Se Proposta de Emenda à Constituição (PEC) for aprovada, servidores poderão ser demitidos por "desempenho insuficiente". As regras para que isso ocorra, no entanto, ainda precisam ser estabelecidas.
Segundo o governo, o modelo de desligamento de servidor hoje é "engessado" e faz com que seja difícil fazer adaptações e funcionários permaneçam em atividades em que não há mais demanda.
Para o professor da Universidade Veiga de Almeida, uma avaliação de desempenho, nos moldes de uma empresa privada, até pode ser benéfica para o funcionalismo público, mas é preciso garantir que os servidores tenham a missão de servir ao país e aos cidadãos.
"Se olharmos com muita calma, o tipo de gestão proposta nessa emenda tem sim uma aproximação da gestão privada. O que, por um lado, é um contrassenso. A gente precisa colocar um processo de desempenho em todo o procedimento, mas tem que tomar cuidado porque a gestão pública não é uma gestão privada, é uma gestão que tem interesses numa coletividade, que não busca determinados padrões que as empresas privadas buscam. A empresa privada tem prerrogativas do lucro que o governo não tem, a prerrogativa principal é a gestão pública eficiente para o bem coletivo", avaliou Carvalhido.
'Isso é muito perigoso'
Para o especialista, as mudanças podem fazer com que os servidores sejam vítimas de ações políticas, por isso é preciso impedir que o funcionário público, que "passou por um processo de concurso", sofra perseguição ao sabor do governo de ocasião.
"Muda o governo, eventualmente há uma mudança de gestão ideológica, que poderá conduzir a uma perseguição. Isso é muito perigoso", alertou.
Para ele, os critérios precisam ser estritamente administrativos, e nunca políticos.
"É preciso observar com muito cuidado qual é o peso político e ideológico sobre as decisões em relação ao desempenho do servidor, que supostamente pode ser ineficiente", ponderou Carvalhido.
Emenda 'terá profundas alterações'
Por outro lado, o cientista político afirma que outro ponto da reforma, que daria maior poder ao presidente da República, deverá ser modificado quando a emenda for analisada no Congresso Nacional.
Pelo texto atual, o presidente poderá extinguir órgãos e reorganizar autarquias e fundações por meio de decreto. Hoje, isso só pode ser feito por projeto de lei ou medida provisória (MP), ou seja, com aval dos parlamentares.
"Obviamente, passando pelo Congresso isso terá profundas alterações. Dificilmente o Congresso, a não ser que esteja completamente alinhado ao presidente, deixará perder alguma de suas funções. No processo de votação dessa emenda haverá sim mudanças significativas, com o aumento e participação forte do Congresso Nacional", disse o professor.
Economia sim, mas e a qualidade?
Além disso, o cientista político diz que a reforma poderá gerar uma economia para os cofres nacionais, mas é fundamental que isso ocorra ao mesmo tempo em que a eficiência dos serviços melhore.
"Do ponto de vista financeiro, é interessante, pois leva a médio e longo prazo, sobretudo no longo, a uma economia. Mas devemos ver qual o grau de eficiência que tem sobre a qualidade serviços públicos, essa é a questão. Se olharmos de forma muito imediata, é uma questão de economia. Mas essa economia trará que efeitos sobre a qualidade do serviço público?", indagou.
Por fim, Carvalhido lembrou as origens da legislação sobre os servidores públicos, que remonta ao governo Vargas.
"Quando foi feita a lei dos servidores públicos, principalmente na gestão de Getúlio Vargas, ainda na primeira metade do século passado, a ideia era sim colocar quem o Estado queria, mas, ao longo de seu desenvolvimento, você foi depositando regras para que esse servidor ficasse absolutamente estável para servir ao Estado, e não a um governo especificamente", explicou Guilherme Carvalhido.