Reitor do Santuário do Cristo Redentor, padre Omar viajou para Roma envolto em uma polêmica, após ter sido barrado por funcionários do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) quando ia realizar um batizado no monumento. São águas passadas, ainda que ardentes, garante ele em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, concedida no auditório da Rádio Vaticano, gentilmente cedido pelo diretor dos serviços brasileiros, Silvonei José Protz.
"Houve um desgaste. Esse desgaste já foi dissolvido, graças a Deus e ao nosso Redentor, a gente vai celebrar a festa do Cristo integrando mais e mais. A perspectiva da natureza, aquele entorno que compõe essa estética fabulosa do Cristo, de fato a celebrarmos, de fato a paz, a união e o desenvolvimento da cidade do Rio de Janeiro", prega padre Omar.
Este correspondente da Sputnik Brasil encontrou padre Omar por acaso em um jantar beneficente no Jazz Café, um dos maiores redutos de brasileiros em Roma. No evento, regado a picanha e caipirinha (sem a Cachaça Redentor, ainda), padre Omar deu uma canja no show do Minas Groove, cantando Cidade Maravilhosa (veja o vídeo).
Padre Omar canta Cidade Maravilhosa com o Minas Groove no Jazz Café, em Roma
© Foto / Melissa S. Buswell
Lá, revelou, em primeira mão, que um dos maiores símbolos da gastronomia brasileira irá ganhar uma marca licenciada como Cachaça Redentor. O papa Francisco ficou sabendo antes, é verdade. Depois de o pontífice brincar que brasileiro não tem salvação porque "é muita cachaça e pouca oração", padre Omar aproveitou a deixa e não perdeu a piada – nem o amigo.
"A cachaça brasileira é conhecida no mundo todo e não é desconhecida do papa. Encontrou no próprio papa a possibilidade de um marketing integrado. A cachaça resiste e encontra, hoje, uma grande parceria no Cristo Redentor. De tal forma que o Santo Padre vai poder experimentar este produto e certamente vai poder compartilhar com tantos outros, principalmente, com mais saber, o consumo desta Cachaça Redentor", afirma.
A garrafa da Cachaça Redentor, em homenagem aos 90 anos do Cristo
© Foto / Divulgação
O sacerdote carioca, que também é pároco da Igreja de São José da Lagoa, revelou à Sputnik Brasil algumas das atrações das comemorações pelos 90 anos do Cristo. Um samba composto por Moacyr Luz, especialmente para a ocasião, será lançado junto com um clipe no Fantástico do próximo domingo (26), com a participação de 12 artistas, entre eles Zeca Pagodinho, Elba Ramalho, Ivete Sangalo, Fagner, Paula Toller e Tiago Abravanel.
No final da entrevista, este correspondente da Sputnik agraciou padre Omar com uma camisa de Chico Mendes para ajudar a pacificar a relação com o instituto que leva o seu nome. O sacerdote disse que a colocaria no museu do Cristo Redentor.
Leia a íntegra da entrevista com padre Omar abaixo:
Sputnik: Eu queria que o senhor contasse aquela notícia, em primeira mão, que o senhor me contou ontem, que história é essa de cachaça do Cristo Redentor? Como que é isso?
Padre Omar: Nesse momento, observando a natureza afetiva, espiritual e, ao mesmo tempo, que impulsiona a atividade econômica do país, o Cristo Redentor também abre seus braços para colaborar na divulgação e na ampliação deste importante produto nacional que é a cachaça. É um produto cultural. Existe, por exemplo, o Dia Nacional da Cachaça, que muita gente não conhece. É sempre dia 13 de setembro celebrado no nosso país. Por vezes, a cachaça passa a ser alvo de brincadeiras e atividades jocosas. Não é muito difícil encontrarmos isso. A figura do cachaceiro, que tanto faz parte do nosso imaginário, das nossas múltiplas brincadeiras. A cachaça, como um ativo nacional, encontra hoje no Cristo Redentor uma oportunidade de sua ampliação. O Cristo Redentor possui hoje um setor de intermediação de oportunidades e licenciamento de novos produtos. Hoje, temos a alegria de anunciar a cachaça do Cristo Redentor. É algo que vai ser realmente fabuloso com a necessidade que estamos encontrando, a contrapartida que está sendo criada a partir desta produção. Exatamente destinar recursos para os múltiplos projetos sociais que o Cristo Redentor possui e apadrinha. Por isso, um produto, tendo a sua marca vinculada ao Cristo Redentor... Produto nacional, de exportação, de altíssimo consumo… Olha, são mais de 500 milhões de litros de cachaça consumidos pelo povo brasileiro. Olha que maravilha a gente poder perceber isso, né? Então, a gente tem a alegria de anunciar esse novo produto.
S: O senhor deixou uma garrafa para o papa Francisco experimentar?
PO: E tive a oportunidade de trazer aqui e deixar no Vaticano, no gabinete do papa… não sei se ele vai receber, mas eu deixei o primeiro litro de presente para o Santo Padre, mostrando aí esse insumo nacional, esse produto nacional, que tem um valor agregado imenso, a partir das contrapartidas que estamos dando. Um produto oficial do Cristo Redentor. Assim como tem os vinhos com nome de santos, temos aí, no Chile, por exemplo, o vinho Santa Helena, na Argentina... Temos também um produto nacional, brasileiro, interfaciado pelo nosso Cristo Redentor. Essa é a nossa alegria de poder anunciar esse novo produto, que traz contrapartidas fundamentais para a manutenção dos nossos projetos sociais.
S: O senhor falou das brincadeiras, o próprio papa fez uma brincadeira com a cachaça brasileira, né? Então, essa cachaça vai ser abençoada pelo papa?
PO: Olha, a cachaça brasileira é conhecida no mundo todo e não é desconhecida do papa. Encontrou no próprio papa a possibilidade de um marketing integrado. Um engajamento ainda maior da produção nacional, já que é um produto tipicamente brasileiro. Esse produto é nosso. Já tivemos outras perdas, anos atrás desconfiguraram nosso guaraná, já tentaram levar o açaí para outro lugar, o nosso café, mas a cachaça não. A cachaça resiste e encontra, hoje, uma grande parceria no Cristo Redentor. De tal forma que o Santo Padre vai poder experimentar este produto e certamente vai poder compartilhar com tantos outros, principalmente, com mais saber, o consumo desta Cachaça Redentor. Esse produto vai estar ajudando muita gente: a produção, os produtores, aqueles que cultivam, a indústria própria voltada para este segmento e também a geração de recurso para aquilo que a gente sabe fazer e gosta de fazer, que são ações sociais.
O sacerdote carioca durante entrevista à Sputnik Brasil, no auditório da Rádio Vaticano
© Foto / Divulgação/Solange Souza
S: Quando é que a cachaça do Cristo Redentor vai ser lançada? Vai ser junto à comemoração dos 90 anos?
PO: Dentro dos 90 anos do Cristo, seguindo a lógica do portfólio dos produtos oficiais, nós temos aí a alegria de apresentar, além dos produtos devocionais, ligados à espiritualidade, à fé, ao culto, temos também outros que serão consumidos de maneira diversificada, entre eles a cachaça, que é algo maravilhoso, que valoriza a nossa cultura, o nosso cultivo, e o nosso povo brasileiro.
S: Mas culturalmente, o que haverá de programação lá em cima, no Corcovado?
PO: No plano cultural, teremos shows, que serão apresentações noturnas. Assim que fecha o Cristo Redentor para o grande público, temos um espaço de algumas horas onde teremos lives. E essas lives vão contar com artistas brasileiros, que vão fazer sua homenagem ao Redentor, cantando músicas em homenagem à cidade do Rio de Janeiro, ao Brasil. Sempre, cada música, observada pela curadoria do Santuário. Temos uma curadoria artística, que avalia o repertório, o conteúdo daquilo que vai ser apresentado, sem geração de uma lógica punitiva ou marcada pela censura, mas que respeita o valor sagrado daquele espaço. Nem tudo pode ser cantado no Cristo Redentor. Então, a gente consegue interfaciar tantas lindas canções do nosso país e precisa valorizar as grandes composições que giram em torno do amor, do respeito, da fraternidade e das belezas cariocas. É isso que a gente quer sempre poder cantar na colina do Cristo Redentor.
S: E o que é que o senhor já pode revelar desse repertório musical, e quem vai cantar?
PO: Olha, teremos uma grande música. E aí a gente fala aqui de primeira mão, que acabou de ser gravada com mais de 12 artistas brasileiros. Existe um compositor chamado Moacyr Luz, que é um grande sambista, um homem fabuloso, e o nosso querido Max Pierre está fazendo a produção musical com Adriano de Martini. Já gravou nessa música, eu, padre Omar, estou lá cantando um samba maravilhoso; Ivete Sangalo, Zeca Pagodinho, Fernanda Abreu, Paula Toller, Fagner, Elba Ramalho, Tiago Abravanel, enfim, grandes artistas nacionais, sambistas, pessoas das mais diversas partes do Brasil, que estão colocando voz nessa música. E vai ser lançado oficialmente um clipe no programa Fantástico, no último domingo de setembro, já abrindo as comemorações do aniversário do mês comemorativo. Teremos ali o lançamento em rede nacional encerrando o Fantástico, na TV Globo, a exibição do clipe pelos 90 anos do Cristo Redentor, na linda canção do Moacyr Luz, cantadas pelos grandes artistas brasileiros.
S: Bom, padre Omar, recentemente houve um episódio desagradável: o senhor foi barrado na entrada do Santuário do Cristo Redentor e não foi a primeira vez. Como está esse diálogo com o Instituto Chico Mendes agora para pacificar essa questão?
PO: Olha, a presença do Cristo Redentor no alto do Corcovado, ela é anterior à criação do Parque Nacional da Tijuca. Cristo está ali há bastante tempo, quase 90 anos, praticamente 90 anos, e a gente tem ali a experiência do dia a dia, da facilidade, da servidão de passagem, sendo viabilizada por alguns atores do Instituto Chico Mendes no Rio de Janeiro. É um órgão federal, que tem sua presença ali, com pessoas realmente qualificadas na gestão ambiental, que acho que não compreenderam até então muito bem a presença da Igreja e dessa servidão de passagem, da nossa atuação espiritual, social e ambiental, que é muito presente e muito marcante na vida do Santuário. Houve um desgaste. Esse desgaste já foi dissolvido, graças a Deus e ao nosso Redentor, a gente vai celebrar a festa do Cristo integrando mais e mais. A perspectiva da natureza, aquele entorno que compõe essa estética fabulosa do Cristo, a celebrarmos de fato a paz, a união e o desenvolvimento da cidade do Rio de Janeiro. Uma cidade que tem uma vocação turística. Com isso, o desgaste institucional chega ao fim. Temos, novamente, o reposicionamento da atuação e do respeito da Arquidiocese do Rio de Janeiro, que é detentora da imagem, que é proprietária da imagem do Cristo Redentor, possui o seu domínio sobre aquele terreno. E ao mesmo tempo em que vai retomar sua atuação plena diante de tudo aquilo que foi construído com o dinheiro do povo brasileiro, capitaneado pela Igreja Católica. Aquele espaço, hoje, tem a sua vocação.
S: O senhor disse que o prefeito Eduardo Paes estava tentando entrar em contato com o senhor, estava em Brasília. O senhor chegou a conseguir falar com ele? Ele está intermediando de alguma forma esse diálogo?
PO: Graças a Deus, os poderes constituídos do nosso país entenderam bem e entendem bem o trabalho consolidado. Tivemos inúmeras moções em repúdio à atuação de alguns gestores, de alguns funcionários. Mas isso tudo é muito pequeno perto daquilo que vai ser celebrado nos próximos dias, em torno do nosso grande monumento. Tudo resolvido, tudo pacificado. E Chico Mendes foi um grande ativista, morou nas terras da Amazônia, ali viveu e ali foi assassinado. Tem a sua história muito ligada à Igreja Católica. Ele que dá nome a esse importante instituto, o Instituto Chico Mendes, que teve sua origem num desmembramento do Ibama, que hoje faz a gestão de vários parques nacionais, mantendo a unidade de conservação sempre protegida. Vamos, então, sempre celebrar a memória desse grande ativista brasileiro, Chico Mendes, um homem que merece ter a sua dignidade salvaguarda, a sua memória salvaguardada na lembrança de todos nós, que amamos a Amazônia. Estamos comprometidos com o desenvolvimento daquela região e, ao mesmo tempo, voltados com a mesma intensidade para as questões mais sensíveis que o papa Francisco tem chamado atenção sobre a região amazônica. Chico Mendes foi um homem, um profeta daquela região, e que merece ser muito lembrado. Fico muito feliz de ver o presente que eu ganhei [a camisa de Chico Mendes].
No detalhe, a camisa de Chico Mendes: 'Vamos, então, sempre celebrar a memória desse grande ativista brasileiro', diz o padre
© Sputnik / Lauro Neto
S: Uma lembrança que eu trouxe de Xapuri, terra de Chico Mendes, para o senhor justamente para pacificar...
PO: Muito obrigado! É algo realmente muito especial o presente que recebo de você e que nos alegra muito!
S: Agora, com essa camisa, o senhor não vai ser mais barrado lá.
PO: Acho que não, né? Um grande abraço a todos!