O presidente Jair Bolsonaro voltou a defender a volta do voto impresso na última semana. No último sábado (15), Bolsonaro havia declarado que se não houver voto impresso nas eleições de 2022, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai ganhar "pela fraude".
Vale lembrar que a declaração do presidente surgiu em meio à divulgação da pesquisa do Datafolha, que mostrou que Lula lidera com 41% as intenções de voto para as próximas eleições, contra 23% de Bolsonaro.
A cientista política e professora da UNIRIO (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Clarisse Gurgel, em entrevista à Sputnik Brasil, disse acreditar que o sistema de voto não deve ser alterado, apesar de destacar a imprevisibilidade do "movimento da história". De acordo com ela, a proposta do voto impresso representa um atraso e um reflexo da subserviência do governo Bolsonaro ao modelo norte-americano.
"O que justifica a pauta do voto impresso ser levantada hoje pelo governo Bolsonaro é o mesmo que justifica todos os retrocessos impostos por seu governo, seja no campo ambiental, seja no campo da educação, da Saúde, seja no campo dos direitos dos trabalhadores", afirmou.
A cientista política afirmou que é a pauta do voto impresso é uma forma do presidente Jair Bolsonaro tentar "driblar os obstáculos que hoje ele encontra em face da experiência de 2018". Ou seja, para a especialista, o êxito que ele alcançou com uso indiscriminado das fake news durante a campanha de 2018 teria sido uma "fraude digital" do processo eleitoral. "O que ele tenta em 2022 é uma fraude impressa", completou.
Clarisse Gurgel observou que o voto impresso "já se mostrou ao longo da história do Brasil, e se mostra ao longo da história de todos os outros países que mantêm essa estrutura do voto impresso, um recurso instável, muito suscetível a fraudes".
"Agora, infelizmente o governo Bolsonaro representa um campo do povo brasileiro, da cultura nacional, muito permeado por influência dos norte-americanos. O governo Bolsonaro é um retrato da ‘americanofilia’", acrescentou.
O cientista político e professor da UNB, Luís Felipe Miguel, por sua vez, também destacou que, desde a implantação do voto eletrônico, houve uma redução significativa da fraude no processo eleitoral, além de ser um sistema "mais seguro, mais barato e mais ágil".
"Certamente, a volta do voto manual representaria um enorme retrocesso. Eu não acredito que exista nenhuma chance de mudança no sistema de votação, porque não existe nenhum ator político significativo que seja capaz de apontar imprecisões ou falhas importantes no sistema de votação eletrônica que a gente tem hoje", disse ele à Sputnik Brasil.
Para o cientista político, o governo Bolsonaro tem como estratégia política a "manutenção de um grau de tensão forte no país" para manter base militante mobilizada.
"Isso mantém a polarização forte e mantém as teorias de conspiração que são fundamentais no bolsonarismo, nas suas bolhas discursivas", acrescentou.
"Nesse momento, o que a gente tem é um governo em decadência, um governo que tem perdido apoio popular. Os resultados de suas políticas têm aparecido de uma maneira mais clara para a população. E há um presidente que nesse momento tem chances reduzidas de conseguir um mandato nas urnas", argumentou Luís Felipe Miguel.
Para o especialista, este aumento de tensão em torno do sistema eleitoral representa, então, uma "
estratégia de tumultuar e de elevar a tensão, que tem a ver com a estratégia mais geral de destruição da institucionalidade constitucional no país".