Em reunião na noite de quinta-feira (4) com o novo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, o ministro da Economia Paulo Guedes assinalou que uma nova rodada do auxílio emergencial só será acionada em caso de nova calamidade pública e deverá estar inserida no orçamento.
Além disso, Guedes afirmou que a extensão do auxílio seria mais "focalizada" e atenderia 32 milhões de brasileiros, pouco menos da metade dos 67,9 milhões de pessoas que receberam o benefício em 2020.
O ministro explicou que, para se chegar a essa estimativa, a nova versão do auxílio emergencial excluiria os inscritos no Bolsa Família e se concentraria apenas na população não atendida por nenhum programa social. Guedes também destacou que a recriação do auxílio deverá ter previsões de recursos no orçamento, com o remanejamento de outras despesas e com a ativação do estado de calamidade.
"É possível. Nós temos como orçamentar isso, desde que seja dentro de um novo marco fiscal. Se o Congresso aciona o estado de calamidade, temos condição de reagir rapidamente. Mas é muito importante que seja dentro de um quadro de recuperação das finanças. Estamos preparados para fazer as coisas dentro das proporções", declarou Guedes, segundo a Agência Brasil.
Rodrigo Pacheco, por sua vez, ressaltou que o fim do auxílio preocupa os parlamentares, pois a "pandemia continua", mas afirmou que a recriação do benefício deve ser discutida observando as regras fiscais.
Além disso, o presidente do Senado reiterou que pretende concluir a reforma tributária em 2021 e listou como prioridades as Propostas de Emenda à Constituição (PECs) do pacto federativo, à qual seria incluída a cláusula de calamidade, emergencial e da desvinculação dos fundos públicos.
Para Marco Antônio Martins da Rocha, professor do Instituto de Economia da Unicamp, a proposta de Guedes para a extensão do auxílio oferecido no ano passado ainda não está clara.
Em entrevista para a Sputnik Brasil, o economista ressalta que o governo não apresentou detalhes desse novo auxílio, como, por exemplo, o valor e a duração do benefício. Na opinião do acadêmico, a intenção de Guedes é sinalizar que, provavelmente, "o auxílio está vinculado a alguma PEC que traria medidas de contenção fiscal".
No entanto, o especialista frisa que não existe "nenhuma medida de contenção fiscal que faça caber no orçamento um programa do tamanho do auxílio emergencial, mesmo sendo metade do programa atual". Rocha também destaca que as medidas de contenção fiscal e as reformas propostas por Guedes trazem reflexos no médio e no longo prazo, enquanto a extensão do auxílio emergencial tem impactos fiscais de curto prazo.
"No fundo, não é uma questão relativa ao financiamento do programa, é uma questão relativa à reestruturação do orçamento e da estrutura de gastos do Estado. É complicado, não existe possibilidade de remanejo fiscal que possibilite o que seria um programa deste tamanho, e o que o Guedes pede em troca é, na verdade, a aprovação da agenda de reformas do Estado", afirma o economista.
Para Rocha, além da política de reformas defendida por Guedes não ter relação direta com o auxílio emergencial, ela também vem se mostrando ineficaz, porque "as reformas não incidem diretamente em certos problemas graves da economia brasileira". Além disso, o especialista entende que, ao tentar empurrar as reformas desta maneira, o governo sinaliza que está tentando modificar o papel do Estado na economia brasileira, "sem que isso seja discutido e debatido com a sociedade".
"A gente já viu esse enredo antes, que começa lá em 2015. Passou reforma trabalhista, passou reforma da Previdência, passou teto de gastos. É sempre o mesmo enredo: estamos beirando o colapso e precisamos fazer as reformas porque elas vão evitar que caiamos no precipício. Um enredo que está sendo repetido diversas vezes para convencer a opinião pública de que essas reformas são necessárias", avalia.
Marco Antônio considera que a situação da economia brasileira aponta, como um todo, para um cenário de baixo crescimento, e com um sistema econômico desestruturado por conta da pandemia. Para ele, a melhor forma de se enfrentar esse problema são medidas "de médio e longo prazo que sejam mais estruturantes em relação à melhoria dos postos de trabalho gerados, do perfil de crescimento que a economia brasileira pode ter e do tipo de padrão de especialização produtiva que ela deve ter".
Por fim, Rocha avalia que o governo ainda não apresentou nenhum desenho de como será a extensão desse novo auxílio porque está tentando negociar politicamente o que é possível, reforçando a ideia de que o auxílio está sendo utilizado como forma de barganha.
"Guedes falou um número [de 32 milhões de beneficiados] como ele sempre fala, um número que brotou na cabeça dele naquele momento. O governo não tem nenhuma proposta de desenho desse programa e o está utilizando mais como uma moeda de troca para passar sua agenda, e, dentro disso, ele vai ver o que é possível oferecer", conclui o especialista do Instituto de Economia da Unicamp.