Desde o início da pandemia, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), vem direcionando ataques ao presidente Jair Bolsonaro visando a disputa eleitoral do ano que vem. A politização em torno dos debates sobre a COVID-19 e as vacinas tornou o tucano um dos principais adversário políticos do presidente durante a crise.
Na última terça-feira (30), em entrevista aos jornalistas Reinaldo Azevedo e Leandro Demori, no aplicativo Clubhouse (baseado em conversas de voz), Doria chamou Bolsonaro de "imbecil" e afirmou que "seu maior desejo é ser ditador do Brasil".
Porém, com a volta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao xadrez eleitoral, o esforço de Doria para se viabilizar em 2022 terá que ser ainda maior.
É o que aponta José Paulo Martins Junior, cientista político e professor da Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro), em entrevista à Sputnik Brasil.
O especialista não acredita que, até o momento, o governador paulista tenha mudado o tom do discurso após Lula recuperar seus direitos políticos. Em sua visão, a estratégia continua sendo atacar Bolsonaro, contando com o desgaste do governo até as eleições.
"Isso já tem um bom tempo. Não acho que ele tem intensificado os ataques. Mas acho que na medida em que o Bolsonaro vai se fragilizando, a oposição, tanto a de direita, que é o caso do Doria, a de centro e a de esquerda, vai ampliando os ataques", afirmou Martins.
O cientista político avalia que a primeira dificuldade de Doria é que a maior parte de seus eleitores também votou em Bolsonaro em 2018. Ele alerta que ainda é preciso desconstruir a ideia do "Bolsodoria", que o governador usou em sua campanha para se eleger em um momento de alta de Bolsonaro nas pesquisas.
"Ele foi eleito muito vinculado ao Bolsonaro. Para se desvincular, isso tem que ser mais bem trabalhado. Acho que é nessa linha, se distinguir do Bolsonaro, especialmente, no campo do enfrentamento à pandemia, na busca pela vacina. Com isso, consegue um contraponto", explicou.
Lula e 'frente ampla'
Para o professor da Unirio, a volta de Lula "empareda" os candidatos que estão entre o ex-presidente e Bolsonaro no espectro político.
O maior obstáculo para Doria com Lula na disputa, segundo Martins, é que o governador não tem penetração entre os eleitores do petista, como Bolsonaro teve em 2018, por exemplo, com o ex-presidente fora do páreo.
O especialista aponta que, nesse novo cenário, com Lula e Bolsonaro em 2022, fica "difícil, mas não impossível" viabilizar uma candidatura mais ao centro.
"Teria que haver uma união de forças, de repente com o Ciro Gomes, com o Mandetta, para que esses candidatos de centro consigam derrotar o Bolsonaro e o Lula", avaliou.
Segundo o professor, se a vacinação avançar e a pandemia for controlada, Bolsonaro deve manter pelo menos 30% do eleitorado fiel em 2022. E Lula teria, em sua análise, também em torno de 30% dos votos. Restariam, então, 40% em disputa.
"A questão é conseguir essa articulação toda suficiente para fechar esse arco, que deveria ir desde a centro-direita até a centro-esquerda, para ocupar o centro, que tradicionalmente é o local em que se vence a eleição. Se o Lula estiver isolado na esquerda e o Bolsonaro na direita, há chance. Sem esse isolamento, acho bem difícil", afirmou.