'Não se pode confiar' nos EUA, diz especialista à luz de planejada retirada de Washington do Iraque

Os EUA não têm um histórico positivo no seu tratamento dos curdos no Oriente Médio, que não mudou com o novo presidente Joe Biden, pelo que eles devem se apoiar no Irã e na Rússia, segundo um analista político.
Sputnik
Com a retirada a partir de 2022 da maioria dos militares norte-americanos do Iraque, muitos curdos se sentem expostos, mas Hiwa Osman, analista político residente na cidade iraquiana de Arbil e ex-conselheiro de Jalal Talabani, um político curdo que foi presidente do Iraque de 2006 a 2014, diz à Sputnik não estar surpreendido com a ação, dada a "pobre história" de os EUA maltratarem seus aliados.
"Eles sempre disseram que não deixariam os curdos, mas a história nos ensinou que sempre o fizeram." Na opinião dele, a saída dos EUA não transformará o Iraque em outro Afeganistão, mas o Iraque ficará "fragmentado e dividido".
Alguns dos problemas enfrentados pelos curdos incluíram tentativas do Irã e da Turquia de arrancar alguns territórios dos curdos, a falta de acordo com Bagdá sobre as receitas do petróleo e as terras disputadas e o envolvimento das forças curdas peshmerga nas forças militares iraquianas.
Muitos curdos depositavam esperanças em Joe Biden, presidente dos EUA, ao contrário de Donald Trump (2017-2021), que foi visto como os tendo usado durante sua presidência. Apesar disso, a saída militar dos EUA deixou clara a política da administração do atual presidente norte-americano.
"O sul cairá nas mãos do Irã. No norte, onde estão os curdos, haverá uma tomada do poder pelos turcos, enquanto no centro, onde reside a maioria dos sunitas, haverá uma guerra civil", acredita Osman.
Isso aconteceu em 1975, quando, após o tratado fronteiriço Irã-Iraque, os curdos foram atacados por Saddam Hussein, então líder do Iraque, enquanto os norte-americanos, que inicialmente pareciam ter apoiado o líder curdo Masoud Barzani, não tomaram ações.
Nos anos 1980, os curdos sofreram um revés semelhante, quando se juntaram aos guardas revolucionários iranianos na guerra Irã-Iraque. Quando as hostilidades chegaram ao fim, Hussein tornou-se ainda mais impiedoso para com a minoria étnica que havia cooperado com seu inimigo. Washington, mais uma vez, preferiu não interferir.
"Eles também deixaram os curdos da Síria", diz Osman, referindo-se à retirada de tropas dos EUA em 2019 do país governado pelo presidente Bashar al-Assad e à recusa de confrontar a Turquia por sua decisão de transferir tropas e forças aliadas para áreas controladas pelos curdos.
"Não se pode confiar neles, e esta é a razão pela qual os curdos deveriam estar procurando alternativas", afirmou.

Alternativas a Washington

Irã poderia ser uma das alternativas, crê Osman, com os curdos tendo garantido em 2018 a Teerã que não permitiriam que qualquer grupo curdo da oposição lançasse ataques transfronteiriços desde o Curdistão iraquiano, algo que aproximou os dois lados. Além disso, o Curdistão oriental fez uma série de nomeações que indicavam que estavam buscando laços mais estreitos com a República Islâmica do Irã.
Também houve tentativas de aproximação com a Rússia. Em 2020, Moscou se certificou de envolver os curdos nas negociações com o presidente sírio Assad, enquanto Vladimir Putin, presidente da Rússia, reiterou a importância das forças curdas peshmerga iraquianas em sua luta contra o Daesh (organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países).
"Para os curdos, faz todo o sentido alinharem-se com países como o Irã e a Rússia. Esses se mantêm com seus aliados até a última bala. Portanto, se eu fosse um tomador de decisões e precisasse escolher entre Washington e Moscou, eu certamente avançaria para esta última", conclui Osman.
Atualmente há cerca de 2.500 militares dos EUA no Iraque com o objetivo de combater os restos do Daesh e outros grupos terroristas. É esperado que no próximo ano restem poucas tropas, e que elas treinem e aconselhem os militares iraquianos.
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