O lockdown na China, o conflito na Ucrânia e a falta de contêineres no mundo são razões que provocam congestionamento em portos de diferentes países, gerando barreiras para as cadeias de suprimentos globais. O problema é geral e já foi reconhecido pelo governo brasileiro, com a Câmara de Comércio Exterior (Camex) decidindo reduzir tarifas de importação na última semana.
A medida é paliativa, como explicou à Sputnik Brasil João Ferreira Netto, professor da Fundação Vanzolini. Embora possa "ajudar" a economia brasileira, ela ainda está distante dos problemas que de fato atingem os portos e o setor de produção. Para o especialista, os efeitos da crise global no Brasil são agravados pelo processo de desindustrialização do país, assim como pela falta de investimentos na produção industrial.
O fato é que a vulnerabilidade das cadeias logísticas globais, um problema evidenciado durante a pandemia de COVID-19, foi novamente exposta com o conflito na Ucrânia. As dificuldades são inúmeras, e as filas nos portos, assim como o congestionamento dos navios, provocaram aumentos nos preços dos produtos manufaturados, levando a ondas inflacionárias.
Apenas nesta semana, França e Alemanha tiveram inflações recordes. Como os custos de transporte aumentaram, subiu também o custo do que é transportado. No comércio marítimo brasileiro, exportadores têm sofrido com novos aumentos nos fretes e dificuldade para escoar produtos na rota Brasil–Ásia, especialmente aqueles que dependem de contêineres refrigerados.
Tal fato se dá porque os portos chineses, como o de Xangai, estão lotados e sem espaço de armazenamento, pela política de "Covid zero" que dificulta a exportação. A China é o principal parceiro comercial do Brasil, tendo sido o destino de 31,28% das exportações brasileiras em 2021, o que equivale a US$ 87,6 bilhões (R$ 406 bilhões).
O Brasil, por exemplo, importa cerca de 85% dos fertilizantes que consome, segundo dados da Camex. A dependência foi criada após anos sem investimentos em importantes plantas industriais, além das dificuldades para a liberação de licenças ambientais para extração de reservas.
Contêiner em porto da China. Foto de arquivo
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A crise que atingiu o Brasil, na avaliação de João Ferreira Netto, é o "reflexo de todos esses eventos", sendo que o "aumento dos preços no mercado de fretes e combustíveis impactam diretamente na economia brasileira, principalmente porque são elementos que elevam o preço dos bens de consumo".
"O setor de varejo e alimentício sofrem muito mais o impacto desses eventos, pois temos atividades industriais que nos levam a importar muitos destes itens de consumo, e são justamente esses itens que têm elevado os preços, pois estão mais sujeitos aos impactos dos eventos citados", explicou.
Segundo ele, a cadeia automobilística do país é um bom exemplo para compreender a dinâmica da crise: "Os automóveis, mesmo quando fabricados no Brasil, são fabricados com peças e itens importados, cuja logística é cada vez mais complicada".
Diante da crise, o governo brasileiro decidiu agir. A decisão da redução de impostos foi tomada em reunião extraordinária da Camex, ligada ao Ministério da Economia, e alcança cerca de 87% do universo tarifário do país, que tem 6.195 códigos de produtos.
Os itens que terão taxas de importação reduzidas (em 10%) são: feijão, carne, massas, biscoitos, arroz e materiais de construção. De acordo com o governo, 1.387 códigos de produtos ficarão fora da medida e não terão tarifas reduzidas. Entre eles estão têxteis, calçados, brinquedos, lácteos e alguns itens do setor automotivo.
O especialista entende que a solução do governo é paliativa, sendo insuficiente para as necessidades do país. "É necessário que o Brasil tenha um plano de aumento da atividade industrial, para reduzir a necessidade das importações e que, dessa maneira, tenha um maior controle sobre os preços aqui exercidos."