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'Bolsonaro uruguaio': ex-chefe do Exército vira fenômeno antes do pleito de outubro

O Uruguai terá eleições presidenciais e legislativas no próximo dia 27 de outubro, e o país que ficou famoso recentemente por governos de esquerda, de forte defesa dos direitos humanos, pode ter a sua versão do líder brasileiro Jair Bolsonaro.
Sputnik
"Em breve vão nos impor uma lei pela qual a homossexualidade é obrigatória", reclamou Guillermo Domenech, candidato a vice-presidente do Uruguai para o novo partido Conselho Aberto em um recente evento de campanha.

A frase, irônica, reflete o caráter desse grupo que se tornou a grande surpresa da corrida eleitoral uruguaia.

Oposto a uma agenda de direitos consagrados pela esquerda no poder, como a legalização da maconha ou uma lei para apoiar a comunidade transexual e liderada por um ex-comandante em chefe do Exército, em menos de seis meses, o Conselho Aberto já está emergindo como a terceira ou quarta força política do país, com a intenção de voto que hoje varia entre 7% e 12%, segundo pesquisas, e continua a crescer.

A ascensão desse novo partido, que alguns analistas chamam de ultraconservador ou ultradireita, se baseia em um discurso que apela a restabelecer a autoridade em um país devastado por uma onda de crimes sem precedentes.

"Se eu colocar ordem no caos, no relaxamento que se vê hoje, se estiver certo, sou da direita e não tenho vergonha de dizer isso", afirmou o general Guido Manini Ríos, candidato à presidência pelo novo partido, em uma entrevista no canal público TV Ciudad.

Quando ele fala sobre o fim do "relaxamento", Manini Ríos se refere à interrupção de uma onda de crimes que em 2018 gerou um registro de homicídios e um aumento incessante de roubos com violência.

"Vamos pôr fim a que sigam nos matando na esquina, vamos pôr fim ao viver escondidos, trancados, com horas para sair e horas em que não podemos sair. Vamos pôr fim [à sensação de] viver com o coração na boca", acrescentou ele na mesma entrevista.

'Ideologia de gênero'

O novo partido questiona "a agenda de direitos" consagrada em uma série de leis promovidas pela coalizão de esquerda Frente Ampla nos 15 anos em que está no governo: aborto, casamento gay, venda de maconha em farmácias e direitos à comunidade trans. O Conselho Aberto propõe uma agenda alternativa de direitos, que garante segurança e emprego, e seu programa propõe a revogação do mercado legalizado da maconha e a revisão de textos escolares com conceitos de "ideologia de gênero" e guias educacionais sobre sexo. Manini Ríos também disse que é contra o aborto.

O uruguaio de 60 anos anunciou sua candidatura à presidência alguns dias após o dia 12 de março, quando foi demitido do cargo de comandante pelo presidente Tabaré Vázquez, porque questionou fortemente a maneira como o Judiciário tratava casos militares acusados de violar os direitos humanos durante a ditadura militar que governou entre 1973 e 1985. Além disso, ele enfrenta uma acusação por ter escondido que um militar confessou em uma corte de honra do Exército que jogou o corpo de uma pessoa desaparecida em um rio em 1973.

'Bolsonaro uruguaio': ex-chefe do Exército vira fenômeno antes do pleito de outubro

Quando ele lançou sua candidatura, a maioria dos analistas previu pouco sucesso, mas a intenção de votos que ele coleciona hoje lhe permitiria obter um forte grupo parlamentar.

"Vou votar em sua visão de mundo política continental, porque mostra que, em seu trabalho como comandante em chefe, ele fez contato com os problemas subjacentes do país, gerando uma enorme preocupação nele, e porque mostra que ele ama o povo e não quer nada para si mesmo", disse Gerardo Ruiz, professor de artes plásticas de 56 anos, à Agência Associated Press.

Os eleitores do novo partido se concentram especialmente em dois setores: o interior do país e os setores mais pobres da sociedade, avaliou Alain Mizrahi, diretor da Radar, uma empresa de medição de opinião pública no Uruguai.

Para o cientista político Adolfo Garcé, o sucesso do Conselho Aberto é explicado por uma combinação de razões. O primeiro é que Manini Rios reúne muitos votos na chamada "família militar": pessoal das Forças Armadas, ativo e aposentado, e seus parentes.

"Mas não é só isso. Seu sucesso também é explicado por duas outras razões. Por um lado, havia uma demanda insatisfeita da direita no Uruguai. Os grandes partidos da oposição correram para o centro e não representam mais o eleitor de extrema-direita, que reivindica ordem, autoridade, está farto da agenda de novos direitos e propõe retornar ao conservadorismo moral. Além disso, Manini conseguiu capturar muitas pessoas frustradas com a política tradicional", explicou.

Outros países da região elegeram recentemente presidentes de direita. Mari Abdo Benítez assumiu em 2018 como presidente do Paraguai, e Jair Bolsonaro no Brasil em 2019. Este último obteve poder com uma posição semelhante à do Conselho Aberto. Manini Ríos visitou o vice-presidente brasileiro Antônio Hamilton Mourão semanas atrás, de quem se orgulha de ser amigo.

Desconfiança institucional

A última pesquisa do Latinobarômetro mostrou que apenas 21% dos uruguaios confiam em partidos políticos.

Entre os mais pobres, há um eleitorado que há dez anos votou no ex-guerrilheiro de esquerda José Mujica, mas hoje muitos estão inclinados ao candidato militar. "Essas pessoas humildes se identificaram com Mujica pela maneira como falam, como se vestem, mas hoje estão decepcionadas e encontram em Manini uma resposta credível às suas necessidades", declarou o coronel aposentado Rivera Elgue, gerente de campanha do Conselho Aberto.

Manini Ríos nasceu em uma família política que gerou ministros e homens de governo. Como comandante do Exército, ele abandonou o baixo perfil de seus antecessores para marcar posições fortes em defesa dos salários e aposentadorias dos soldados.

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"Nosso partido, por ser novo e por ser estranho ao sistema anterior, tem um grau de confiança muito importante. E o desempenho de Manini como comandante a reforça", disse Elgue.

No entanto, muitos também o temem ou o desprezam. A vice-presidente da Frente Ampla, Graciela Villar, comparou Manini ao ditador nazista Adolf Hitler.

Elgue nega que eles sejam um partido de extrema-direita e nem mesmo aceita que são da direita, embora ele admita seu anticomunismo.

"Somos contra qualquer ideologia totalitária e não acreditamos em nenhuma delas, nem no nazismo, no fascismo ou no comunismo. E nós os consideramos tão nefastos quanto alguns outros. O comunismo matou tanto quanto o nazismo e, onde governou, instalou regimes totalitários", prosseguiu.

Até agora, os favoritos para vencer as eleições são o candidato oficial Daniel Martínez e o líder do Partido Nacional da oposição, Luis Lacalle Pou.

Segundo todas as pesquisas, Martínez lidera as preferências com uma porcentagem que varia entre 30% e 40%, segundo a pesquisa. Lacalle ocupa o segundo lugar com a intenção de voto entre 22% e 28%.

Os analistas descartam que haverá uma segunda rodada em novembro, já que nenhum candidato receberá 50% mais um dos votos.

As últimas três eleições foram definidas em uma votação entre a Frente Ampla e o Partido Nacional, com a vitória da coalizão de esquerda nos três casos.

No entanto, os chamados casos de corrupção que obrigaram o vice-presidente Raul Sendic a renunciar, uma economia estagnada e um histórico de homicídios e crimes violentos fazem com que muitos analistas prevejam uma eleição acirrada.

Lacalle Pou antecipou que, se ele vencer, gostaria de adicionar o Conselho Aberto ao seu governo para obter uma maioria parlamentar.

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