Segundo relatório produzido por rede de pesquisadores e líderes Yanomami e Ye’kwana, a pandemia do coronavírus avançou 250% em três meses dentro da Terra Indígena Yanomami.
O documento, chamado "Xawara: rastros da Covid-19 na Terra Indígena Yanomami e a omissão do Estado", indica que o número de casos confirmados no território pulou de 355 para 1.202 entre agosto e outubro.
Gongora explica que vivem na maior reserva indígena do Brasil, localizada entre os estados de Roraima e Amazonas e parte da fronteira com a Venezuela, cerca de 26 mil Yanomami e 700 Ye’kwana. Essa população, que inclui grupos isolados, divide-se em cerca de 360 aldeias.
Um dos motivos da rápida expansão da COVID-19 entre os indígenas é o grande número de garimpeiros que atuam na região, estimulados pela permissividade do atual governo com a atividade, denuncia a antropóloga.
"Estima-se em mais de 20 mil garimpeiros ilegais nas terras indígenas. Há muito tempo essa terra vem sofrendo com essa invasão. No entanto, nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro a gente vê uma flexibilização total das formas de prevenir e impedir a entrada dos garimpeiros. Esse número foi crescendo enormemente a partir do início de 2019", disse a pesquisadora da ONG Rede Pró-Yanomami e Ye’kwana.
'Isso é assustador'
A antropóloga afirma que os invasores ajudam a espalhar a COVID-19 entre os índios. Ela lembra que, no passado, a região também foi ocupada por não indígenas, que trouxeram um "ciclo de epidemias e doenças que está viva na memória" dos povos locais.
"A gente se preocupa enormemente com essa situação. A Terra Yanomami tem cerca de 27 mil pessoas. Hoje o número de garimpeiros está quase alcançando o número da população local. Isso é assustador", lamentou a especialista.
De acordo com levantamento da Rede Pró-Yanomami e Ye’kwana, 23 indígenas morreram por COVID-19 ou suspeita da doença.
'Diminuição dos profissionais de saúde'
Gongora diz ainda que a "pandemia evidenciou problemas antigos" no território, com "precarização" do "atendimento de saúde".
"Um dos aspectos que tem sido mencionado é a diminuição do número de profissionais de saúde na terra indígena. Isso faz com que o quadro de funcionários que atuam nas comunidades, que compõem as chamadas equipes multidisciplinares de saúde indígena, seja insuficiente e afete a cobertura do atendimento, especialmente nas comunidades distantes dos polos base", explicou.
Segundo a antropóloga, os povos indígenas locais já viviam "aumento da mortalidade infantil, da malária e de doenças respiratórias". Com a chegada da pandemia no território, "um dos mais vulneráveis", um quadro que já era "frágil" mostrou "toda a sua ferida".
Gongora explica que, na primeira fase da pandemia, os casos de indígenas contaminados se concentraram nas Casas de Saúde Indígenas, localizadas em cidades como Boa Vista, capital de Roraima. Muitas vezes, indígenas que estavam buscando atendimento para outras doenças, ou visitando parentes, acabaram sendo contaminados pelo coronavírus por profissionais de saúde ou no trânsito entre centros urbanos e aldeias.
'Isolamento é impraticável'
A antropóloga diz que a falta de controle permitiu a interiorização da COVID-19 e, agora, a curva da doença cresce dentro da Terra Indígena Yanomami.
"Os casos confirmados na terra indígena não param de crescer. O isolamento social entre os moradores dessas aldeias é impraticável, e sem testagem adequada, sem controle e sem avaliação dessas populações […]. A saúde desses povos necessita de um olhar do Estado para que, de fato, tomem-se medidas emergenciais para controlar o avanço da pandemia", avaliou Majoi Gongora.