A Agência Reuters teve acesso ao relatório, de 3 de outubro de 2018, que mostra que a Vale classificou a barragem 1 na mina de Córrego do Feijão como sendo duas vezes mais provável de fracassar do que o nível máximo de risco tolerado pela própria política de segurança de barragens da empresa.
A Vale não respondeu imediatamente a um pedido de comentário. Ela citou anteriormente uma auditoria independente no ano passado declarando a barragem segura, e disse que o equipamento mostrou que a estrutura estava estável apenas algumas semanas antes do colapso.
O documento anteriormente não relatado é a primeira evidência de que a própria Vale estava preocupada com a segurança da barragem. Isso levanta questões sobre por que a auditoria, ao mesmo tempo, garantiu a estabilidade da barragem e por que a mineradora não tomou precauções, como mover uma cantina da empresa que descia a encosta da estrutura.
O colapso da barragem de rejeitos em 25 de janeiro em Minas Gerais foi o mais mortal acidente de mineração do Brasil e segundo grande colapso de uma barragem de mineração da Vale em cerca de três anos.
Intitulado "Resultados da Gestão de Risco Geotécnico", o relatório interno da Vale de outubro colocou a barragem de Brumadinho dentro de uma "zona de atenção", dizendo que era necessário que "todos os controles de prevenção e mitigação estivessem sendo aplicados".
Um fracasso pode custar à empresa US$ 1,5 bilhão e tem o potencial de matar mais de cem pessoas, segundo o relatório. A barragem foi marcada para descomissionamento.
Outras nove barragens no Brasil, das 57 que foram estudadas, também foram colocadas na "zona de atenção", de acordo com o relatório.
Um relatório separado da Vale datado de 15 de novembro de 2017, também visto pela Reuters, afirma que qualquer estrutura com uma chance anual de falha acima de 1 em 10.000 deve ser levada à atenção do diretor executivo e do conselho.
A chance anual de queda da represa foi registrada como 1 em 5.000, ou o dobro do "nível máximo de risco individual" tolerável, de acordo com o relatório.
"Isso não é bom em minha opinião, especialmente se você considerar que essas estruturas são de longo prazo", afirmou David Chambers, geofísico do Centro de Ciência em Participação Pública e especialista em barragens de rejeitos.
A Reuters não pôde confirmar se o conselho ou o diretor executivo Fabio Schwartzman estava ciente do risco associado à barragem.
O relatório identifica a liquefação estática e a erosão interna como as causas mais prováveis de uma falha potencial.
Ainda não se sabe o que estava por trás do colapso da barragem em Brumadinho, mas uma autoridade ambiental do estado disse à agência neste mês que todas as evidências apontavam para a liquefação.
A liquefação é um processo pelo qual um material sólido como areia perde força e rigidez e se comporta mais como um líquido. Foi a causa de outro colapso mortal em 2015, na cidade mineira de Mariana, em uma mina próxima e de co-propriedade da Vale, que resultou no pior desastre ambiental do Brasil.
"Costumávamos dizer que esses tipos de incidentes de mineração eram atos de Deus, mas agora […] nós os consideramos fracassos em engenharia", declarou Dermot Ross-Brown, engenheiro da indústria de mineração que leciona na Escola de Minas do Colorado.
A Vale disse que vai investir cerca de US$ 400 milhões a partir de 2020 para reduzir sua dependência de barragens de rejeitos, que armazenam detritos da mineração.