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Filipe Martins é obstáculo para China e sua demissão pode ser benéfica para Brasil, diz especialista

Embora não assuma, China vê Filipe Martins, assessor da Presidência para assuntos internacionais, como obstáculo e pode pressionar para tirá-lo do cargo nos bastidores, disse especialista à Sputnik Brasil.
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Apelidado entre seus detratores de Robespirralho - referência ao fato de ele ser muito jovem e uma menção ao líder jacobino da Revolução Francesa Robespierre - Filipe Martins, embora não seja quadro do Itamaraty, representa a permanência da ala olavista na política externa do governo Bolsonaro, após a demissão do chanceler Ernesto Araújo. 

Muitas dos discursos e falas do presidente considerados agressivos são colocados na conta da influência de Martins sobre Bolsonaro e seus filhos. Segundo a coluna da jornalista Bela Megale, de O Globo, a Embaixada da China estaria pressionando o governo para que o assessor seja demitido. 

Para o cientista político Paulo Velasco, coordenador do programa de pós-graduação em relações internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e pesquisador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), embora não ocorra de forma direta, a China pode sim estar pressionando pela saída de Martins do cargo. 

"Não acho improvável, isso é relativamente comum na diplomacia, nas relações entre Estados. esse tipo de pressão acontece. Claro que não é uma coisa direta. Mas se um país identificar um obstáculo concreto na relação com outro, pode querer remover esse obstáculo, que pode ser um lobby que contraria interesses ou uma pessoa da burocracia em Brasília", disse o especialista. 

Gesto supremacista

Martins já ficou várias vezes ameaçado no cargo e agora está na corda bamba mais uma vez. Na semana passada, a Polícia Legislativa concluiu que o assessor cometeu crime de preconceito durante uma audiência no Senado.

Na ocasião, Martins acompanhava a fala do então ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo sobre os esforços do Itamaraty para viabilizar a aquisição de vacinas contra a COVID-19. 

O assessor estava sentado atrás dele na sala do plenário virtual e, durante discurso de abertura do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), Martins juntou os dedos indicador e polegar da mão direita de forma arredondada e passou sobre o paletó do terno que trajava.

O gesto foi considerado obsceno pelos parlamentares e associado a uma saudação utilizada por supremacistas brancos, já que a mão posicionada desse jeito forma as letras WP (white power, ou poder branco). Além disso, o Ministério Público concedeu um prazo para que Martins dê explicações sobre o ocorrido. A pressão da China para sua demissão teria aumentado após esse fato. 

'Brasil já se livrou de Ernesto Araújo'

"Quando a gente pensa nos incômodos causados com a China, o Brasil já se livrou do Ernesto Araújo, mas o Filipe Martins conseguiu se manter no cargo. Embora seja um posto que perdeu um pouco de seu poder, ainda tem o deu destaque", ressaltou Velasco. "Removê-lo do cargo representaria uma maior fluidez nas relações do Brasil com a China, o que é tudo o que a China quer, e tudo o que o Brasil, convenhamos, precisa", acrescentou. 

Nesta segunda-feira (10), o governador de São Paulo, João Doria, culpou a diplomacia brasileira pelo fato de 10 mil litros de insumos para a fabricação da vacina CoronaVac estarem retidos em território chinês. 

'No final da fila'

Em ocasiões anteriores, a dificuldade de trazer os insumos da China para o Brasil foi vista como uma retaliação do país asiático a declarações de membros do governo Bolsonaro, ou dos filhos do presidente. 

"Claro que os chineses não vão reconhecer isso abertamente, mas a China pode criar dificuldades e alegar fatores técnicos. Isso é mais comum do que a gente pensa nas relações entre os Estados. Embora os dois lados neguem, o Brasil diga que não politiza a vacina, e a China que são questões técnicas, vimos isso acontecer no passado. Na pior das hipóteses, o Brasil fica no final da fila. Simples assim", disse Paulo Velasco. 

Martins é 'corresponsável'

Para o senador Humberto Costa (PT-PE), membro da Comissão de Relações Exteriores do Senado, a "gestão do ex-ministro Araújo foi trágica para o Brasil, para seus interesses comerciais e, particularmente, ao longo da pandemia da COVID-19".

"O chanceler dificultou sempre que pôde o relacionamento com produtores importantes de insumos, como Índia e China. Quanto a Filipe Martins, na condição de ser o principal conselheiro do presidente em política externa, é também corresponsável por essa situação que vivemos hoje: conflitos desnecessários, confrontações inúteis, com a China em particular, trazendo prejuízo grave ao nosso país", disse o parlamentar à Sputnik Brasil.
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