COVID-19: em um mês de 2022, Portugal já tem mais casos do que em todo 2021; médicos analisam futuro
06:00, 29 de janeiro 2022
Com mais de um milhão de novos casos de COVID-19 em janeiro, Portugal já superou, no primeiro mês de 2022, o total acumulado em 12 meses de 2021. Entre 1º de janeiro e 31 de dezembro, houve 975.968 casos. Apesar disso, médicos ouvidos pela Sputnik Brasil dizem que a doença pode se transformar em uma endemia.
SputnikO último
boletim epidemiológico divulgado pela
Direção-Geral de Saúde (DGS), nesta sexta-feira (28), mostra que, nas últimas 24 horas, havia 63.833 novos casos. O número é maior do que a estimativa de
pico diário de 60 mil apontada por matemáticos para janeiro. No entanto, a alta quantidade de pessoas infectadas não é acompanhada de um crescimento nos números de internações e mortes.
O documento da DGS aponta 44 óbitos, 2.320 pessoas internadas e outras 152 em unidades de cuidados intensivos (UCIs). Para efeitos comparativos, o pico de 2021 aconteceu em 28 de janeiro, com 16.432 novos casos e o máximo de 303 mortes diárias. Em 1º de fevereiro do ano passado, registrou-se o recorde de 6.869 internações. Quatro dias depois, 904 pessoas estavam em UCIs, número mais alto até agora.
Especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil atribuem os recordes de novos casos diários à alta transmissibilidade da variante Ômicron. Por outro lado, eles apontam que a nova cepa é menos agressiva, o que contribui para que os sintomas sejam mais leves. Somado a isso, Portugal tem 90,4% da sua população com vacinação completa, uma das mais altas taxas do mundo.
Em entrevista à
Sputnik Brasil, a médica gaúcha Nair Amaral, que trabalha em hospitais e asilos da Área Metropolitana de Lisboa, explica que
a Ômicron não tem a mesma virulência das outras cepas, seguindo a história da evolução dos vírus.
"Todos os vírus entram 'selvagens' e, depois que vão passando pelos animais ou humanos, vão se adaptando e ficando menos agressivos. Geralmente, é esse o caminho de todos os vírus. Temos muitos casos, porque ele é facilmente contagioso, mas causa muito menos sintomas e muito menos mortalidade", detalha Nair Amaral.
Pandemia pode virar endemia
Sempre otimista, ela, que está na linha de frente do combate à COVID-19 desde o início da doença, acredita que a pandemia vai se tornar uma endemia, com focos mais intensos em algumas regiões do mundo, mas sempre com recidivas.
"O que acaba com isto é o comportamento do vírus, sua história natural, a adaptação dele ao meio, ao corpo humano. E são as nossas defesas naturais em encontro com ele [vírus]. Acho que o que está acontecendo agora é realmente a imunidade natural do corpo humano entrando em contato com um vírus que vai ficando menos virulento", complementa.
Nair conta que o que mais a preocupa agora não são mais os pacientes de COVID-19, mas as doenças negligenciadas durante a pandemia. Segundo ela, muitas pessoas que são internadas infectadas com o novo coronavírus têm outras doenças associadas, que podem levar à morte mais que a variante Ômicron.
"É como se alguém tivesse um infarto, um AVC, e estivesse com uma gripe por Influenza. Não quer dizer que foi o Influenza que o matou. Mas também, como todos os anos, em todos os invernos, as gripes matam pessoas vulneráveis e não seria diferente com o coronavírus", compara.
Ainda assim, ela considera que a situação está muito melhor do que no inverno passado. Na opinião dela, o governo português deve seguir o exemplo do Reino Unido, que suspendeu as medidas restritivas, como o uso obrigatório de máscaras em ambientes fechados ou locais públicos e a apresentação de certificado de vacinação em eventos com grande público.
"Não está faltando cama de cuidados intensivos para doentes com COVID-19. Trabalho quase todos os dias entre Covidados, na urgência respiratória, e vivi todos os ciclos desde o início. Realmente, agora, está muito mais tranquilo e não há mais por que ter tantas barreiras. Acho que têm que começar a cair", sugere.
21 de janeiro 2022, 19:06
Ômicron tem grau de nocividade menor
O médico carioca Marcio Sister, que mora e trabalha em Vila Nova de Gaia, cidade vizinha ao Porto, no Norte de Portugal, concorda que a Ômicron tem um grau de nocividade menor, o que se pode constatar com a queda nos números de internações e de casos graves. No entanto, ele descarta que a variante funcione como uma "doença-vacina", que permitiria a imunidade de rebanho.
Para explicar, ele cita o exemplo de vírus imunizantes como herpes zóster e o sarampo, que só se manifestam uma vez, diferentemente dos herpes genital e labial, além da própria gripe, que podem se manifestar várias vezes. Ele encaixa o novo coronavírus nesse segundo grupo, já que as pessoas podem ter COVID-19 diversas vezes.
"Acho muito prematuro falar em imunização da população pela Ômicron. A gente acaba ganhando uma certa resistência, mas não imunização", diz Sister à Sputnik Brasil.
A médica intensivista Ana Diogo, que trabalha em um hospital em Setúbal, relata um cenário similar ao dos demais colegas de profissão. Também carioca, formada em medicina em Portugal, ela diz que a maioria das internações em UCIs é de idosos com idades acima de 80 anos e com patologias associadas.
"Estamos entrando em endemia, naquela coisa que não mata, mas mói. No ano passado, foi muito difícil. A gente tinha que escolher quem vivia e quem morria. Eu chegava em casa e chorava muitas vezes, porque assinei atestados de óbito de muita gente. Esse ano está muito tranquilo. Todo mundo vai ter COVID-19, numa fase que não vai ser grave", avalia Ana Diogo.
Ela também considera que a Ômicron é uma variante que provoca uma doença mais leve mesmo em pessoas não vacinadas.