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Queda da expectativa de vida no Brasil pela COVID-19 era esperada e passageira, diz sociólogo

Para Simon Schwartzman, o essencial é perceber que a taxa vai melhorar com o fim da pandemia e que há consequências mais importantes no cotidiano da população.
Sputnik

Pela primeira vez desde 1940, a expectativa de vida do brasileiro vai cair. E o fator que mudou um quadro evolutivo de 80 anos é algo que está no nosso dia a dia desde março: a pandemia da COVID-19. Mas talvez haja uma boa notícia dentro da má, ao menos para o sociólogo Simon Schwartzman.

"A pesquisa não surpreende porque o número de mortos é alto mesmo. E ele atinge em especial uma população mais idosa, ou seja, algo que não é um fator de longo prazo. E é importante entender que o dado não é eterno. É algo transitório, daqui a um ou dois anos ele volta ao normal", disse Schwartzman em entrevista para a Sputnik Brasil.

A pesquisa foi conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que Schwartzman conhece bem: ele presidiu o órgão entre 1994 e 1998. A principal conclusão, informou o jornal O Estado de São Paulo, é que a expectativa de vida do brasileiro ao nascer vai cair pelo menos em um ano por causa das quase 192 mil mortes e talvez chegue a dois anos dependendo de como será a vacinação no país em 2021.

Em novembro, o Instituto divulgou que a expectativa tinha chegado a 76,6 anos. Um número significativo quando se lembra que em 1940 a projeção era de 45,5 anos.

"Há várias explicações para a melhoria, especialmente a contenção da mortalidade infantil e avanços no controle de doenças contagiosas", disse o sociólogo.

Há algo mais grave

Mesmo com a queda prevista, a expectativa de vida no país é relativamente alta se comparada com os países de cidadãos mais longevos do mundo, todos de sociedades social e economicamente mais desenvolvidas que o Brasil, como Japão (85 anos) ou França, Espanha, Itália e Austrália (todos acima de 83). 

E é especialmente alta, também, se considerarmos que o número de vítimas da COVID-19 no país é seis vezes maior do que o número de vítimas de acidentes automobilísticos (30 mil) ou 12 vezes maior do que a quantidade de óbitos por consumo excessivo de álcool (16 mil).

Para Schwartzman, o dado isolado da expectativa de vida não é a grande questão. Há que se perceber que os efeitos da pandemia são muito amplos, afetam a sociedade não só pelas mortes e internações. A retração da economia é um exemplo prático.

"Para o país, não acho que seja um problema. Há questões muito mais graves envolvendo a pandemia: o impacto no emprego, na educação, na economia, por exemplo. Isso é bem mais grave do que o idoso que morre antes do previsto. Mas, claro, há o ponto de vista pessoal, de quem sente a perda", comentou o sociólogo diante de uma situação onde mais de 70% da letalidade do vírus recai sobre idosos. 

O lado educacional, uma das prioridades da carreira de Schwartzman por ter participado em 1985 da Comissão Nacional de Reformulação da Educação Superior Brasileira, entre outras ações, foi muito atingido. A desigualdade educacional voltou a subir durante a pandemia após quatro décadas, por causa das dificuldades que muitos alunos tiveram para estudar, especialmente os de origem humilde.

"Entre os jovens de seis a 15 anos, a média de estudo durante a pandemia foi de duas horas e dezoito minutos, muito abaixo das quatro horas mínimas exigidas pela Lei de Diretrizes Básicas da Educação", afirmou o economista Marcelo Neri, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) ao jornal.

A atitude dos jovens

Para um profissional que tem como foco estudar a sociedade, Simon Schwartzman entende que houve vários "personagens" na equação pandêmica. Todos atuaram, todos atuam para uma circunstância que leva o Brasil ao 2º lugar no mundo em número de vítimas do novo coronavírus, atrás dos Estados Unidos, e 3º em número de casos, atrás não só dos norte-americanos, mas também da Índia.

E ele entende também que até há uma lógica, na cabeça dos jovens, para explicar a reação de desapego deles às medidas contra a COVID-19, uma atitude que resultou num aumento de 13% para 20% no número de casos de pessoas entre 15 a 29 anos infectadas entre junho e novembro no Brasil.

"Há fases desta reação. No começo, no geral a sociedade respondeu, mas o governo atrapalhou muito ao mandar mensagens contraditórias. E sempre houve a pressão de manter a atividade econômica", explicou o sociólogo. "E há fatores também. A reação inicial cedeu espaço para o cansaço, principalmente da população jovem e essa entende que o risco para ela não é grande. Isso, em parte, explica a reação da juventude".

Por não entenderem que a equação pode ser muito complicada - arriscar perder a vida precocemente por um motivo social - os jovens continuarão sendo em 2021 um fator de preocupação com a COVID-19, até porque essa faixa etária não terá prioridade quando a vacinação em massa começar.

A rigor, a atitude da população continuará sendo uma questão central da doença. O ritmo e o consequente sucesso de uma vacinação em massa, também. E há várias interrogações sobre a situação da economia brasileira para o próximo ano. 

"A pandemia vai continuar no primeiro semestre, porque não é possível vacinar todo mundo com essa velocidade. Mas a partir do momento em que os grupos mais de risco forem vacinados e que, de fato, haja resultado na vacinação da população, é provável que haja uma recuperação de atividade econômica e o país fique mais aliviado no segundo semestre. Mas 2021 ainda será difícil", concluiu Simon Schwartzman.
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