A Comissão Brasileira Justiça e Paz (CBJP), organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), divulgou uma nota na última quarta-feira (15) manifestando solidariedade a organizações da sociedade civil que denunciaram a priorização do mercado financeiro na chamada PEC do "Orçamento de Guerra".
Aprovada ontem, em primeiro turno, no Senado Federal, a proposta cria mecanismos para impedir que os gastos emergenciais gerados durante o estado de calamidade provocado pelo surto do novo coronavírus sejam misturados ao orçamento oficial da União. No entanto, para a CBJP e outras organizações, "o artigo 7º do substitutivo do Senado à PEC 10/2020 consiste em facilitar e aumentar a drenagem de recursos públicos para o mercado financeiro, autorizando o Banco Central a repassar recursos, da ordem de trilhões de reais, aos bancos sem controle social e estatal, sem contrapartida que garanta a implementação de políticas de saúde e de interesse social e nacional".
"De fato, grande parte do recurso de R$ 1,2 trilhão já liberado pelo Banco Central tem sido pouco utilizada para salvar empresas do setor produtivo e, menos ainda, aplicado à saúde, à assistência social, à segurança alimentar e à agricultura familiar para afrontar a pandemia do COVID-19", diz a nota da comissão.
De acordo com a CBJP, se aprovada a proposta, o BC poderá negociar sem regulação e fiscalização títulos da dívida pública, utilizando-se até das reservas internacionais que protegem e garantem a moeda nacional.
"Como também poderá comprar títulos privados sem se referir aos preços desses ativos, transformando títulos de emissão privada, derivativos, que o presidente do Banco Central declarou publicamente que podem alcançar quase R$ 1 trilhão, em dívida pública onerosa para os cofres públicos, beneficiando, assim, apenas os bancos privados."
Segundo o secretário-executivo da Comissão Brasileira Justiça e Paz, o cientista político Daniel Seidel, alguns termos da PEC do "Orçamento de Guerra" representam uma grande injustiça e uma grande maldade com o povo brasileiro, uma vez que, "nesse momento de sensibilidade", autorizam o Banco Central a "fazer negócios muito danosos ao Tesouro nacional".
Em entrevista à Sputnik Brasil, o especialista argumenta que, embora os bancos já estejam tendo muitos lucros, ainda assim, querem uma autorização expressa para cobrir eventuais prejuízos que possam ter por negócios mal feitos, colocando isso "na conta do povo brasileiro".
"A gente não pode admitir que, mais uma vez, essa derrota seja colocada para o povo brasileiro. Essa conta não pode ser colocada para o povo brasileiro pagar", afirma.
Seidel considera que enquanto bancos podem ser beneficiados, empresas que geram muitos empregos, fornecem serviços e produzem equipamentos, materiais e alimentos esbarram em limites impostos à política pública.
"Mas, para esse tipo de negócio — e, eu me arrisco a dizer, negociata —, não tem limites então?", questiona. "Isso significa doação de recursos do Banco Central direto para os caixas dos bancos privados."