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Rússia seria para Brasil sócia 'que não procura instrumentalizar essa parceria de forma política'

Evento com autoridades e pesquisadores brasileiros e russos discutiu oportunidades de investimento e colaboração em diversos setores entre os dois países.
Sputnik

Energia, agropecuária, digitalização de serviços, fintechs e muitas outras áreas foram citadas como setores em que a colaboração entre Brasília e Moscou possui muito espaço para crescer durante o Seminário Internacional sobre as Relações Econômicas Brasil–Rússia, que ocorreu nesta sexta-feira (02).

Estreitar laços

Organizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o evento aconteceu virtualmente e reuniu pesquisadores e autoridades dos dois países, que elogiaram a iniciativa. O embaixador da Rússia no Brasil, Alexei Labtskiy, afirmou que conferências como essa são importantes por permitir descobrir nova oportunidades de negócios e parcerias entre os países, fortalecendo as relações entre Brasília e Moscou e "contribuindo para a modernização das nossas economias e melhoria do padrão de vida" nos dos países.

Principal negociador do Brasil no Mercosul, Pedro Miguel da Costa e Silva, secretário de Negociações Bilaterais e Regionais nas Américas, relembrou que semana que vem o Brasil assume a presidência do Mercosul até o fim do ano. "Esse evento ocorre em um momento importante porque podemos reforçar o interesse do Brasil em negociar com a Rússia e com a União Econômica Eurasiática detalhes do acordo comercial. E seria ótimo termos algum tipo de avanço [na negociação] durante a presidência do Brasil [no Mercosul]", afirmou.

A secretária de Negociações Bilaterais na Ásia, Pacífico e Rússia do Ministério das Relações Exteriores da República Federativa do Brasil, Márcia Donner Abreu enfatizou a longa parceria entre os dois países. "Nossa relação tem quase 200 anos, desde os primeiros anos da independência do Brasil […]. Temos um forte diálogo político bilateral, [o presidente brasileiro Jair] Bolsonaro e [o presidente russo Vladimir] Putin têm uma boa relação", destacou Márcia Abreu, acrescentando que os dois líderes conversam regularmente por telefone e sabem da importância de manter os laços entre os dois países.

O vice-ministro de Relações Exteriores da Federação da Rússia, Sergei Ryabkov, advertiu que as duas potências mundiais não deveriam subestimar as oportunidades de negócio que existem na Rússia e no Brasil. "Devemos ser ambiciosos. Não devemos abandonar objetivos, mesmo que pareçam inatingíveis […]. Brasil é parceiro muito importante [para a Rússia]. É um país que amamos. […] Estabelecemos uma grande e nova avenida de cooperação bilateral, com a vacina [Sputnik V contra a COVID-19] e temos um excelente futuro pela frente", disse Ryabkov.

Rússia seria para Brasil sócia 'que não procura instrumentalizar essa parceria de forma política'

É preciso reindustrializar

Rússia e Brasil foram muito beneficiados pelo último superciclo das commodities, que ocorreu de 2002 a 2011. Esse aumento nos preços de matérias-primas gerou uma dependência em setores como metais, petróleo e gás na Rússia e metais mineração e agricultura no Brasil. Agora, ambos os países precisam se reindustrializar, defende André Pineli, técnico de Planejamento e Pesquisa de Estudos em Cooperação Internacional do Ipea.

"Após o fim desse superciclo, as duas economias sofrem bastante. O crescimento econômico na última década nos dois países foi muito baixo. Na minha opinião, é obrigatório reindustrializar nossas economias [...] [Essa é uma forma de] superar essa dependência e ampliar nossa presença no mercado para mais sofisticados bens manufaturados", explica Pineli.

O especialista afirma que em 2019, o investimento direto do Brasil na Rússia foi de US$ 6 milhões (aproximadamente R$ 30 milhões), enquanto em 2010 havia sido de apenas US$ 1 milhão (R$ 5 milhões). Por outro lado, o investimento direto russo no Brasil subiu de US$ 65 milhões (R$ 329 milhões) em 2010 para US$ 180 milhões (R$ 911 milhões) em 2019. Ainda assim, Pineli ressalta que esses valores são "quase nada", uma vez que representam menos de 0,05% do total investido em cada país.

Reforçando o comentário de Ryabkov sobre o potencial de comércio entre as duas potências, o técnico do Ipea mostra dados sobre exportação. O Brasil exporta cerca de US$ 1,5 bilhão (R$ 7,57 bilhões) para a Rússia, enquanto Moscou exporta aproximadamente US$ 2,5 bilhões (R$ 12,62 bilhões) para Brasília. Mas o potencial de exportação é muito maior, segundo Pineli: US$ 26,1 bilhões (R$ 131,7 bilhões) do Brasil para a Rússia e US$ 25,5 bilhões (R$ 128,7 bilhões) no caminho inverso.

"Há muito espaço para crescer, seja em comércio, seja em investimento direto", sintetiza Pineli.

Rússia seria para Brasil sócia 'que não procura instrumentalizar essa parceria de forma política'

Setores com oportunidades de cooperação

Big data, tecnologia de blockchain, digitalização da economia, essas são áreas que atualmente EUA e China lideram, mas outros países estão investimento pesado para não ficar para trás e resguardar a soberania digital. Um desses países é a Rússia, que poderia ajudar o Brasil a desbravar essa área, afirma Dmitry Razumovsky, diretor do Instituto Latino-Americano da Academia de Ciências da Rússia (ILA RAN).

Razumovsky explica que a Rússia já possui elementos de infraestrutura críticos para o setor e já regula a presença de plataformas e mídias estrangeira no país. O Brasil está muito atrasado nesse setor e terá muitas dificuldades em desenvolver seu próprio sistema, que demanda alta tecnologia.

Dessa forma, o especialista argumenta que "uma aliança com Rússia nessa esfera parece lógica […], "um excelente parceiro que não procura instrumentalizar essa parceria de forma política, apesar das acusações dos EUA".

Razumovsky destaca outros setores em que a Rússia poderia oferecer seu know-how para o Brasil: comércio eletrônico (e-commerce) e fintechs.

"O Brasil teve um boom no setor de TI [Tecnologia da Informação] nos últimos anos […] há grandes oportunidades de crescimento, [e] a Rússia tem vasta experiência [nessa área] […] [nasceu na Rússia] um dos primeiros Internet banking [banco virtual] do mundo. Essa é uma tendência que já ocorre há muito tempo na Rússia, mas no Brasil ainda está emergindo essa integração entre fintech e e-commerce. Aqui a Rússia pode ajudar muito", garante Razumovsky.

Ensino não presencial (e-learning), digitalização de serviços e segurança são outras áreas que o especialista destaca como setores em que a Rússia poderia colaborar com o Brasil. "Moscou é uma das cidades mais digitalizadas do mundo, com praticamente todos os serviços disponíveis por aplicação de celular […] A Rússia está investindo em segurança virtual. Isso é super relevante para a luta contra o terrorismo e crime organizado […] A Rússia está disponível não apenas para fornecer essas soluções como para ajudar a desenvolver no Brasil", conclui o especialista.

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