Mais um passo imprudente: o que significa decisão de Trump sobre Colinas de Golã?

Em 25 de março, o presidente dos EUA Donald Trump reconheceu a soberania israelense sobre as Colinas de Golã. A Sputnik explica por que essa decisão causou grande polêmica e que consequências ela poderia ter para o Oriente Médio.
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Declarando que chegou o momento de os EUA reconhecerem plenamente a soberania de Israel sobre as disputadas Colinas de Golã, o presidente americano Donald Trump assinou um decreto nesta segunda-feira (25) reconhecendo a soberania israelense sobre o território.

A decisão não foi apoiada pela ONU e por muitos Estados porque viola o direito internacional, incluindo uma série de resoluções da ONU.

Mas por que é que essa disputa territorial entre a Síria e Israel atraiu a atenção da comunidade internacional? Que consequências pode causar a decisão unilateral do presidente americano de reconhecer a soberania israelense sobre o território disputado?

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Para entender a essência do conflito é indispensável perceber a história da disputa entre a Síria e Israel em torno das Colinas de Golã. Desde 1946, as Colinas de Golã fizeram parte da província síria de Quneitra, mas após a Guerra dos Seis Dias de 1967 entre Israel e países árabes, Israel ocupou dois terços do território de Golã. No mesmo ano o Conselho de Segurança da ONU aprovou a resolução 242 que apela à saída das tropas israelenses dos "territórios ocupados".

Quatorze anos depois, em 1981, o parlamento israelense Knesset proclamou unilateralmente a soberania sobre o território, anexando formalmente a área. Em 17 de dezembro de 1981, o Conselho de Segurança da ONU aprovou a resolução 497, declarando as ações de Israel como "nulas e sem efeito legal internacional".

As tensões em torno da região disputada têm se intensificado nos últimos anos devido à guerra civil na Síria. Ambas as partes em conflito se acusam regularmente a outra parte de realizar ataques, agravando assim a situação existente.

Vale destacar que as Colinas de Golã são uma área estratégica com cerca de 1.200 quilômetros quadrados, o que é importante em vários aspectos: além do seu valor simbólico, estão sendo usadas por Israel como zona tampão natural contra possíveis ameaças militares da Síria e também possuem importantes recursos hídricos que garantem um terço de todo o abastecimento de água de Israel. Além disso, a capital síria, Damasco, está a cerca de 60 quilômetros ao norte das Colinas de Golã e é claramente visível do alto delas.

Violação do direito internacional

Apesar de todas as resoluções do Conselho de Segurança da ONU, em 25 de março o presidente americano, Donald Trump, assinou um decreto reconhecendo a soberania de Israel sobre as disputadas Colinas de Golã, anulando mais de 50 anos de política dos EUA em relação à região.

Damasco condena veementemente a posição da administração americana atual em torno da Colinas de Golã.

"Já se tornou claro para a comunidade internacional que os EUA e a sua política imprudente, na qual dominam a arrogância e as ambições hegemónicas, são o principal fator de agravamento da situação no palco mundial, ameaçando a paz e a estabilidade", lê-se em um comunicado da chancelaria síria.

A decisão de Washington provocou grande polêmica na comunidade internacional. Mesmo os países da UE, aliados próximos dos EUA, não apoiaram essa ideia e continuam considerando essa região como território sírio ocupado por Israel e não estão dispostos a mudar sua posição.

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O secretário-geral da Liga Árabe, Aboul Gheit, por sua vez, também declarou que o bloco apoiava totalmente a soberania síria sobre o território.

Quanto à posição da Rússia, Moscou avisou reiteradamente que o plano dos EUA de reconhecer a soberania de Israel sobre as Colinas de Golã levaria a uma violação grosseira do direito internacional.

"Infelizmente, é mais um passo para destruir a base legal internacional para uma regulação da situação no Oriente Médio. A posição da Rússia em torno dessa questão permanece inalterada — as Colinas de Golã são território sírio. Queria chamar a sua atenção, mais que vez, que se em Washington os políticos americanos gostam de se referirem ao direito internacional, neste caso particular eles o violam", disse a representante oficial do Ministério das Relações Exteriores russo, Maria Zakharova, comentando o assunto.

Possíveis consequências

A decisão de Trump sobre as Colinas de Golã serve de exemplo de violação grosseira de todas as regras internacionais e pode causar grandes repercussões, avisam políticos e especialistas.

Por exemplo, o político russo Vyacheslav Volodin declarou que tal desenvolvimento poderia levar a uma situação em que "todos ficam lutando entre si". "A lei da força dominaria. Esta é uma via para a guerra", sublinhou ele.

A organização não-governamental Human Rights Watch também criticou a posição de Trump sobre o território disputado.

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"O presidente Trump parece estar pronto para dirigir uma bola de demolição contra o direito internacional, que protege a população das colinas ocupadas de Golã", alertou Eric Goldstein, vice-diretor da HRW no Oriente Médio e Norte da África.

A violação do direito internacional criaria mais tensão, anarquia e caos na região, avisou o cientista político iraniano Hossein Royvaran, e ele sublinhou que esta ilegalidade poderia eventualmente virar-se contra os EUA e Israel.

"Apenas alguns países apoiaram as ações de Trump. Isso nos fala sobre o isolamento político dos EUA e a perda de respeito dos países pelos EUA a nível internacional", opina ele.

O especialista não descartou que uma operação militar para libertar as Colinas de Golã da ocupação israelense também poderia começar, não apenas por parte da Síria, mas em conjunto através de um bloco de coalizão, onde o Irã a ajudaria com o Hezbollah e o Hamas.

Tudo indica que o reconhecimento da soberania israelense sobre as Colinas de Golã representa mais um passo imprudente de Washington na sua política externa, o que, infelizmente, adiaria para as calendas gregas a resolução das tensões árabes-israelenses na região.

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