Segundo levantamento feito pelo Sindifisco, com o aumento de 4,52% no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2020 anunciado pelo IBGE, a defasagem acumulada na tabela de Imposto de Renda em relação à inflação nos últimos 24 anos é de 113,09%.
"A cada ano que passa, com aumento da inflação e sem correção da tabela, é mais imposto para quem já paga. Além disso, mais pessoas que estavam em uma faixa de isenção acabam entrando na faixa que paga alíquota", disse o presidente do Sindifisco Nacional, Kleber Cabral.
Atualmente, quem recebe rendimentos de até 1.903,98 é isento de pagamento do IR. Nos últimos 24 anos, somente em cinco a correção superou a inflação: 2002, 2005, 2006, 2007 e 2009. De acordo com o auditor da receita, de 2002 a 2015 havia uma política de correção, mesmo que fosse abaixo da inflação.
Desde 2016, porém, não houve mudança na tabela de IR, o que tinha sido uma promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro.
"A tabela de imposto de renda no Brasil já alcançou isenção de até nove salários mínimos. Hoje está em apenas dois. A correção inflacionária levaria a isenção para aproximadamente R$ 4.030, fazendo com que cerca de dez milhões de brasileiros deixassem de pagar impostos", afirmou Cabral.
Isenções para empresas
Vozes críticas a uma correção da tabela afirmam que a medida não seria distributiva de renda, pois os mais pobres não pagam impostos. O economista Ricardo Summa, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), concorda que a falta de correção da tabela "representa um aumento real da carga tributária para a classe média, principalmente".
Por outro lado, ressalta que entre aqueles que não pagam impostos há pessoas que recebem por volta de R$ 2 mil. Além disso, ele critica as "muitas isenções que são dadas para empresas".
"Ou seja, não acho que a política tributária deva ser feita dessa maneira. Acaba sobrecarregando uma parcela apenas da população. Acaba sendo uma medida tomada pela facilidade: é muito mais fácil não reajustar a tabela do IR do que pensar a equidade da tributação de maneira mais geral", disse Summa à Sputnik Brasil.
'Ricos não pagam impostos'
Kleber Cabral acrescenta ainda que "os grandes contribuintes, os ricos, os empresários, não pagam imposto de renda pessoa física, pois quase todos seus rendimentos advêm da distribuição de lucros e dividendos, que no Brasil é isento".
"Então acaba sendo uma estrutura que pesa mais sobre a classe média baixa e classe média alta do que realmente sobre os mais ricos", acrescentou.
Outro argumento contrário às mudanças é o da perda de receitas com impostos. O presidente do Sindifisco afirma que uma correção simples da tabela pela inflação, sem outras medidas combinadas, representaria uma perda de receita entre R$ 30 e R$ 40 bilhões.
"No atual momento de déficit fiscal, fica inviável. Mas, no estudo que fizemos, apresentamos propostas para que seja possível fazer a correção. Ela não seria feita toda de uma vez, inicialmente a faixa isenta seria de até R$ 3 mil. O projeto também propõe alíquotas mais altas para quem tem altos salários e passa a tributar lucros remetidos ao exterior e a distribuição de lucros e dividendos, o que seria feito em um sistema chamado integração, no qual parte do que já foi pago como Pessoa Jurídica é considerado para não sobrecarregar quem paga como Pessoa Física também", explicou Kleber Cabral.
'Cobrar mais da elite'
O presidente do Sindifisco diz que o estudo da entidade será apresentado aos novos presidentes da Câmara e do Senado. Ele também afirma que a instituição busca diálogo com parlamentares interessados em impulsionar o projeto no Congresso - já que a reforma tributária é focada mais na simplificação dos impostos sobre produtos.
"Esse conjunto de alterações permite que haja uma correção da tabela do imposto, mas é preciso haver coragem política de se cobrar um pouco mais da elite econômica brasileira, que hoje paga muito pouco", alertou Cabral.
Projeto de Lei
No Congresso, existem diversas propostas sobre o tema. Uma das mais avançadas e que conta com bom leque de apoio é a do deputado Luís Miranda (DEM-DF). De acordo com o Projeto de Lei 3129/2019, a faixa isenta de IR será de até R$ 3.9992. De R$ 3.992,01 até R$ 5.988, a alíquota seria de 15%; de R$ 5.988,01 até R$ 7.984, o imposto seria de 20%; de R$ 7.984,01 até 9.980, de 25%; de R$ 9.980,01 até R$ 33.932,00, de 27,5%; e a partir de R$ 33.932,01, de 37%.
Atualmente, quem tem rendimento mensal acima de R$ 4.664,68 já paga a faixa maior, de 27,5%. Entre R$ 1.903,99 até R$ 2.826,65, a alíquota é de 7,5%; entre R$ 2.826,66 até R$ 3.751,05, de 15%; e entre R$ 3.751,06 e R$ 4.664,68, de 22,5%.
Recursos nas ruas
Em entrevista à Sputnik Brasil, o parlamentar disse que a discussão sobre o projeto acabou ficando para este ano, pois seria muito difícil fazer isso antes da aprovação do orçamento de 2021. A Proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que orienta a elaboração do orçamento, só foi aprovada em 16 de dezembro. A Lei Orçamentária, por sua vez, deverá ser votada após o fim do recesso legislativo, em fevereiro, quando também serão definidas as novas Mesas da Câmara e do Senado.
Miranda diz ainda que a correção da tabela do IR "vem a calhar em um momento de crise econômica" como a atravessada pelo Brasil.
"Não se trata de renúncia fiscal, mas de investimento. A correção significa entre R$ 500 a R$ 1.000 a mais no bolso do brasileiro. Esse recurso, nas ruas, é algo explosivo. O consumo aumenta e, com isso, a própria arrecadação do governo e o lucro do empresário. Se o país não gira, empresários quebram e fecham as portas, o desemprego aumenta e com isso o governo para de arrecadar", afirmou o deputado.