Engenheiros que trabalhavam no programa da missão lunar tripulada da União Soviética planejaram construir um sofisticado sistema de controle eletrônico capaz de examinar e determinar independentemente o local de aterrissagem da espaçonave que transportava os cosmonautas, revelou um relatório desclassificado.
O documento secreto de 167 páginas, originalmente publicado em 1965, e recentemente desclassificado pelos Sistemas Espaciais da Rússia, uma subsidiária da agência espacial russa Roscosmos especializada no desenvolvimento, fabricação e operação de sistemas de informação espacial, intitula-se "Sistema Autônomo de Controle Radioeletrônico do N1-L3".
O N1/L3 foi um veículo de lançamento superpesado, destinado a fazer chegar a espaçonave à órbita na missão lunar tripulada soviética, mas uma série de testes fracassados e outros problemas com o foguete acabaram colocando a missão em espera por tempo indeterminado.
Voo automatizado
O relatório técnico detalhado delineia os princípios de operação do sistema de controle automatizado, assumindo que ele executaria a maioria das tarefas de voo da missão, incluindo a determinação da área de aterrissagem, e seu rastreamento.
Imagem do lado oculto da da Lua tirada pela estação espacial interplanetária soviética Zond 3
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/ Estava previsto que o sistema mediria uma ampla gama de parâmetros, incluindo a localização precisa da espaçonave em qualquer momento, sua velocidade de movimento e trajetória. O sistema poderia gerar correções destes parâmetros em modo autônomo durante o voo, sem depender do controle em terra.
Os engenheiros sugeriram que mesmo aqueles controles que fossem deixados nas mãos de operadores humanos seriam duplicados durante todo o voo, adquirindo assim alguma autonomia de comunicações com a Terra e, portanto, não sendo afetados pela perda ou atraso potencial do sinal. Apesar disso, a tripulação da nave espacial e o controle em terra ainda poderiam anular comandos automáticos em caso de emergência.
Fases da missão lunar
O relatório técnico também incluía um plano detalhado das etapas da viagem da nave espacial tripulada à Lua e do retorno à Terra. O plano sugeria que o foguete portador N1/L3, com quatro estágios, voasse em direção à órbita terrestre e fosse colocado em órbita geocêntrica.
A partir daí, a nave que transportava três cosmonautas seria acelerada e colocada em uma órbita selenocêntrica, ou seja, à volta da Lua. Após correções na trajetória, a cápsula de aterrissagem do módulo de pouso desceria à superfície da Lua e realizaria uma aterrissagem suave.
Posteriormente, após decolar da superfície da Lua e acoplar à nave orbital, a tripulação começaria a longa viagem de retorno à Terra, com a reentrada na órbita da Terra seguida de uma descida controlada.
Mapa da Lua mostra locais de desembarque da estação automática soviética Luna 16 no mar de Abundância e das naves espaciais tripuladas americanas Apollo 11 (mar de Tranquilidade) e Apollo 12 (oceano de Tempestades)
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/ O plano era notavelmente semelhante ao programa Apollo dos EUA, que seguiu os mesmos passos básicos com sua bem-sucedida missão Apollo 11 em julho de 1969 e todas as viagens americanas posteriores à Lua até 1972.
O programa Apollo também apresentava um computador digital avançado a bordo, instalado no módulo de comando e lunar, que auxiliava na orientação, navegação e controle da nave espacial, mas ainda dependente de astronautas para completar o voo. O computador foi criado no início dos anos 1960 pelo Laboratório de Instrumentação do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, EUA.
Apesar do fracasso do projeto do foguete N1/L3 em enviar humanos para a Lua, a URSS conseguiu aterrissar com sucesso naves espaciais em Vênus e Marte, em 1970 e 1971, e construir a Salyut 1, a primeira estação espacial do mundo.
O legado da tentativa de levar uma missão tripulada à Lua foi visível quando a nave espacial Buran realizou com sucesso em 1988 um voo não tripulado de três horas e meia, retornou à Terra e pousou na pista do cosmódromo de Baikonur, a apenas três metros do ponto previsto, usando seu computador de bordo. O feito de engenharia permaneceu inigualável até a aterrissagem do avião espacial Boeing X-37B na Base da Força Aérea de Vanderberg, EUA, em dezembro de 2010.