Trombetas de Jericó: como CIA adotou sirene de terror nazista para guerra psicológica

Documentos recém-desclassificados da inteligência dos EUA revelam que CIA tentou construir dispositivos de guerra psicológica semelhantes aos usados pelos nazis nos bombardeiros Ju-87 Stuka.
Sputnik

O som das sirenes do Stuka em filmes e documentários é inconfundível, mas o ruído não é natural: é feito a partir de um dispositivo especial montado sob o avião que produz seu chiar característico quando o ar é atravessado a uma certa velocidade, por exemplo, quando a aeronave acelera durante um ataque em mergulho.

Os nazistas chamaram ao dispositivo de "Trombeta de Jericó", inspirando-se na cena bíblica em que os israelenses fizeram desmoronar os muros da cidade de Jericó soprando suas trombetas feitas de chifres de carneiro.

No entanto, quando a CIA tentou replicar o dispositivo, nos anos 50, apelidou-o de "Chifre de Jericó" e à operação secreta de Screamer Project ou, literalmente traduzido, de Projeto Bramante, informou em 10 de abril o portal The Drive.

O objetivo do dispositivo, tanto para os alemães quanto para os norte-americanos, era meramente psicológico: espalhar o medo entre a população atacada, de acordo com as teorias prevalecentes à época sobre a possibilidade de aviões decidirem o curso de guerras através do terror a bombardeios.

Não sabendo como criar o dispositivo de raiz, os espiões da CIA embarcaram em uma viagem épica tentando localizar algures um Stuka que ainda tivesse a sirene, logrando ter dois modelos para teste em 1958.

De acordo com uma série de notas manuscritas, a CIA pretendia um dispositivo que pudesse produzir um som aterrador e intimidador quando voasse a cerca de 480 km/h e a poucas dezenas de metros do solo. A ideia era provavelmente fazer passagens rasantes e rápidas sobre posições inimigas ou áreas civis, semeando medo e apreensão.

O aparelho foi ligado a um avião de treino AT-11 Kansan e mais tarde a um Cessna 180, mas após muitos testes não conseguiram que o som ultrapassasse 108 decibéis, o que corresponde ao barulho de uma serra elétrica, quando os cientistas tinham estipulado um mínimo de 170 a 180 decibéis, assinalou o portal.

"Trombetas de Jericó", sirenes de terror usadas pelos nazis nos seus bombardeiros de mergulho Stuka. Ativavam-se a alta velocidade, emitindo um som estridente e intimidador característico

"Atualmente, o Chifre de Jericó não satisfaz os requisitos e é duvidoso que esforços continuados venham a atingir esse fim", diz um relatório datado de 31 de março de 1958. Em 1959 ainda se efetuaram alguns testes complementares, acabando a CIA, contudo, por abandonar o projeto.

Porém, os militares norte-americanos adotariam outros dispositivos de guerra psicológica baseados em meios aéreos, inclusive alto-falantes ligados a helicópteros.

Por vezes, eram puramente desagradáveis, como as utilizadas para sitiar o presidente panamenho Manuel Noriega quando ele procurou refúgio na embaixada do Vaticano, depois de os EUA terem invadido o Panamá em 1990 para o deporem.

Em outros casos, transmitiam mensagens aparentemente simpáticas às forças inimigas ou visando o puro horror, como na Operação Alma Errante durante a Guerra do Vietnã.

O recurso a este estratagema baseou-se na crença popular vietnamita que as almas das pessoas não enterradas em sua terra natal vagueavam sem rumo no sofrimento, reproduzindo o Exército norte-americano gravações sinistras para ludibriar os combatentes vietnamitas, fazendo-lhes crer que almas dos mortos estavam entre eles.

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