Como tem sido recorrente ao longo dos últimos meses, o governo brasileiro foi abalado por uma nova polêmica nesta sexta-feira (24), após o anúncio da demissão do então diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo.
Cumprindo as ameaças feitas na última quinta-feira (23), o então ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, responsável pela indicação de Valeixo ao cargo, decidiu deixar a administração de Jair Bolsonaro, proferindo um polêmico discurso de despedida, com graves acusações contra o presidente da República.
Segundo Moro, o desejo de Bolsonaro de mudar o comando da PF seria motivada por uma vontade de interferir politicamente na instituição, tendo acesso a conteúdos sigilosos de investigações sobre, possivelmente, aliados e familiares.
Tais acusações, feitas ainda durante a manhã, causaram um grande impacto na imprensa e no meio político, sendo desmentidas, no entanto, pelo presidente durante coletiva realizada no final da tarde.
Em pronunciamento um pouco mais longo do que de costume, o chefe de Estado tentou se defender das denúncias de Moro falando sobre vários assuntos diferentes, mas, nas vezes em que falou de seu ex-ministro, se concentrou em danificar sua imagem perante o eleitorado, colocando-o como o novo inimigo do seu governo, conforme explicou, em entrevista à Sputnik Brasil, a cientista política Ariane Roder, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
"Assim como previsto, a estratégia principal do presidente, no seu discurso, foi achar um novo inimigo, no caso, o Sergio Moro", disse a especialista.
De acordo com a acadêmica, as declarações de Bolsonaro à imprensa nesta tarde se dividiram em três eixos: em um deles, o presidente teria se concentrado em atacar o perfil do seu ex-ministro, descrevendo-o como uma pessoa egocêntrica e com interesses eleitorais. No segundo eixo, ele destaca a prerrogativa presidencial de indicar o comandante da Polícia Federal e, no terceiro, tentou se concentrar em valorizar o seu próprio perfil, falando sobre a tentativa de assassinato sofrida, recursos que deixou de gastar e a importância do seu cargo.
"Então, o que a gente percebe do discurso, essencialmente, é o que já se esperava, a tentativa de polarização", explica Roder, destacando que a estratégia do presidente teria por fim colocar parte da opinião pública contra Sergio Moro, minimizando, ao mesmo tempo, sua decisão de interferir na Polícia Federal.
Para a professora, apesar de tentar minimizar o problema, Bolsonaro não chegou a explicar as questões apresentadas pelo seu novo desafeto.
"Possivelmente, após esse discurso, vão começar as mensagens e as estratégias nas mídias sociais de gerar essa dicotomia entre as duas figuras, denegrindo o papel do Sergio Moro, fortalecendo alguns aspectos da figura do Bolsonaro [...] E vai caminhar nessa direção, possivelmente, assim como aconteceu no caso da saúde, para antagonizar e diminuir o stress, o impacto institucional que esse discurso pode ter."