Na terça-feira (18), está marcada uma paralisação dos funcionários de carreira, considerados a "elite" do funcionalismo público no Brasil. O ato busca cobrar reajuste salarial do governo do presidente brasileiro Jair Bolsonaro (PL). O movimento deve juntar ainda servidores do IBAMA e do ICMBio e recebe apoio da base dos servidores federais
A paralisação é uma resposta às intenções do governo federal de garantir aumentos salariais a policiais, considerados parte da base de apoio de Bolsonaro. A medida foi anunciada ainda em dezembro do ano passado e gerou inquietação no funcionalismo público.
Diante do ocorrido, o Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate) aprovou paralisação da categoria nos dias 18, 25 e 26 de janeiro. A entidade reúne funcionários com poder de pressão de instituições como a Receita Federal, o Banco Central e também da diplomacia.
Em Brasília, o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (à direita) aponta na direção do ministro da Economia, Paulo Guedes (à esquerda), que gesticula. Foto de arquivo
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Para Guilherme Carvalhido, cientista político e professor da Universidade Veiga de Almeida, a paralisação cria problemas sociais e políticos, e a responsabilidade pelas consequências do movimento deve cair sobre os ombros do governo federal. Segundo o pesquisador, ao privilegiar determinadas categorias do funcionalismo público em detrimento de outras, o Planalto gerou "instabilidade" entre os servidores públicos.
"O que traz para o próprio governo um momento complicado, sobretudo em um ano eleitoral, em que o governo precisa demonstrar competência e resultados na sua administração", avalia o cientista político em entrevista à Sputnik Brasil.
É evidente para Carvalhido que Bolsonaro busca fortalecer sua base de apoio com as medidas, visto que não há espaço no orçamento para garantir aumento para as demais categorias. A instabilidade gerada pela escolha, porém, pode desgastar a imagem do governo, que tem como característica movimentos em direção à sua base de apoio, explica o cientista político.
"Privilegiar alguns em detrimento de outros não traz uma justificativa. Seria mais adequado do ponto de vista orçamentário e até mesmo político que o presidente conseguisse equilibrar para o funcionalismo um aumento que contemple todas as categorias", afirma.
Carvalhido ressalta ainda que esse tipo de medida é comum em anos eleitorais, mas por si só não é capaz de garantir vitórias nas urnas. Segundo o pesquisador, o conjunto de medidas do governo deve ser levado em conta nessa avaliação.
"É normal isso acontecer, no entanto, isso não garante o sucesso eleitoral daqueles que estão concedendo esses aumentos. Pelo contrário, na verdade, às vezes você tem um governo ruim, muito mal executado, que mesmo com essa variável de aumento não conseguirá ter o sucesso eleitoral", salienta.
Desgaste político 'irreversível'
A popularidade do presidente Bolsonaro está em queda ao longo da pandemia da COVID-19. Carvalhido acredita que o presidente perdeu apoio entre os eleitores devido à gestão da crise sanitária, que vitimou mais de 620 mil brasileiros, mas também pelo que chama de "letargia" da atividade econômica.
Segundo o pesquisador, há uma tendência para que nas eleições presidenciais deste ano o eleitorado prefira "votar com o bolso", tendo em vista indicadores como a inflação. Em 2021, a inflação oficial divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ficou em 10,6%, a maior desde 2015.
"Tivemos um movimento de gerenciamento negativo da economia, sobretudo no ano de 2021 em que houve fraco crescimento econômico e uma inflação alta – o que é um cenário muito ruim para o brasileiro médio. [...] E o brasileiro coloca essas dificuldades na conta dos governos, sobretudo o governo federal", afirma, acrescentando que esse quadro impõe ao governo Bolsonaro um desgaste "provavelmente irreversível" e que dificulta sua eventual reeleição.