Ao todo, 14 especialistas em biologia, química, física, arqueologia e antropologia estiveram envolvidos na produção do maior estudo já realizado sobre a presença do cinábrio (mineral de sulfeto de mercúrio) no corpo humano.
Intitulado "O uso e abuso de cinábrio no Neolítico Tardio e na Idade do Cobre na Península Ibérica", o artigo relata os resultados da pesquisa, que conta com uma amostra de restos de 370 indivíduos de 50 túmulos localizados na Espanha e Portugal, datados do Neolítico, Idade do Cobre, Idade do Bronze e Antiguidade, ou seja, cerca de 5.000 anos de história humana.
Segundo os resultados do estudo, foi no início da Idade do Bronze que os níveis de exposição ao mercúrio apareceram de forma mais intensa. O período, que vai de 2.900 a 2.600 A.C., corresponde à época com a maior exploração e uso de cinábrio evidenciado pela pesquisa.
Segundo os pesquisadores, citados pelo Heritage Daily, foi neste momento da história que o uso social e cultural do mercúrio teve seu ápice, com a transformação do mineral em pó, que graças à sua coloração avermelhada servia como pigmentação para tinta, como "vermelho pompeiano", no famoso período da Antiguidade, ou "vermelhão" na arte moderna.
Considerada patrimônio da humanidade pela UNESCO, a maior mina de cinábrio do mundo fica localizada em Almadén, na Espanha. A exploração do mineral, que data de 7.000 anos, no período Neolítico, ganha algum valor social, tornando-se um produto de usos variados, apenas na Idade do Cobre, há cerca de 5.000 anos.
No sul de Portugal e na Andaluzia, o pó de cinábrio foi encontrado em diversos túmulos com usos variados. Foi identificado como pigmento de tinta para decoração de estatuetas, câmaras fúnebres, ou mesmo em pó sobre os corpos dos mortos, o que teria resultado em um alto nível de contaminação por inalação ou consumo acidental, levando a acúmulos surpreendentes de mercúrio nos corpos: cerca de 400 partes por milhão (ppm) chegaram as ser registradas em algumas ossadas. Para se ter uma ideia dos níveis de contaminação, atualmente a Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que o nível normal de mercúrio no cabelo não deve ser superior a 1 ou 2 ppm.
O alto nível de contaminação deve ter afetado fortemente a saúde das pessoas desse período, segundo os pesquisadores, que não descartam ainda a ingestão ou inalação deliberadas da substância em rituais sagrados. As evidências científicas apresentadas pelo estudo abrem um novo capítulo na história da Humanidade, revelando a relação do homem com uma das substâncias mais peculiares já encontradas ao longo da história e nos auxiliando a compreender seus reflexos diretos na saúde humana.