Nesta quarta-feira (12), John Kerry, o enviado especial para o clima do presidente dos Estados Unidos, afirmou em audiência com o comitê de Relações Exteriores do Congresso americano que a Amazônia "vai desaparecer" se Washington não discutir a preservação da floresta com o governo do presidente Jair Bolsonaro.
"Estamos dispostos a conversar com eles, não com tapa-olhos, mas sabendo onde já estivemos", afirmou Kerry, que foi titular do Departamento de Estado dos EUA durante o governo de Barack Obama, citado em reportagem da Folha de S. Paulo. "Esperamos que a intenção possa ser traduzida em ação que seja efetiva e verificável", acrescentou.
Desde março deste ano, os governos brasileiro e norte-americano vêm mantendo uma série de reuniões bilaterais para tratar da questão ambiental. Kerry classificou esses encontros como positivos e afirmou que o objetivo americano é conseguir montar uma nova estrutura de fiscalização das ações na floresta, que gere a confiança de todos. "Tivemos essa conversa. Eles [o governo brasileiro] dizem que estão comprometidos em aumentar o orçamento e montar uma nova estrutura", afirmou.
Durante a sua participação na Cúpula do Clima, Bolsonaro prometeu destinar mais verbas e fortalecer a fiscalização do combate ao desmatamento ilegal. Contudo, poucos dias depois, ele oficializou um corte de recursos para a área relacionada a mudanças do clima, controle de incêndios florestais e fomento a projetos de conservação do meio ambiente.
Segundo a Folha de S. Paulo, o governo americano questionou há duas semanas os cortes anunciados por Bolsonaro e Kerry chegou a demonstrar preocupação com as notícias sobre os mesmos em uma reunião com os ministros do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e Relações Exteriores, Carlos França.
"O que os Estados Unidos [...] estão fazendo agora [...], nada mais é [...] do que traduzir na prática os compromissos assumidos [...] no contexto dos inúmeros acordos concluídos", mais notadamente o Acordo de Paris. "Biden está honrando as obrigações assumidas por Obama e está fazendo agora a sua parte, no contexto de uma assunção de responsabilidades futuras, em face do problema, como um dos maiores países emissores de gases do efeito estufa", afirma.
Para Paulo Roberto, a questão da Amazônia se insere nesse contexto devido ao fato de "o maior peso das emissões de gás do efeito estufa" no Brasil estar vinculado "à destruição da Floresta Amazônica", que é "o maior repositório mundial de reservas naturais do planeta, responsável, em grande medida, pelos desequilíbrios climáticos que afetam todo o planeta".
Então, na opinião do especialista, essas pressões dos EUA não refletem "um objetivo nacional unilateral", mas respondem "à consciência de que todos os países têm [...] obrigações no contexto da responsabilidade quanto à preservação [...] e veem com preocupação as ações do governo Bolsonaro".
Contudo, com a chegada de Bolsonaro ao poder, houve um recuo em relação a esses compromissos assumidos, que coincidiram com um movimento parecido nos Estados Unidos, que à época era liderado por Donald Trump. Segundo o diplomata, tanto Brasília quanto Washington apostaram "em uma espécie de negacionismo político", rejeitando "toda a linha da agenda da sustentabilidade e da ação em torno da mudança climática".
"O que o governo Bolsonaro fez nessa área não foi apenas um crime contra nós mesmos, mas um atentado contra os nossos vizinhos [...] que partilham da Amazônia Legal. E toda a comunidade internacional tem o direito legítimo de questionar a nossa responsabilidade sobre os recursos naturais, que podem até ser juridicamente nossos, situados sob a nossa soberania nacional, mas que, moralmente, eticamente e politicamente, também dizem respeito ao resto da humanidade", afirma o diplomata.
"Se o Brasil tivesse dado continuidade às políticas ambientalistas e preservacionistas implementadas desde o governo Collor, passando por Fernando Henrique Cardoso, pelos governos do PT, e inclusive o de Michel Temer, não teria havido nenhuma pressão sobre o Brasil, qualquer que fosse o governo atual, Bolsonaro ou outro", sentencia o especialista.