No sábado (23), um voo de passageiros entre Atenas, na Grécia, e Vilnius, na Lituânia, foi desviado para Minsk, Belarus, enquanto estava no espaço aéreo desse país, por uma ameaça de bomba, que acabou não se confirmando.
De acordo com a companhia aérea irlandesa Ryanair, a tripulação foi alertada pelos controladores de voo de Belarus sobre uma suposta ameaça de bomba no avião.
Após instruir os pilotos da aeronave a pousar em Minsk, onde uma averiguação seria realizada, o país enviou um caça MiG-29 para realizar a interceptação.
Os agentes de segurança do país utilizaram cães farejadores para verificar o interior da aeronave em busca de explosivos, as bagagens dos passageiros também foram vistoriadas, contudo nenhum conteúdo impróprio foi encontrado.
Após todos os procedimentos serem concluídos, o avião foi autorizado a seguir viagem à capital lituana, sem qualquer problema ou danos para seus tripulantes e aeronave.
Apesar das acusações, Minsk nega que tenha forçado o avião a mudar de rumo, tendo publicado a transcrição da conversa entre o controlador de tráfego aéreo de Belarus e o piloto do avião em questão.
Líderes políticos ocidentais e a oposição política em Belarus acreditam que a presença de opositor de Lukashenko tenha sido o principal fator contribuinte para o desvio do avião, ou seja, para deter o opositor Roman Protasevich, fundador do canal Nexta do Telegram, que estava a bordo.
Este não é o 1º caso em que aviões são forçados a pousar
Esta não é a primeira vez que algo assim acontece. Em 2013, um avião com o então presidente da Bolívia Evo Morales foi obrigado a aterrissar no aeroporto de Viena, por suspeita de presença do ex-agente da CIA Edward Snowden a bordo. O avião seguia de Moscou rumo à Bolívia, quando a França, Portugal, Itália e Espanha fecharam seu espaço aéreo para o avião. Depois de todos os passageiros terem passado pelo controle de passaporte no aeroporto de Viena, revelou-se que Snowden não estava a bordo. Na ocasião, a aeronave foi forçada a pousar por não receber permissão para entrar no espaço aéreo de outros países.
Em 2013, outro avião foi escoltado e forçado a pousar por caças britânicos após suposta ameaça de arma ou bomba a bordo. Na ocasião, o avião da Pakistan International Airlines foi desviado para o aeroporto de Stansted, em Londres. Dois homens foram presos por serem suspeitos de colocar o avião com mais de 300 pessoas a bordo em risco.
De acordo com um porta-voz do aeroporto, os passageiros foram retirados da aeronave logo após o voo, sendo encaminhados ao local onde prestariam seus depoimentos. Apesar de toda a ação, a suposta ameaça de bomba ou arma durante o voo não foi confirmada pelas autoridades.
Neste caso, também houve uma grande repercussão devido ao uso de caças para escoltarem um avião comercial, contudo, o consultor da Aviation Security International Philip Baum afirmou à BBC que "o fato de os caças terem escoltado o avião não é atípico e que a decisão geralmente é tomada quando há uma suspeita de bomba, um sequestro, quando um código transponder é digitado incorretamente ou por falta de comunicação da aeronave com a torre de controle".
Em 2020, dois caças norte-americanos se aproximaram de um avião comercial iraniano que sobrevoava o espaço aéreo sírio, a aeronave ia de Teerã a Beirute. A ação foi considerada perigosa pelo governo iraniano, que afirmou que os EUA colocaram a vida dos passageiros em risco. Por sua vez, o Centro de Comando dos EUA informou que a manobra foi realizada para uma "inspeção visual" durante uma missão de rotina sobre a Síria. Ou seja, a aeronave iraniana foi interceptada sem qualquer motivo ou ameaça a bordo.
Em 2010, o chefe de um violento grupo rebelde sunita, Abdolmalek Rigi, foi detido pelo Irã enquanto voava para um país árabe via Paquistão. Na ocasião, o avião em que voava recebeu ordem de pousar e, após uma averiguação completa, o líder sunita acabou sendo detido. Na época, houve relatos conflitantes da imprensa, principalmente dos EUA, sugerindo que o Paquistão teria oferecido ajuda para trazer Rigi sob custódia.
Belarus violou o regulamento da Organização de Aviação Civil Internacional?
O artigo primeiro da Convenção sobre Aviação Civil Internacional, conhecida também como Convenção de Chicago de 1944 e da qual Minsk é signatária desde 1993, cita que "todo o Estado tem soberania plena e exclusiva no espaço aéreo localizado sobre seu território", referindo o documento que "os Estados signatários reconhecem que todo o Estado deve se abster de recorrer ao uso de armas contra aeronaves civis em voo e que, em caso de interceptação, a vida dos ocupantes não deve ser colocada em perigo".
Contudo, um avião que é autorizado a entrar no espaço aéreo, atende às condições e paga as taxas de voo não poderá ser interceptado sem motivo válido, como os casos de interferência ilícita, que incluem a ameaça de bomba.
A ameaça de bomba é qualquer tipo de comunicação sugerindo ou indicando que a segurança de uma pessoa, de uma aeronave em voo ou no solo, de um aeroporto ou outra instalação da aviação civil, possa estar em perigo pela presença de artefatos explosivos, químicos, biológicos ou radiológicos.
Uma vez recebida a ameaça de bomba, um estado de alerta é emitido pela autoridade competente para acionar o plano de intervenção destinado a contrapor-se às possíveis consequências da ameaça.
O regulamento aéreo prevê que "a interceptação de aeronaves civis será evitada e somente será utilizada como último recurso. Todavia, o Comando da Aeronáutica se reserva o direito de interceptar qualquer aeronave, a critério dos órgãos de defesa aérea ou das autoridades responsáveis pela execução das missões de defesa aeroespacial".
O desvio do avião pode ser interpretado como sequestro?
Neste episódio, na verdade, não se trata de um sequestro, gerando um cenário complicado e inédito em torno da aviação civil.
Isso porque Belarus aparentemente agiu de acordo com o regulamento imposto pela Organização de Aviação Civil Internacional (OACI), contudo o ato cria um problema para a aviação civil relacionado ao uso da força por um Estado.
O fato é interpretado de diferentes maneiras por especialistas, porém, muitos deles acreditam que não havia a necessidade de enviar um caça para escoltar o avião civil, colocando os 170 passageiros em risco.
A França, por exemplo, defende o princípio de que "em uma interceptação por um caça, o comandante deve obedecer às instruções dadas", por se tratar de uma questão de segurança. Por outro lado, "quando uma aeronave cumpre com seus deveres, não pode ser parada sem motivo válido", afirmou à AFP a Direção-Geral de Aviação Civil (DGAC) francesa, citada pela Swiss Info.
Ao que tudo indica, o maior problema discutido entre os países é o motivo pelo qual o presidente de Belarus, Aleksandr Lukashenko, forçou o pouso da aeronave e não o método utilizado, já que diversas mídias e líderes mundiais estão questionando as "falsas" razões para realizar a interceptação da aeronave.
O desvio conduzido por Belarus seguiu os regulamentos descritos pela Organização de Aviação Civil Internacional, assim como outros países já o praticaram, mesmo sem terem constatado as referidas "ameaças".
Uma ameaça de bomba foi recebida, um alerta foi emitido pela autoridade competente e um plano de intervenção destinado a contrapor-se às possíveis consequências da ameaça (seja real ou falsa) foi imposto, tal como é descrito no Programa Nacional de Segurança da Aviação Civil Contra Atos de Interferência Ilícita.
As definições impostas pela mídia e pelos líderes internacionais (inclusive de países que já praticaram o mesmo ato), devem ser analisadas cuidadosamente, visto que não houve sequestro, abuso ou pirataria, considerando que tanto os passageiros quanto a aeronave foram liberados para seguirem viagem ao destino final em segurança.
Todas as ameaças relacionadas à segurança de uma aeronave em voo ou no solo devem ser averiguadas e constatadas, colocando a segurança daqueles que estão a bordo em primeiro lugar.