Desafios dos Acordos de Abraão: qual seria a estratégia de Biden para Oriente Médio?

É provável que Biden adote e aprimore a estratégia de paz de Trump no Oriente Médio. Sara Sherif, analista política e jornalista especializada em assuntos israelenses, fala sobre a possível estratégia de Biden para o Oriente Médio.
Sputnik

Os Acordos de Abraão são a única política lançada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, que Joe Biden quer manter assim que chegar à Casa Branca em janeiro, afirma o portal Axios. No entanto, isso não significa que a próxima administração Biden vai aderir ao manual de Trump, a mídia observa que o democrata pode tentar usar acordos adicionais para induzir Israel a tomar medidas em direção a uma "solução de dois Estados" para a longa disputa entre judeus e árabes palestinos.

Além disso, os Acordos de Abraão "têm restrições" que podem tornar "desconfortável" a presidência de Biden, observa o jornal The Jerusalem Post, referindo-se à potencial venda de caças Lockheed Martin F-35 Lightning II para os Emirados Árabes Unidos (EAU), a remoção do Sudão da lista de terroristas de Washington e o reconhecimento da soberania de Marrocos sobre o Saara Ocidental. Os membros dos Acordos de Abraão insistiram anteriormente que os acordos em questão deveriam ser vistos separadamente dos acordos de paz.

Desafios dos Acordos de Abraão: qual seria a estratégia de Biden para Oriente Médio?

Até o momento, quatro países árabes muçulmanos assinaram acordos de paz com Israel dentro da estrutura dos Acordos de Abraão mediados pelos EUA e muitos outros estão aparentemente considerando entrar na onda dos processos de paz.

Acordos de Abraão e o equilíbrio de poder do Oriente Médio

Os acordos de paz tornaram a situação no Oriente Médio ainda mais complicada ao romper antigos impasses e criar outros, afirma à Sputnik Sara Sherif, analista política e jornalista de assuntos israelenses do jornal Al Dostor.

"Por um lado, os acordos mudaram a situação que existia há décadas, impedindo a normalização entre Israel e os árabes antes da resolução da questão palestina e do retorno israelense às linhas de 1967. Hoje estamos diante de uma nova situação e novas alianças na região", enfatiza a especialista.

O mundo árabe, que estava preocupado com a saída de Washington do Oriente Médio durante a administração de Trump, "encontrou em Israel uma nova conexão com os EUA e restaurou a confiança de que Washington não os abandonou", comenta Sherif.

Por outro lado, os acordos contribuem para a formação de novos rearranjos políticos: "Esta situação facilitou o crescimento da influência turco-iraniana dentro das terras palestinas, o que significa um aumento do nível de calor que já existe entre os países do golfo [Pérsico] e a Turquia", nota a jornalista.

Desafios dos Acordos de Abraão: qual seria a estratégia de Biden para Oriente Médio?

Questão palestina: solução de 2 Estados novamente em jogo?

A pressão do futuro governo Biden por uma solução de dois Estados pode se tornar uma virada de jogo para os árabes palestinos, acredita Sherif.

"Biden acredita na solução de dois Estados e no estabelecimento de um estado palestino vivendo em paz e segurança ao lado de Israel, e acredita que a solução de dois Estados é a ideia que a política dos EUA deve adotar para resolver o conflito entre Israel e palestinos", diz sugerindo, porém, que "essa ideia não será sua prioridade, pelo menos no primeiro ano de sua presidência".

"O governo Biden vai adotar a política regional de normalização de Trump, e vai tentar avançar com acordos de paz", acrescenta Sherif. "Biden vai encorajar os países árabes e islâmicos a continuar o processo de normalização com Israel, mas ele pode, ao mesmo tempo, tentar empurrar uma solução para os palestinos, e não haverá presentes gratuitos para Israel como havia no tempo de Trump", defende.

Biden vai reescrever os Acordos de Abraão?

Enquanto isso, Sherif expressa ceticismo em relação à suposição de que Joe Biden pode cortar todos os "cordões" ligados aos Acordos de Abraão pela administração Trump.

"É improvável que Biden volte atrás nos dois passos em direção aos EAU e Bahrein, especialmente porque a Arábia Saudita decidiu adiar sua decisão de normalizar para depois das eleições norte-americanas […]. Se [Riad] fazer as pazes com Israel, será uma grande conquista para Biden em seus primeiros meses", acredita a analista política.

Sherif antevê que o Partido Democrata possa se encontrar em um dilema sobre o potencial pedido da Arábia Saudita para a compra de caças F-35 dos EUA, já que a equipe de Biden tem reservas sobre as questões de direitos humanos de Riad. Anteriormente, o príncipe herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, sinalizou que gostaria de adquirir os caças.

O negócio de armas EUA-EAU deve ser visto no contexto da provável normalização de Biden com o Irã, segundo a especialista. Ela acredita que o governo Biden pode dar luz verde à venda de caças F-35 para Abu Dhabi, a fim de reduzir as tensões com as monarquias do golfo Pérsico sobre o retorno esperado de Washington ao acordo nuclear com o Irã.

Desafios dos Acordos de Abraão: qual seria a estratégia de Biden para Oriente Médio?
"Quanto ao Saara Ocidental, há possibilidades de que o governo dos EUA reverta sua decisão, especialmente porque sua decisão não é reconhecida internacionalmente [….]. Ou, pelo menos, anuncia que aguarda uma decisão da ONU, que decidirá o assunto como zona de conflito", esclarece a jornalista.

De qualquer forma, a futura política do democrata Joe Biden para o Oriente Médio será muito diferente da do republicano Donald Trump, considera Sherif. "Talvez voltemos a ver os EUA que conhecíamos: as conversas sobre direitos humanos no Oriente Médio vão voltar, a conversa sobre o acordo nuclear com o Irã vai voltar", diz.

Por outro lado, a analista política sugere que Washington continuará sua política de retirada do Oriente Médio, pelo fato de que o grande foco de Biden seria restaurar a relação dos EUA com a União Europeia e organizações internacionais, e abordar a economia após a pandemia de COVID-19. Essas metas terão prioridade sobre as questões do Oriente Médio, conclui a jornalista.

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