar as chances de reprodução, mas é uma desvantagem quando se tem uma doença, porque ela se propaga mais rápido", observa o especialista.

Flack discorda a tese, defendida por alguns oceanógrafos, de que efeitos do ciclo lunar, como a chamda Super Lua — quando o satélite está mais próximo da Terra — provoca marés mais intensas, o que liberaria a poluição do leito marítimo. Flack diz que, se isso fosse verdade, outras espécies, como peixes e invertebrados, também estariam morrendo. 

Flack diz que o Instituto Boto Cinza, que sempre recebeu apoio do Ministério Público Estadual nas campanhas contra a pesca ilegal na região, tem alertado os órgãos ambientais como o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) sobre o problema para o qual o instituto enviou um projeto de criação de uma unidade de conservação ambiental que até agora não foi aprovada pelo órgão.

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