Os coronavírus são cravejados com proteínas de pico que se ligam a receptores nas células de seus hospedeiros. Essa é a primeira etapa da infecção e agora os cientistas conseguiram fazer as primeiras imagens detalhadas desses picos em seu estado natural, ainda ligados ao vírus e sem o uso de fixadores químicos que possam distorcer sua forma. A façanha foi detalhada na revista científica Quarterly Reviews Biophysics Discovery.
Cientistas obtêm a visão mais realista até agora da estrutura de proteína de pico do coronavírus
Os pesquisadores afirmam que o método utilizado, que combina microscopia eletrônica criogênica (crio-EM, na sigla em inglês) e computação, deve produzir imagens mais rapidamente e mais realistas do aparato de infecção em várias cepas de coronavírus, um passo importante no desenvolvimento de medicamentos e vacinas terapêuticas contra a COVID-19.
"A vantagem de fazer dessa maneira é que, quando você purifica uma proteína de pico e a estuda isoladamente, perde um contexto biológico importante: como ela se parece em uma partícula de vírus intacta? Pode possivelmente ter uma estrutura diferente lá", afirma em comunicado Wah Chiu, coautor do estudo.
Estudo com parente do SARS-CoV-2
Sete cepas de coronavírus são conhecidas por infectar humanos. Quatro causam doenças relativamente leves e outras três, entre elas o SARS-CoV-2, o vírus que causa a COVID-19, podem ser mortais.
O vírus que causa a COVID-19 é tão virulento que existem apenas alguns laboratórios que trabalham com crio-EM no mundo que podem estudá-lo. Portanto, para este estudo, a equipe de pesquisadores analisou uma cepa de coronavírus muito mais branda, chamada NL63, que causa sintomas de resfriado comum e é responsável por cerca de 10% das doenças respiratórias em humanos a cada ano. Acredita-se que esse coronavírus se ligue aos mesmos receptores na superfície das células humanas que o SARS-CoV-2.
Em vez de remover e purificar quimicamente as proteínas de pico do NL63, os cientistas congelaram rapidamente vírus inteiros e intactos em um estado vítreo que preserva o arranjo natural de seus componentes. Em seguida, os pesquisadores fizeram milhares de imagens e as combinaram para obter imagens de alta resolução.
"A estrutura que vimos tinha exatamente a mesma estrutura da superfície do vírus, sem artefatos químicos […]. Isso não tinha sido feito antes", comemora Jing Jin, coautor do estudo.
A equipe também identificou pontos onde as moléculas de açúcar se ligam à proteína de pico, em um processo chamado glicosilação, que desempenha um papel importante no ciclo de vida de um vírus e em sua capacidade de escapar do sistema imunológico.
No futuro, explica Jing, a equipe pretende descobrir como a parte do pico que se liga a receptores nas células humanas é ativada, e usar a mesma técnica para estudar a proteína de pico do SARS-CoV-2, que exigiria instalações especializadas de contenção de risco biológico.