Para impedir o colapso da TAP, o governo português teve que comprar a parte que pertencia ao acionista David Neeleman, o dono da brasileira Azul, por 55 milhões de euros (R$ 330 milhões). Com isso, Portugal passa a deter 72,5% do capital da companhia, subindo dos 50% anteriores, e ainda vai injetar 1,2 bilhão de euros (R$ 7,2 bilhões) como um empréstimo, já autorizado pela Comissão Europeia, para as despesas mais imediatas.
O segundo acionista privado, o português Humberto Pedrosa, fica com 22,5% das ações da companhia e os 5% restantes são dos trabalhadores. A solução, que não é uma estatização formal, embora o governo seja o acionista maioritário agora, tem sido definida pelas autoridades como a melhor saída que poderia ter sido encontrada. "Nos permite desbloquear o empréstimo e evitar a falência de uma empresa que é essencial para o país", disse o ministro das Finanças, João Leão, na coletiva de imprensa na última quinta-feira (2), quando o acordo foi definido.
A primeira alteração já confirmada pelo governo na estrutura da companhia é a saída do atual CEO, o brasileiro Antonoaldo Neves, e a contratação de uma empresa especializada para selecionar o novo quadro gestor.
Diante do alto custo das negociações, a Associação Comercial do Porto considera que o governo deve aproveitar a reestruturação que será feita na companhia para encerrar todas as operações no Brasil. Em coletiva de imprensa na última sexta-feira (3), o presidente da entidade, Nuno Botelho, disse que as atividades em solo brasileiro são a "razão de ser, no meu entender, a ruína que é o grupo TAP".
Atualmente, o grupo TAP mantém duas empresas no Brasil, focadas em logística e manutenção, que empregam cerca de 750 funcionários. "A operação no Brasil é a principal responsável pelos resultados negativos do grupo TAP, em 540 milhões [de euros]", disse Nuno Botelho. "No nosso entender, a viabilização do grupo TAP deveria ser resolvida em conjunto com o governo brasileiro, por que os grandes problemas são a Aeropar e a TAP Manutenção e Engenharia", completou o empresário.
Só no primeiro trimestre deste ano, já afetado pela pandemia, a TAP teve prejuízos de 395 milhões de euros (R$ 2,3 bilhões). O cenário agrava o quadro registrado desde 2008, com 2017 sendo o único ano em que houve saldo positivo.
Para o professor da Universidade Federal do Ceará Héber Oliveira, doutor em engenharia de transportes que atua na área de planejamento aéreo, a reestruturação na TAP vai focar na recuperação econômica. "Devem equacionar, em um primeiro momento, os prejuízos que a pandemia trouxe, mas não deve ser uma tomada de decisão definitiva e sim acompanhado com a evolução do setor", diz à Sputnik Brasil.
O professor avalia que o encerramento de rotas e bases operacionais poderá ser uma opção momentânea.
"As empresas vão ter que fazer cortes drásticos para tentar, de algum modo, recuperar e evitar prejuízos maiores ou casos mais graves, de falência. A TAP tem um histórico de empresa grande e de vencer algumas dificuldades. É claro que, em alguns momentos, decisões drásticas vão ter que ser tomadas. Cancelamento de rotas, fechar bases operacionais, tudo no intuito de redução de custos para tentar equilibrar o caixa das empresas. O que teria um impacto muito grande, mas talvez seja momentâneo", diz Oliveira.
Dos 91 destinos operados pela TAP, 11 são para o Brasil. Para o professor, o peso do mercado brasileiro deve ser considerado nas decisões. "Se você olhar para o Nordeste como um todo, por exemplo, você tem uma posição estratégica que une esses dois continentes".
Esse papel estratégico de ligação entre Portugal e o mundo também é reforçado pelo governo em defesa das decisões tomadas. O ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, declarou, durante uma audiência no Parlamento, que "do ponto de vista econômico e social, seria um desastre para o país perder a TAP".
No entanto, as críticas ao processo têm sido muitas. Neste sábado (4), o Conselho de Finanças Públicas manifestou "preocupação".
"Temos que avaliar muito bem os impactos que isto pode vir a ter para os contribuintes, não apenas agora, mas para os próximos anos", disse a presidente da entidade, Nazaré Cabral, em entrevista à TVI.
Até agora, o governo não se manifestou sobre qualquer tipo de alteração das atividades da companhia no Brasil.