Líder brasileiro Jair Bolsonaro é aprovado por 33% da população depois de 6 meses de mandato. Este é o pior nível para este prazo nos últimos 30 anos. O presidente argentino Mauricio Macri, cujo primeiro mandato está prestes a terminar, sofre o mesmo problema.
Mas como pode ser explicada tal tendência? O colunista da Sputnik Mundo Raúl Zibechi analisa a questão.
Militares ganham força
A imprevisibilidade é um problema comum no Brasil e Argentina. A insatisfação com as classes políticas e suas promessas não cumpridas também o é. Uma recente pesquisa do Datafolha revelou que 58% não acreditam nos partidos políticos, enquanto que as Forças Armadas aparecem no topo do ranking das instituições mais confiadas com 42%, contra os 19% que não confiam.
No mesmo rumo segue o Uruguai, onde aparecem movimentos políticos mais militaristas, como o partido Cabildo Abierto, liderado por um general, e o Partido de la Gente, que exige mão dura contra a criminalidade.
De acordo com Raúl Zibechi, as sociedades brasileira e argentina estão profundamente divididas, de forma estrutural, entre segmentos com histórias distintas desde o século XIX. Esta divisão pode ser analisada em diferentes aspectos.
Coronelismo hereditário
O primeiro deles é o fato destas sociedades terem sido herdadas do colonialismo, que separava a população entre uma oligarquia da terra e os sujeitados, gerando o coronelismo no Brasil. Embora este tenha sido historicamente vencido, sua cultura resistente está presente tanto em partidos conservadores como em progressistas nos dias de hoje.
Sociedade em metades
O segundo aspecto é seu modelo econômico extrativista, representado nas monoculturas, extração de hidrocarbonetos e mineração, que somado à especulação imobiliária nos grandes centros reproduz as relações sociais do período colonial, deixando marginalizada metade da população.
Esta economia especulativa não produz, sendo orientada somente pelo capital financeiro. Enquanto isto, a sociedade se divide em metades: uma com emprego, outra sem; os que têm saúde paga de qualidade e os dependentes dos carentes hospitais públicos.
A metade desfavorecida se torna alvo de políticas sociais ineficazes e está sob constante vigilância das polícias e cercada pelo crime. O índice de pessoas mortas aumentou desde a década de 1990, exatamente quando se fortaleceram as políticas neoliberais. Fica evidente que para governar uma sociedade, cuja metade não desfruta de direitos e se aprofunda na pobreza, é necessária a força.
Religião e política
O terceiro aspecto são as igrejas evangélicas e pentecostais que se transformaram em forças políticas influentes em toda a sociedade, criando bancadas políticas e tendo seus próprios partidos, fugindo do seu caráter religioso. Raúl Zibechi acrescenta que este fenômeno se observa principalmente na Colômbia e Brasil, onde as igrejas travam uma batalha a nível político contra movimentos sociais, em particular os movimentos feminista, LGBT e grupos indígenas.
Sociedade coesa
O quarto e último aspecto é a incapacidade destas sociedades em promover um crescimento que inclua a maioria da população. Os conflitos sociais se tornam inevitáveis, enquanto muitos analistas continuam a crer que uma sociedade coesa será o resultado de um crescimento econômico quando a realidade é o inverso. Primeiro se tem uma sociedade coesa, que compartilha objetivos comuns, em seguida teremos o crescimento econômico.
A divisão social ameaça as liberdades econômicas, políticas e individuais, assim como a própria sociedade como um conjunto no qual os indivíduos se sentem parte de um mesmo coletivo, com valores compartilhados e condições mínimas de convivência. Nenhuma rachadura social poderá ser resolvida por governos enquanto os indivíduos desta sociedade não estiverem dispostos a conviver com as diferenças.