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Ministério da Cidadania tem 6 servidores para fiscalizar 496 comunidades terapêuticas

Responsável pela fiscalização das comunidades terapêuticas no governo de Jair Bolsonaro (PSL), o Ministério da Cidadania tem 6 servidores para supervisionar os contratos com 496 destas entidades. Em 2019, não foi realizada nenhuma fiscalização presencial nas comunidades terapêuticas que recebem recursos federais.
Sputnik

A informação consta em ofício encaminhado pelo próprio Ministério da Cidadania à pedido de informações da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão vinculado ao Ministério Público Federal (MPF). A solicitação também foi encaminhado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, antigo responsável pela gestão do setor.

As comunidades terapêuticas são espaços de tratamento para dependentes químicos e seu principal método de trabalho é a abstenção completa do uso de drogas, o isolamento de seus pacientes e o trabalho espiritual. Seu uso para combater a dependência química começou na gestão de Dilma Rousseff (PT) e ganhou mais força e recursos públicos após a sanção de novas regras para a política de drogas pelo presidente Bolsonaro.

O Ministério da Justiça e Segurança Pública afirmou ao MPF ter realizado 206 fiscalizações presenciais de junho de 2017 até dezembro de 2018. Já o Ministério da Cidadania afirma que a fiscalização ainda não começou por conta da "necessidade de dedicação à elaboração de ferramentas de planejamento para a efetiva implementação da política pública". A pasta do ministro Osmar Terra (MDB), responsável por apresentar o projeto de lei que foi sancionado por Bolsonaro dando mais poder às comunidades terapêuticas, afirma que o início das vistorias está "projetado" para agosto. 

A portaria que estabelece as regras para a fiscalização destes espaços prevê que as visitas "in loco" para averiguar a prestação do serviço deverão ser feitas sem aviso prévio e "preferencialmente" por dois fiscais. Publicada em março deste ano, a portaria também prevê que a fiscalização poderá pedir reforços de "órgãos de estaduais e municipais de políticas sobre drogas saúde e de assistência social" conveniados e contratar empresas para realizar a tarefa.

O membro do Conselho Federal de Psicologia (CFP) Paulo Aguiar diz que a regulamentação das comunidades terapêuticas no Brasil é "obscura" e o número de fiscais é "totalmente insuficiente".

"Não há nenhuma nitidez do processo metodológico de fiscalização dessas instituições: Como será esse processo? Os objetivos? A metodologia? As ferramentas? É uma coisa completamente obscura que ninguém sabe e tem acesso", afirma Aguiar à Sputnik Brasil. 

O conselheiro do CFP também ressalta que os órgãos do Sistema Único de Saúde (SUS) que tratam da saúde mental têm critérios claros de fiscalização e metodologia, ao contrário das comunidades terapêuticas. Aguiar também questiona as intenções das recentes alterações na política de drogas: "A legislação, que foi modificada, tem uma intenção muito nítida: beneficiar determinados grupos e segmentos que vão oferecer esse, entre aspas, cuidado para quem faz uso de drogas".

Para garantir 10.883 vagas, o Governo Federal tem contratos que somam R$ 153,7 milhões com 496 comunidades terapêuticas. Parte desses recursos são investidos em comunidades terapêuticas denunciadas por violações de direitos humanos em relatório conjunto do Ministério Público Federal (MPF), Conselho Federal de Psicologia (CFP) e do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.

Associação Nova Criatura, Caverna do Adulão, Esquadrão da Vida, Jovem Maanaim, Nova Jerusalém e Salve a Si foram comunidades terapêuticas contratadas em dezembro de 2018 pelo Ministério da Justiça e da Segurança Pública com dispensa de licitação para fazer o tratamento de dependentes químicos ao longo de 2019. Elas também são alvos de denúncias na publicação "Relatório da Inspeção Nacional em Comunidades Terapêuticas".

A contratação, portanto, foi realizada durante a gestão de Michel Temer (MDB).

Na Jovem Manaaim, há a denúncia de que um idoso de 62 anos teve seu colchão retirado porque decidiu não participar dos cultos. Já na Salve a Si, não há funcionários registrados e os profissionais atuam como voluntários, recebendo apenas uma "ajuda de custo".

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) publicou em 2017 uma nota técnica com um raio X das comunidades terapêuticas no Brasil: 82% delas têm vínculo com igrejas e organizações religiosas, 89% têm a leitura da Bíblia como uma atividade diária e em 55% delas a participação em cultos e cerimônias religiosas é obrigatória. Ainda de acordo com o levantamento, existem cerca de 2 mil comunidades terapêuticas no Brasil.

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