Os que não encerraram o atendimento estão alongando seu prazo de funcionamento, diante de um quadro de falta de leitos de UTI e redes pública e privada de saúde à beira do colapso em todo o território nacional.
Mas por que nosso país chegou a este ponto em que estruturas montadas e em funcionamento, foram fechadas e agora novamente têm que ser reabertas? Para entender melhor a questão, a Sputnik Brasil conversou com Bernadete Perez Coelho, Docente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).
Ela disse que a situação mostra, em alguns aspectos, um despreparo dos governantes. Segundo Bernadete, "a abertura de leitos não diminui transmissão viral, que só é evitada com vigilância epidemiológica, rede de atenção primária, com uma base comunitária, que precisa de políticas públicas para proteção individual e coletiva das pessoas".
A especialista opina que os casos graves precisam ser atendidos em leitos de enfermaria e terapia intensiva em serviços permanentes, não em estruturas provisórias. "Estruturas provisórias são um caminho aberto para a corrupção, desvios de verbas, e não necessariamente atendem à demanda nas diversas regiões do país."
Apesar disso, Bernadete acredita que os hospitais de campanha foram fechados no momento errado: "Nós não tivemos epidemia controlada. Em diversos lugares que fecharam hospital de campanha não havia controle nem sanitário, nem epidemiológico, que apontasse para o fechamento dessas unidades".
Vários fatores mostram um aumento no número de casos de infecções. O mais recente foram as festas de final de ano, com reuniões familiares e aglomerações em praias, bares, festas clandestinas, entre outros.
Para a vice-presidente da Abrasco, já está acontecendo uma repercussão deste período no número de casos.
"O mês de janeiro tem sido bastante difícil em diversas regiões, e isto é fruto das aglomerações de final de ano e da mensagem das autoridades de que a epidemia estava de certa forma controlada, e não estava. A flexibilização, a reabertura precoce de diversos setores da economia e as festas de fato contribuíram para o aumento dos casos graves da doença", opinou.
O total de mortos pela COVID-19 no Brasil se aproxima de 200 mil pessoas. As estruturas provisórias de emergência atenderam parte significativa da demanda no primeiro semestre, mas também aconteceram várias denúncias de desvio de verbas e falhas de planejamento por parte de prefeitos, governadores e governo federal.
Profissionais de saúde em falta
Um outro problema é a falta de profissionais de saúde em vários estados do país. Um exemplo é o Rio de Janeiro, onde os contratos de trabalho dos profissionais de hospitais federais do estado se encerraram no final do ano passado.
Como medida paliativa, no dia 31 de dezembro de 2020, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, assinaram uma medida provisória que prorrogou o contrato de parte dos profissionais que foram dispensados. Cerca de 1.400 deles poderão continuar atuando até 28 de fevereiro.
Um dos exemplos de maior repercussão nacional é o do hospital de campanha do Riocentro, no Rio de Janeiro. A prefeitura da cidade anunciou nesta quarta-feira (6) o encerramento das atividades na unidade, que fica na zona oeste da cidade. Era a última instalação provisória para atendimento exclusivo de pacientes de COVID-19 que ainda estava em funcionamento, conforme publicou o UOL.
A Secretaria de Saúde do município explicou que a decisão foi tomada após parecer de especialistas. Eles aconselham a reabertura de leitos inativos na própria rede pública, em hospitais de referência, o que trará uma significativa redução de custos para o governo.
Vacinação contra a COVID-19
Outra questão levantada é se a atenção dada às vacinas que estão começando a chegar ajuda a tirar o foco da situação de falta de leitos e fechamento de hospitais de campanha. As notícias sobre autorização do uso de vacinas no país se multiplicaram nos últimos dias.
A mais recente veio nesta quinta-feira (7), quando o Instituto Butantan enviou o pedido para uso emergencial da CoronaVac para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O imunizante contra a COVID-19, produzido pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o instituto Butantan, teve eficácia de 78% na terceira fase de testes com 13 mil voluntários no Brasil.
Bernadete acredita que a falta de leitos e hospitais não tenha ficado em segundo plano por conta disso. "A organização de uma campanha de vacinação e o tratamento e combate da COVID-19 têm que acontecer de forma paralela. Ao mesmo tempo em que o planejamento da campanha de vacinação já deveria ter acontecido, deveríamos ter mantido os leitos, mesmo que em unidades provisórias", finalizou a especialista.