Segundo o hospital, o tratamento, já demonstrado em séries como Grey's Anatomy e The Good Doctor, passou a ser utilizado em dezembro, no Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) da unidade, no âmbito de um estudo liderado pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
No Hospital Souza Aguiar, inicialmente a pele de tilápia está sendo usada em pacientes com escaldaduras provocadas por água fervente em até 30% do corpo.
Chefe do Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Municipal Souza Aguiar, a cirurgiã plástica Irene Daher, conversou com Sputnik Brasil e esclareceu as vantagens da pesquisa.
Segundo ela, a abordagem de um paciente queimado envolve "limpeza e remoção da pele queimada" e posterior uso de pomada ou creme, ou substituto cutâneo.
"Pode ser algum substituto sintético. Já existem vários no mercado. Só que geralmente bastante caros. Ou você pode recorrer ao substituto cutâneo de origem animal", explicou a especialista.
A médica destacou que, historicamente, o tratamento de queimaduras já recorreu a diversos tipos de substituto cutâneo, "por exemplo, rã, porco e até pele de cadáver".
No entanto, a pele de tilápia abriu novas possibilidades.
"O que foi percebido? É que ela, [pele de tilápia], tem muito mais colágeno, do que a pele humana. Além, de proporcionar umidade. Ela consegue preservar a umidade do local da ferida", explicou a chefe do CTQ.
"O material é hidratado e aplicado diretamente sobre as queimaduras, sem a necessidade de pomadas ou outros insumos. Conforme as lesões vão cicatrizando, a pele de tilápia vai se soltando. Os pacientes relatam coceira neste período final, o que é uma reação típica do processo de cicatrização", acrescentou Irene Daher.
Rica em colágeno, resistente e elástica, a pele de tilápia auxilia na cicatrização de queimaduras de diferentes níveis. A atadura tampona toda a ferida, vedando e aderindo como se fosse uma cola, podendo permanecer no local por vários dias. Os riscos de infecção ficam reduzidos e evita a perda de líquidos dos tecidos e também diminui a dor do paciente, que é inevitável no tratamento tradicional das queimaduras, com curativos feitos de gazes e pomadas e que normalmente devem ser trocados no máximo a cada três dias. O curativo com a pele de tilápia é trocado somente a cada 10 dias, reduzindo, além do sofrimento do paciente, o custo do tratamento em até 50%.
"Uma característica também muito percebida pela equipe de enfermagem e pelos pacientes é a falta de dor. A partir do momento da aplicação a pele vai sofrer um ressecamento que incomoda um pouco, como se estivesse encolhendo, depois o paciente para de sentir dor. Não sente dor nenhuma. Você fazendo menos troca de curativos você também reduz bastante a dor do paciente", afirmou a cirurgiã plástica.
Paciente
Um dos pacientes internados e que passa por tratamento experimental, Bruno da Conceição, confirmou para a Sputnik Brasil.
"Na pele não. Não sinto dor nenhuma", afirmou o cozinheiro, que se acidentou durante o trabalho.
"Meu acidente foi no trabalho. A panela de pressão não estava pegando pressão, fui tentar abrir a panela, soltou a tampa e a água veio para cima de mim. Está sendo maravilhoso, até me surpreendi, com uma semana esse resultado todo", comemorou Bruno, carinhosamente apelidado por enfermeiras de "anfíbio", pois uma boa parte do seu tórax está coberta por pele de peixe, que promete mudar o tratamento de queimaduras no país.
Outros usos
O Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos da Universidade Federal do Ceará desenvolve o projeto desde 2014, dentro das normas do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa.
Além do Hospital carioca, diversos núcleos de estudo têm se dedicado a descobrir novos usos para a pele do peixe, que é de fácil cultivo e cujo descarte de pepe é considerável.
"Tem grupo fazendo reconstrução de vagina, tem outro grupo fazendo úlceras venosas. Então não é só para queimadura que ela pode ser utilizada", completa a chefe do CTQ do Souza Aguiar.