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Brasil precisa definir seu modelo de Amazônia para receber investimentos, opina ativista

Ao participar do Fórum Econômico de Davos, Hamilton Mourão destacou a necessidade de investimentos privados para o desenvolvimento da Amazônia. Porém, na opinião de ambientalista, o Brasil precisa definir antes o seu modelo de desenvolvimento para a região.
Sputnik

Na última quarta-feira (27), o vice-presidente do Brasil, o general Hamilton Mourão, participou de maneira virtual do Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, um dos mais importantes seminários internacionais sobre economia.

Durante a sua apresentação, Mourão, que também preside o chamado Conselho da Amazônia, declarou que os investimentos privados são "cruciais" para o desenvolvimento sustentável e a proteção da região que abriga a maior floresta tropical do planeta.

Para o vice-presidente brasileiro, empresas e investidores interessados devem participar da elaboração de novos projetos para a Amazônia, sobretudo no que diz respeito a pesquisas e projetos científicos, uma vez que os governos, ainda mais em um cenário de pós-pandemia, não terão margem disponível para direcionar grandes somas para essas atividades.

"Embora o interesse no status da Amazônia tenha crescido de maneira acentuada, o mesmo não pode ser dito da cooperação financeira e técnica na região, o que nos fez falta diante das atuais necessidades", afirmou o vice-presidente do Brasil durante o painel "Financiando a transição da Amazônia para uma bioeconomia sustentável".

Para o ambientalista Miguel Scarcello, secretário-geral da ONG SOS Amazônia, o apelo do vice-presidente em prol de investimentos privados na Amazônia é uma "manifestação continuada" de um modelo de desenvolvimento concebido nos anos 1970.

"É uma intenção muito antiga de que haja esse fluxo de recursos permanente para o incremento das atividades produtivas na Amazônia", afirma o ativista ambiental. No entanto, ele considera que esse modelo de desenvolvimento, baseado em grandes empreendimentos e grandes obras de infraestrutura, precisa ser repensado, pois representa "o desmatamento na certa".

"Eu acho que essas discussões [de modelos de desenvolvimento] é que precisam ser mais evidenciadas, senão, a gente vai ter como referência sempre aquilo que já vem sendo pautado há décadas e que hoje o governo federal continua a fazer, que são aquelas estruturas e traçados de grandes obras planejadas já na década de 1970, como as rodovias, as grandes usinas hidrelétricas", avalia.

Scarcello ressalta que o governo não dá sinais de que pensa em um modelo mais baseado na conservação ambiental e no desenvolvimento sustentável, e que apenas recentemente começou a falar sobre bioeconomia, sobre como fortalecer uma economia com base nos produtos da floresta, como diz o título do painel apresentado por Mourão em Davos. Na opinião do ambientalista, apenas quando houver uma definição melhor de qual modelo de desenvolvimento se deseja para a Amazônia, será possível definir quais serão os investimentos necessários.

"A princípio, adotando um olhar mais para a conservação e para potencializar a população tradicional que aqui vive, nós podemos dizer que poderia ter muitos investimentos para incrementar a produção das centenas de cooperativas que as comunidades amazônicas têm construídas e que estão funcionando, mas que precisam ser melhor estruturadas", afirma Scarcello.

O ambientalista destaca que os empresários da floresta, que envolvem populações indígenas, extrativistas e agricultores familiares, precisam de muito investimento para dar um salto e atingir um patamar de produção que os torne mais independentes dos recursos públicos, já que os custos na região são muito altos. Além disso, na opinião do secretário-geral da SOS Amazônia, esses aportes podem ser utilizados para melhorar o acesso a novas tecnologias, a mais conhecimento e visão estratégica, o que, consequentemente, resultaria em um aumento da capacidade produtiva e, paralelamente, "na conservação maior da floresta".

Por outro lado, se o modelo de desenvolvimento do governo brasileiro ainda significar a construção de estradas e de grandes obras de infraestrutura, isso se traduzirá em mais destruição do meio ambiente e em benefícios para "um grupo bem pequeno de pessoas dentro da Amazônia como um todo".

"A gente precisa entender qual é a Amazônia que o governo federal quer incrementar e desenvolver, que tipo de Amazônia ele quer? A gente, a princípio, sabe qual é a visão que eles têm, mas isso ainda não está muito explícito. A visão que se torna pública é desmatar para poder cultivar soja e botar gado. É isso? E no caso da economia, qual é o caminho que vai ser estruturado para produzir, para desenvolver a bioeconomia? Então, isso tem que estar mais explícito", opina.

Para o ambientalista, o governo só conseguirá atrair investimentos privados, principalmente do exterior, se "demonstrar responsabilidade no cuidado com a população amazônica e com a região como um todo". Scarcello também avalia que, além de expor claramente qual é a sua proposta de desenvolvimento para a Amazônia, o governo brasileiro deve demonstrar que está apto a fazer "o papel de controle, de proteção ambiental, de fiscalização" e de dar um mínimo de suporte técnico aos pequenos produtores locais.

"Da maneira que hoje o governo brasileiro é visto, fica muito confuso e muito incerto fazer esses investimentos aqui, porque alguns setores falam uma coisa e os outros estimulam um processo de desenvolvimento sem preocupação nenhuma com a conservação. É preciso que o governo brasileiro tenha clareza, se exponha com clareza e mostre quais são os planos de uso sustentável e desenvolvimento sustentável que ele quer para a Amazônia", opina o secretário-geral da SOS Amazônia.
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