Em opinião do chefe do Centro de Estudos de Problemas Públicos de Segurança Nacional, coronel aposentado, Aleksandr Zhilin, esta iniciativa dos militares brasileiros tem a ver com a tensão cada vez maior no mundo e a política belicista dos EUA, em primeiro lugar.
Ainda de acordo com Zhilin, o Brasil, particularmente, tenta prevenir uma possível agressão ao se engajar nesse projeto ambicioso. Vale relembrar que atualmente apenas cinco países, mesmos de entre os que possuem assentos permanentes no Conselho de Segurança da ONU, dispõem de tais submersíveis.
"Acho que aqui se trata do seguinte: se trata de que o Brasil quer criar uma arma de retaliação e assegurar sua segurança militar com isso. O que isso quer dizer? Um submarino moderno, nuclear, tem capacidade de desferir um ataque bem duro contra um inimigo. E, por exemplo, caso algum país planeje usar suas armas contra o Brasil, este país não pode descartar o fato do Brasil ter submarinos não detectados, que estejam efetuando suas missões em alguma região próxima à Estátua da Liberdade…", manifestou o interlocutor da Sputnik.
Para ele, apenas tal política pode acalmar as "cabeças quentes" dos "anglo-saxões". Assim, assegura o especialista, a política exterior estadunidense acaba sendo a principal razão para o alastramento das armas nucleares pelo globo.
Zhilin relembrou a recente história dos conflitos no Oriente Médio para ilustrar sua posição: segundo ele, os países que subestimaram "a ameaça norte-americana" e não prestaram atenção ao estado do seu exército "tiveram que pagar" por sua negligência e de fato "deixaram de existir".
Respondendo à pergunta sobre se a América Latina, região tradicionalmente bem pacífica, começa a se militarizar, o especialista duvidou, pois ainda se trata de um submarino só. Elogiou, ademais, o plano cunhado pelos brasileiros — cooperar com os franceses na etapa de projeção, mas contar com a produção 100% nacional na própria construção do navio.
"Eles acordam com os franceses, conhecem as tecnologias, assim como os chineses fazem, ganham algum conhecimento, e depois dizem obrigado pela cooperação e pronto. […] Isso é certo. Pois eles [brasileiros] veem que aqueles que seguiram esse padrão se defenderam pelo menos de alguma maneira", enfatizou o militar aposentado.
Mas, se isso tudo é assim mesmo, será que as potências ocidentais vão deixar isso passar? No ver de Zhilin, podem não deixar, e o projeto do submarino nuclear brasileiro ainda pode encarar riscos sérios, além dos internos, como a escassez de especialistas e o financiamento.
"Eu simplesmente sei que os EUA e o Reino Unido vão se manifestar extremamente contra. E ainda não é certo que o projeto se realize, pois a pressão contra a França será inédita. […] A pressão será colossal, por isso vamos ver se a França vai ter coragem suficiente. Pois o Brasil pode estar disposto, ele é menos dependente destas forças do mal. Mas pode haver grande pressão contra ele também", concluiu, relembrando o caso de afastamento de Dilma Rousseff que, em sua opinião, foi ato forçado para se livrar de uma figura "indesejada" no palco político brasileiro.
Entretanto, a opinião do especialista não foi compartilhada por outro analista da mesma área, o ex-militar Konstantin Sivkov.
"Provavelmente não haverá nenhumas objeções por parte da Rússia, França e China [países que integram o "clube nuclear" e possuem submarinos desta espécie]. Pode ser que os EUA objetem. Mas, sendo que esta questão está na pauta por muito tempo, e eles nunca se manifestaram, nunca reagiram, acho que não haverá protesto contra a criação da frota de submarinos nucleares brasileira por parte do Conselho de Segurança da ONU", disse ele à Sputnik Brasil.
Em opinião de Sivkov, o projeto é estreitamente ligado às ambições geopolíticas de Brasília, que "está construindo uma zona de influência no Atlântico Sul" e precisa de desenvolver sua frota com esta finalidade.
Enquanto isso, há teorias segundo as quais a construção do navio, cujo começo está agendado para 2023 e o fim — para 2028, caso dê certo, possa contribuir para as buscas brasileiras de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, iniciativa que é promovida ativamente nas últimas décadas, especialmente no governo petista.
Contudo, Sivkov opinou que isto é pouco provável.
"Isto não tem nada a ver com um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. O Brasil, para se virar um, precisa ganhar uma influência geopolítica bem grande, que por enquanto não tem. O potencial militar dele também ainda não garante a produção de armamentos modernos. […] Por isso, ainda está longe", resumiu.