No final do ano, uma comissão independente publicou em seu site oficial a aprovação do projeto do maior radiotelescópio do mundo, o Square Kilometre Array (SKA).
Sua construção começará na Austrália e África do Sul o mais tardar em 2021. Cientistas esperam observar a idade das trevas do Universo para testar a Teoria Geral da Relatividade e continuar buscando civilizações extraterrestres.
Um espelho com quilômetro de comprimento
Astrônomos recebem a maioria dos fatos sobre o Universo com a ajuda de telescópios, que são receptores de radiação eletromagnética. Muitos deles estão sintonizados com frequências que são invisíveis aos olhos. Eles dão uma ideia do espaço que é inacessível à observação por outros meios.
O alcance do rádio é um dos preferidos dos astrônomos. Quase todos os fenômenos cósmicos e o próprio espaço emitem ondas de rádio. Essas são absorvidas de forma fraca, e chegam à Terra quase sem obstáculos a partir das galáxias mais distantes. Eles fornecem informações sobre o centro da Via Láctea, buracos negros, pulsares, supernovas, estrelas, gás interestelar e radiação cósmica. Muitos objetos em geral só podem ser reconhecidos por ondas de rádio.
Quanto mais largo for o setor do céu do qual o telescópio recolhe as ondas de rádio, mais detalhes pode ver (neste caso, sua resolução angular aumenta). Por exemplo, onde antes encontrou um objeto, ele agora localizará dois.
Para aumentar a resolução, que no caso dos radiotelescópios acontece em uma fração de segundos, há duas maneiras: construir uma antena de rádio com área muito grande ou colocar em rede várias antenas (em forma de grade de um quilômetro quadrado).
Os norte-americanos escolheram o primeiro caminho, construindo um espelho de 304,8 metros em Arecibo, Porto Rico, tal como os chineses, que ergueram um Radiotelescópio Esférico de 500 metros de Abertura (FAST, na sigla em inglês) em uma depressão chinesa. O consórcio internacional SKA escolheu o segundo caminho.
O SKA estará localizado em dois continentes no Hemisfério Sul: África e Oceania, com duas mil placas em nove países africanos, o núcleo na África do Sul; e aproximadamente um milhão de antenas de baixa frequência em deserto na Austrália Ocidental. Sua área total será de um quilômetro quadrado. O novo instrumento irá superar fortemente a resolução do telescópio Arecibo, fornecendo imagens 50 vezes mais detalhadas do que o Hubble.
Gerir tantas antenas e processar os dados resultantes é um desafio tecnológico assustador que exigirá enorme poder computacional e armazenamento de dados.
Engenheiros australianos desenvolveram um tipo especial de receptores especialmente para o SKA, capazes de receber sinais fracos de grandes áreas do céu. Também foram os primeiros a usar conjuntos de antenas faseadas para aplicações astronômicas. O Observatório Rádio Astronômico de Murchison (MRO, na sigla em inglês), como protótipo do futuro telescópio gigante, tem agora 36 antenas.
Apesar de muitos problemas técnicos, o projeto é realizável do ponto de vista prático, algo muito facilitado pelo progresso na indústria informática.
No início do Universo
Os astrônomos têm grandes expectativas para o SKA. O projeto é mencionado como uma das muitas ferramentas futuras que podem abrir novos objetos espaciais, clarificar a estrutura e esclarecer várias hipóteses em muitos artigos publicados na última década e meia.
A primeira tarefa do projeto é investigar a distribuição de átomos de hidrogênio neutros em galáxias distantes, que permitirá estabelecer a estrutura dos aglomerados de estrelas, bem como estudar áreas de concentração de matéria escura.
As observações dos pulsares permitirão estudar as ondas gravitacionais. Estes objetos são estrelas de nêutrons compactos de rotação imprevisível. De acordo com o período de rotação, eles emitem poderosos pulsos de rádio, cujo tempo de chegada à Terra é fácil calcular.
Eles são tão pontuais que os astrônomos os usam como relógios. A única coisa que pode derrubá-los é algo muito poderoso, como ondas gravitacionais. Sua existência foi confirmada pela primeira vez apenas pela observação de duplos pulsares, que estavam perdendo energia, tal como a Teoria Geral da Relatividade previa. O SKA detectará milhares desses objetos, por exemplo, um pulsar que gira em torno de um buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea.
A única maneira de estudar o Universo logo no início da sua evolução é pelo rádio, porque não havia estrelas na época e, portanto, também não havia radiação ótica. O SKA acalenta muitas esperanças na sua capacidade máxima. A versão limitada pode não conseguir penetrar em épocas tão distantes. Além disso, falta encontrar a luz das primeiras estrelas e galáxias. A busca por exoplanetas é mais relevante do que nunca.
Agora eles são descobertos principalmente como telescópios óticos no momento da passagem sobre o disco da estrela, ou através de métodos indiretos. O SKA permitirá encontrar objetos através da perturbação de sua magnetosfera (como acontece nas regiões polares da Terra) e o efeito sobre o campo magnético da estrela. A nova ferramenta também estará envolvida na busca de sinais de rádio de civilizações inteligentes. Sensibilidade de pesquisa para isso não lhe falta.
Através dos espinhos até as estrelas
O SKA foi concebido no início dos anos 90 para observar galáxias distantes no comprimento de onda mais difundido do Universo, de 21 centímetros (1,4 GHz). A onda é emitida por átomos de hidrogênio neutros. O hidrogênio compõe metade da matéria interestelar. Em geral, o telescópio cobrirá a faixa de 100 mega-hertz a 25 giga-hertz.
Para sua construção foram selecionadas áreas de baixa densidade populacional, onde os níveis de ruído de rádio são mínimos. Se trata de países de clima ameno, onde é relativamente fácil criar infraestruturas e construir estradas.
O custo do SKA é de cerca de US$ 940 milhões (R$ 3,92 bilhões). Devido à impossibilidade de um país realizar o projeto inteiro foi preciso mais de um ano para criar um consórcio de dez países e reunir a verba. Oficialmente o início foi anunciado apenas em 2013, mas mesmo agora, como a revista Nature escreve, o projeto não tem o montante total, como tal, sua inauguração está sendo adiada.
Se até meados de 2020 a verba que falta não for encontrada, o projeto terá de ser implementado de forma reduzida, minimizando a capacidade dos computadores e colocando as antenas mais próximas umas das outras, o que afetará negativamente a resolução do radiotelescópio. Como exemplo, não será capaz de detectar a fraca radiação deixada desde a idade das trevas até a formação de uma estrela. Contudo, de acordo com a publicação, o SKA é muito importante para a astronomia, pelo que vai ter lugar, independentemente de problemas financeiros e atrasos. À medida que o financiamento continuar, ele será melhorado.
A construção terá início em 2021 com a criação de duas áreas-chave: SKA1-Mid e SKA-Low, cobrindo a faixa de 50 mega-hertz a 15 giga-hertz. O SKA1-Mid é composto por 133 placas de 15 metros na África, combinadas com o rádio interferômetro MeerKAT existente. O SKA-Low consiste em 512 estações, cada uma com 256 antenas.