Para o secretário-adjunto do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Cléber Buzatto, o presidente Jair Bolsonaro já se tornou conhecido mundialmente por seu negacionismo desde o início da pandemia, indo frontalmente contra recomendações de dois ministros da Saúde do seu governo, e evitando seguir organismos internacionais.
À Sputnik Brasil, ele foi além e classificou como "eugenista" – termo do grego "bem-nascido", é rotineiramente associado à limpeza racial – a postura do presidente brasileiro. Segundo Buzatto, certas condutas de Bolsonaro parecem integrar uma estratégia do seu governo, atingindo com mais ênfase minorias como os indígenas.
"O governo Bolsonaro, e sobretudo o próprio presidente Bolsonaro, têm adotado uma atitude negacionista e, para além disso, um comportamento eugenista relativamente à esta temática da COVID-19 no Brasil. Não só a negação, mas parece haver uma intencionalidade e as ações e discurso do próprio Bolsonaro apontam neste sentido, para que o coronavírus se alastre e provoque o maior número possível de vítimas e até de óbitos no país", afirmou.
O pouco apreço de Bolsonaro pelos índios já é conhecido dos tempos em que ele era deputado federal. Crítico ferrenho das demarcações de terras indígenas em governos anteriores, o presidente prometeu em várias oportunidades que, caso eleito, não iria demarcar nenhuma área sequer, postura que, segundo especialistas, só fomenta as invasões de agricultores e madeireiros, além das ações de grilagem de áreas públicas ou já concedidas aos índios.
O secretário-adjunto do CIMI reforçou que, além de não reforçar ou favorecer as medidas de isolamento social dos povos indígenas, o governo Bolsonaro tem trabalhado contra atitudes auto protetivas dos próprios índios.
"Em algumas situações, os povos têm feito ações de autoproteção, incluindo com bloqueios de rodovias que passam ao lado ou dentro de terras indígenas, e mesmo nesses casos em que os povos estão por conta própria, o governo brasileiro por meio da Fundação Nacional do Índio (Funai), que é o órgão indigenista do Estado brasileiro, publicou recomendação expressa para que os povos não fizessem ações como essas de bloqueio para impedir a passagem de não índios pelos seus territórios", argumentou.
Se Brasília se mostrou rápida em agir diante dos atos indígenas em tempos de COVID-19 – inclusive usando a chamada publicitária "O Brasil Não Pode Parar", que acabou barrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) –, o mesmo não pode ser dito em relação ao socorro dos índios que são infectados pela doença.
O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, declarou na terça-feira (19) temer um "genocídio" de índios na região amazônica. Buzatto criticou a falta de medidas por parte do governo para evitar o avanço que está matando mais e mais índios no país.
"Mesmo nas situações em que a contaminação dos indígenas e a mortalidade de membros de povos tenham avançado drasticamente, como no caso do Amazonas, não se tem visto quaisquer medidas mais emergenciais e especificas de cuidado e tratamento. Essas ações e omissões, dentre tantas outras, acabam por potencializar as consequências danosas do avanço do coronavírus sobre as populações indígenas, o que tem provocado um alto número de portadores do vírus e um grande número de óbitos entre os povos indígenas do Brasil", lamentou.
Entidades europeias já ameaçaram nesta semana deixar de adquirir produtos brasileiros, caso o Congresso Nacional tivesse aprovado uma medida provisória (MP) de Bolsonaro que prometia regularizar uma ampla teia de terras invadidas na Floresta Amazônica. De acordo com o dirigente do CIMI, é só no campo da economia que o mundo pode frear também os ataques do governo aos povos indígenas.
"Qualquer possibilidade de mudanças desse governo passa pelo campo econômico, por restrições de mercado ou algo do gênero, porque do ponto de vista da consciência do respeito à vida, nós avaliamos que o governo e o presidente Bolsonaro não têm essa consciência e isso não será gerado por iniciativa própria aqui no Brasil", finalizou.